A nova era: Mix redefine perfil dos shoppings e fortalece resultadosde Multiplan (MULT3), Allos (ALOS3) e Iguatemi (IGTI11)

O que antes era dominado por lojas de vestuário e âncoras tradicionais, hoje dá lugar a experiências gastronômicas, espaços de bem-estar e serviços de conveniência. Desde a pandemia, os shoppings centers passaram por uma transformação estrutural no mix de lojas — uma mudança silenciosa, mas profunda — que ajudou o setor a manter bons índices de ocupação, crescer em vendas e, principalmente, se manter relevante na vida das pessoas.
Segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), a principal mudança no mix de lojas da última década — intensificada após 2020 — foi a ascensão da categoria de Alimentação e Bebidas, que ultrapassou o vestuário como líder em número de marcas.
Em 2014, o vestuário era a categoria dominante. Já em 2024, Alimentação responde por mais de 4.400 marcas e 20% do total de lojas em shoppings, representando 17,7% de todas as marcas cadastradas no setor. Só no primeiro trimestre de 2025, esse segmento foi responsável por 28% das inaugurações em shoppings, segundo o estudo “O Varejo dos Shoppings – Marcas em Expansão”.
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Esse movimento reflete uma mudança clara de comportamento do consumidor, que agora busca mais do que produtos — busca experiências. Um estudo da própria Abrasce, “Comportamento dos Frequentadores de Shopping Centers” (2023), mostra que 21% dos consumidores já vão ao shopping motivados pela alimentação, e 82% consideram a variedade de restaurantes um fator decisivo para escolher qual shopping frequentar.
Outro levantamento, “Shopping Multigeracional” (2025), aponta que a praça de alimentação é o espaço mais democrático dos centros comerciais, reuninddo públicos de todas as faixas etárias — de boomers à geração Z.
Essa reconfiguração não acontece por acaso. “Os shoppings entenderam que precisam ser pontos de conveniência e de experiência, não apenas de compras”, afirma o presidente da entidade, Glauco Humai. Ele destaca que, em 2023, o setor bateu recorde de vendas, com R$ 212,7 bilhões, e que o ano de 2024 segue com alta nos principais indicadores operacionais.
Além disso, a tecnologia tem sido uma aliada importante nesse processo de transformação. A Abrasce aponta o uso crescente de inteligência de dados, geolocalização e análise de comportamento de fluxo e consumo como ferramentas que permitem uma gestão mais inteligente do mix, com ajustes rápidos e personalizados para cada perfil de empreendimento.
Essa mudança estratégica também está alinhada a fatores macroeconômicos. Com um consumidor mais seletivo e atento ao custo-benefício, os shoppings precisaram se adaptar para atrair mais visitas e gerar recorrência.
“A revisão do mix contribui diretamente para o aumento das vendas, pois amplia o tempo de permanência e a frequência de retorno”, destaca a Abrasce.
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Serviços de saúde, bem-estar, lazer e conveniência se tornaram âncoras emocionais — e operacionais — do novo varejo físico.
O impacto positivo dessa transformação é visível no desempenho das companhias listadas na B3, que citam o mix como um dos principais agentes impulsionadores dos resultados no releases trimestrais.
Multiplan (MULT3), Iguatemi (IGTI11) e Allos (ALOS3) vêm registrando altas consistentes nas vendas mesmas lojas (SSS), no fluxo de visitantes e na receita de locação. Mesmo em um cenário de juros ainda elevados e desaceleração no crédito, o setor segue resiliente — impulsionado por um consumidor que quer mais do que comprar.
Multiplan (MULT3): Mais serviços, mais fluxo
Com mais de 20 empreendimentos no portfólio, a Multiplan tem acompanhado de perto a transformação dos hábitos de consumo e, como resposta, vem redesenhando o mix de lojas para atender às novas demandas do público.
Segundo a empresa, essa reorganização não é aleatória: é sustentada por inteligência de dados, que identifica padrões de comportamento e perfis de consumo — os chamados clusters — para orientar decisões de curadoria e expansão.
“O uso intensivo de dados tem sido fundamental para entender o que atrai, engaja e fideliza os consumidores. A análise de fluxo, comportamento de consumo e clusters específicos nos permite adaptar o mix com mais precisão”, disse Armando D’Almeida, diretor vice-presidente e de relações com investidores, em entrevista ao Money Times.
Um dos dados que reforça essa estratégia é a distribuição da ABL (Área Bruta Locável) por segmento, medida em março de 2025:
- Vestuário, embora ainda lidere, perdeu espaço, com 32,1% da ABL ocupada (queda de 535 pontos-base desde o primeiro tri de 2025);
- Serviços avançaram para 24% (+198 p.b.), com destaque para academias, clínicas, coworkings e centros médicos;
- Alimentação e áreas gourmet ganharam força e agora representam 15,3% da ABL — um salto de 497 p.b.;
- Artigos Diversos (como pets, farmácias, e variedades) também cresceram e somam 22,5% da ABL (+118 p.b.);
- Já Artigos do Lar e Escritório recuaram para 6,1% (-277 p.b.).
A Multiplan destacou que, desde a pandemia, a estratégia de composição do mix dos shoppings evoluiu de forma significativa. A empresa passou a enxergar o centro de compras não apenas como ponto de consumo, mas como um espaço de convivência e prestação de serviços.
Esse movimento reflete o que a própria companhia chama de “mix do futuro”, um conceito que vai além da venda de produtos e visa proporcionar experiências sensoriais, comodidade e integração entre consumo, lazer e serviços.
“Temos feito curadorias muito específicas, olhando para cada shopping, região, perfil de público. Hoje, trabalhamos com clusters de clientes — ou seja, grupos com comportamentos e interesses semelhantes — para entender como entregar o que cada comunidade deseja e precisa”, afirmou Almeida.
De acordo com a empresa, serviços essenciais, alimentação e entretenimento assumiram um papel cada vez mais relevante na geração de fluxo e na fidelização dos clientes. “Estamos vendo, por exemplo, a medicina e os serviços de saúde crescerem de forma bastante significativa. Muitos clientes vêm ao shopping para ir ao médico e acabam consumindo mais, aproveitando a conveniência do espaço”, pontuou.
A alimentação, por sua vez, deixou de ser coadjuvante e passou a desempenhar o papel de âncora de experiência. Restaurantes mais sofisticados e operações de gastronomia diferenciada vêm sendo replicados para outros empreendimentos do grupo.
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Segundo a Multiplan, essas transformações têm impacto direto nos indicadores operacionais — como o fluxo de pessoas e o tempo médio de permanência — e ajudam a sustentar os bons números apresentados trimestre após trimestre.
Os números do segundo trimestre de 2025 (2T25) confirmam que a reformulação do mix nos shoppings está dando resultado. A taxa de ocupação da Multiplan atingiu 96,1%, a maior desde 2020 para um segundo trimestre, receita bruta totalizou R$ 741,3 milhões, alta de 27,2%, com crescimento em todas as frentes de negócios: aluguel, estacionamento, serviços e vendas imobiliárias.
Allos (ALOS3): o shopping como plataforma de convivência
Com o varejo físico em constante evolução, a Allos, que administra 55 shoppings pelo Brasil, reforça sua estratégia de ampliar o mix de ofertas para além do comércio tradicional, investindo fortemente nos segmentos de alimentação, cosméticos, lazer e serviços de conveniência, incluindo eletropostos para carros elétricos.
Entre janeiro de 2023, data da fusão da companhia, e dezembro de 2024, o segmento de alimentos e bebidas cresceu 11,3% em vendas e 6,8% no número de lojas. Já a área de cosméticos apresentou alta ainda mais expressiva, com avanço de 25,3% nas vendas e 12,1% em pontos comerciais. O segmento de lazer e diversão registrou aumento de 22,7% no faturamento e foi o que mais expandiu em número de lojas, com alta de 42%.
“Os nossos shoppings deixaram de ser apenas lugares de compra e se tornaram grandes plataformas onde as pessoas vêm para socializar, se divertir e, claro, comprar. A gente fala muito em share of life em vez de share of wallet, porque entendemos que a jornada do consumidor é muito mais ampla hoje”, afirma Renato Floh, diretor comercial da companhia.
Floh destaca que o investimento em gastronomia, com praças de alimentação, restaurantes casuais e o projeto Taste Lab — que oferece experiências gastronômicas diferenciadas e regionalizadas — é uma das âncoras da estratégia para aumentar o tempo de permanência do público nos shoppings.
“Se o consumidor vai sair de casa para se alimentar, por que não fazer isso no shopping? Isso faz com que ele fique mais tempo, aproveite outras lojas e serviços, gerando um ciclo positivo para todos.”
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Além disso, o executivo ressalta a importância do crescimento dos segmentos de beleza e lazer. “O Brasil é um mercado forte em cosméticos e beleza, e temos ampliado significativamente a presença dessas marcas, desde grandes players como Sephora até opções para todos os perfis. No lazer, a expansão de eventos, teatros e espaços de entretenimento cria experiências que fidelizam o consumidor”, comenta.
Outro pilar fundamental da estratégia é a sustentabilidade, exemplificada pela implantação de 600 vagas para carregamento de carros elétricos em seus shoppings, sendo 200 já instaladas.
“Percebemos uma demanda enorme por eletropostos, que conecta o consumidor à sustentabilidade e oferece mais conveniência para quem frequenta nossos ativos”, comenta Floh.
Para a Allos, a transformação dos shoppings em ecossistemas multifuncionais, onde comércio, lazer, serviços e tecnologia se integram, é essencial para se manter relevante em um mercado que se reinventa rapidamente. “Nunca pensamos nessas iniciativas de forma isolada — tudo se conecta para oferecer ao consumidor uma experiência completa e integrada,” diz o diretor comercial.
Iguatemi (IGTI11) aposta em marcas premium
A Iguatemi, por sua vez, tem demonstrado que a gestão estratégica do mix de lojas é peça-chave para o fortalecimento dos resultados dos seus empreendimentos.
No segundo trimestre de 2025, a companhia reforçou seu mix com marcas exclusivas como Sephora e Comme des Garçons, além da chegada de Alo Yoga, Dolce & Gabbana e outras.
Essa estratégia elevou o ticket médio, aumentou a frequência e prolongou o tempo de permanência dos clientes, impulsionando vendas e ocupação.
O resultado foi um lucro líquido ajustado de R$ 208,5 milhões nos meses de abril a junho, crescimento de 95,7% em relação ao segundo trimestre de 2024 (2T24), enquanto as vendas totais do grupo atingiram R$ 6,3 bilhões, alta de 27,4% na mesma base.