A Faria Lima ‘precisa entender’ que o agronegócio sempre será uma montanha-russa, segundo Marcos Jank e Vitor Duarte
O episódio 302 do Market Makers debateu a potência global do agronegócio brasileiro e sua crescente aproximação com a Faria Lima. Participaram da conversa Marcos Jank, professor do Insper, e Vitor Duarte, CIO da Suno Asset.
Para Jank, o mercado financeiro ainda carece de uma compreensão mais profunda sobre a dinâmica estrutural do setor.
“A Faria Lima precisa entender que o agronegócio sempre será uma montanha-russa — e isso significa volatilidade. É preciso compreender essa volatilidade. Depois de 2022, muita gente achou que o setor só iria para cima. Mas haverá momentos bons e ruins, e isso é estrutural”, afirma.
O professor de agronegócio do Insper também destaca que o setor ainda enfrenta desafios relevantes de governança e profissionalização, citando práticas como baixa transparência de números e operações feitas na pessoa física, com controle via livro-caixa.
“O próprio valuation das empresas é bastante complexo, e um dos pontos mais difíceis de entender é o preço da terra”, completa.
Entre vacas magras e vacas gordas
Em 2022, diante de um cenário de margens elevadas no agronegócio, a Faria Lima ampliou a concessão de crédito justamente para o topo da cadeia produtiva — um segmento que já operava alavancado e acabou se endividando ainda mais.
“Dos 5 milhões de produtores rurais no Brasil, cerca de 1 milhão são assentados. Já esse agro que anda de caminhonete ou de avião representa algo em torno de 100 mil produtores, responsáveis por cerca de 90% da produção”, explica Duarte. “Esse é o topo da pirâmide, com produtores mais arrojados e outros mais conservadores.”
Segundo o CIO da Suno Asset, foi justamente esse grupo que recebeu mais crédito do mercado financeiro, mesmo já tendo acessado a recursos do Banco do Brasil, do Plano Safra e a operações de barter.
“O agronegócio tem três grandes fontes de volatilidade: custos, clima e preço das commodities. É uma montanha-russa. A Faria Lima ou não percebeu isso, ou preferiu ignorar. A Faria Lima precisa entender o agro — e o agro também precisa entender a Faria Lima. O mercado de capitais é o próximo dinheiro do agro, então essa conversa precisa acontecer”.
Antes da expansão do agronegócio no mercado de capitais — movimento que ganhou tração com os CRAs e os Fiagros —, a relação entre produtores e credores, segundo Duarte, se dava de forma bastante diferente, com negociações mais diretas e menos intermediadas pelo mercado financeiro.
“Antes, o produtor chegava e dizia algo como: ‘Vamos quebrar, tivemos um problema de safra. Vai faltar feijão’. Isso virava um problema governamental. Havia conversa sobre renegociação com o Banco do Brasil ou até negociação de um perdão. Foi assim até a chegada do mercado de capitais”, explica Duarte.
“Quando alguém dentro de um fundo diz ‘vou quebrar’, o investidor vende, a cota cai e o fundo perde a capacidade de fazer um follow-on ou se reestruturar. Hoje, o credor não é mais um banco estatal — são mais de 3 milhões de pessoas que investem em FIIs e Fiagros”.