A boa fé não sustenta o mundo: A ruptura dos EUA e o preço da ilusão brasileira

A dívida pública dos Estados Unidos bateu US$ 36,2 trilhões em 2025, ou 120,9% do PIB, inflada após a pandemia de Covid-19 por déficits fiscais de US$ 2 trilhões anuais. O déficit comercial, como os US$ 983 bilhões de 2023, financia esse buraco, drenando a indústria americana.
Enquanto o dólar for a moeda global, isso se sustenta — o mundo financia o déficit americano. Mas se o dólar ruir, a dívida se torna impagável. O jogo precisa mudar agora, enquanto os EUA ainda dominam militarmente, tecnologicamente e geopoliticamente. O presidente Donald Trump, goste-se ou não, está forçando essa virada.
- CONFIRA: Está em dúvida sobre onde aplicar o seu dinheiro? O Money Times mostra os ativos favoritos das principais instituições financeiras do país; acesse gratuitamente
Pós-1945, os EUA criaram a ordem mundial com o Plano Marshall, Bretton Woods, FMI, OMC e Otan, esperando liberdade econômica e democracia como contrapartida. A China, sob Xi Jinping, quebrou o combinado: manipula sua moeda, subsidia indústrias, barra capitais e exige transferência de tecnologia. Via Brics (bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), empurra a desdolarização. A Europa perpetua seus subsídios agrícolas, enquanto regimes como Irã e Venezuela ignoram completamente as regras do jogo. O soft power de gestões passadas falhou — o Afeganistão, com o Talibã de volta ao poder, é a prova mais simbólica.
Os EUA ainda lideram em defesa, inteligência artificial, semicondutores e energia. Mas crescimento sem indústria é frágil. A IA não substitui empregos que sustentam a classe média. Corrigir desequilíbrios exige dor: inflação em eletrônicos importados, custos mais altos, menos conforto. Acostumados à prosperidade do pós-guerra, os americanos relutam. Mas sem sacrifício, não há conserto.
A estratégia de Trump — tarifas como barganha, reindustrialização, acordos bilaterais — é bruta, mas entrega. Em 2025, os EUA fecharam acordos com a União Europeia (US$ 600 bi em investimentos, tarifas de 30% a 15%), Japão (US$ 550 bi, mercados agrícolas e automotivos abertos), Reino Unido, Vietnã e Indonésia, com tarifas reduzidas e mercados escancarados. A China cedeu a uma trégua tarifária, liberando minerais críticos. O Brasil, porém, resiste: sem acordo, levou tarifas de 50%, sangrando carne, soja e minério — enquanto depende de fertilizantes e trigo americanos. Não pode machucar os EUA, só se autoimpõe perdas.
As críticas miram Trump, mas esquecem a inação alheia. Por que a Europa não corta seus subsídios agrícolas? Por que a China, líder dos Brics, não corrige sua moeda ou abre seus mercados? Todos apontam o dedo, mas ninguém corrige suas próprias distorções. Os EUA estão reequilibrando um sistema viciado.
Nomes como Gustavo Franco, meu tutor na PUC-Rio, um dos homens mais brilhantes que conheci, alertam que tarifas criam “ineficiências” (Estadão, maio de 2024). Ian Bremmer teme isolamento (Time, março de 2025). Respeito-os profundamente, mas discordo. Os US$ 1,15 trilhão de UE e Japão mostram que as tarifas forçam resultados que o liberalismo clássico não sonhou.
Nixon acabou com o padrão-ouro e abriu a China. Trump, chamado populista, encara Pequim, reverte a desindustrialização e redesenha o jogo por interesse, não por esperança. Os críticos atacam, mas cadê a alternativa? Sem essa ruptura, o mundo ruma ao domínio chinês — com o dólar colapsando, democracias esmagadas e a ordem global, como a conhecemos, destruída. A ruptura é dura, inflacionária, incômoda — mas indispensável. Trump, o “vilão necessário”, força a realidade: a boa-fé não sustenta o mundo. Brasil e outros precisam entender — ou pagar caro.
- Petrobras (PETR4) nega projetos com a Raízen (RAIZ4); o que mais mexe com o Ibovespa? Acompanhe o Giro do Mercado de hoje e fique por dentro: