Coluna do Hsia Hua Sheng

Ajuste de rating soberano da China não afeta a China (e nem o Brasil); entenda

18 dez 2023, 14:01 - atualizado em 18 dez 2023, 14:01
China
A recente redução de perspectiva de uma das agência internacional de crédito gera pouco efeito na China. (Imagem: Anurak Tepkhamtai de Getty Images/Canva Pro)

Na semana passada, a Moody’s alterou sua perspectiva sobre a classificação de crédito da China de estável para negativa. O rating da do país continua com o grau de investimento A1. Mas, para Moody’s, existem evidências de alguns fatores negativos que poderiam reduzir rating atual nas próximas revisões dentro de 1 – 2 anos.

No entanto, a recente redução de perspectiva de uma das agência internacional de crédito gera pouco efeito na China. Diferentemente dos Estados Unidos, que teve um impacto de elevação de taxas de juros no seu mercado de títulos do governo americano, o governo chinês é pouco dependente do mercado de bonds global.

Por que a Moody’s não impacta a China

A maior parte das dívidas soberanas da China é emitida em Renminbi (RMB) e colocada para mercado doméstico de poupadores chineses que possuem uma lógica de análise diferente do método do Moody’s. Logo, essa nova perspectiva não impacta o mercado de funding interno da China.

A China é um grande exportador de capital, usando sua fonte de captações internas, uma vez que a taxa de poupança é um dos mais elevados do mundo e reserva da divisa em dólar também é um dos mais altos. Com isso, a China tem participado ativamente de investimento estrangeiro direto nos outros países.

Além disso, devido às diferenças de metodologias entre as agências internacionais de ratings, os investidores internacionais não olham somente para uma agência ou rating para formar sua própria opinião. As análises de outras principais agências internacionais também são consultadas.

Por exemplo, os parâmetros podem ser iguais, mas os pesos atribuídos para chegar a nota final de rating podem ter discrepâncias significativas. Por isso, é comum ter mais de uma agência de ratings avaliando o mesmo ativo ou emissoras de títulos de mercado.

Essa divergência de opinião é positiva e faz parte do mercado financeiro. Quanto mais debate e discussão, maior é a transparência de apreçamento de uma ativo e amplia mais numero de participantes do mercado. É um processo importante para melhorar eficiência de mercado. Nesse caso específico, só vai ajudar aumentar e fortalecer a internacionalização de RMB não só o ponto de vista de comércio internacional, mas também como reserva de moeda para investidores institucionais globais.

Por que, então, a Moody’s alterou a perspectiva? Essa alteração reflete a maior possibilidade de o governo central chinês em apoiar financeiramente os governos locais e seus veículos de financiamento municipais com elevado endividamento.

A preocupação tem foco em “dívida oculta” acumulada pelas cidades e províncias em todo país após anos de crescimentos e investimentos acelerados. O Fundo Monetário Internacional e bancos de Wall Street estima uma montante aproximada entre US$ 7 trilhões e US$ 11 trilhões.

O governo central chines já está atento a esse ponto. Ele assumiu a responsabilidade e vem trabalhando gradualmente na sua resolução individualizada por localidade. Recentemente, a China emitiu um trilhão de Yuan (RMB) em título do tesouro nacional que serão transferidos para alguns governos locais mais afetadas fiscalmente para aliviar seu aperto de liquidez e preservar seus projetos de infraestrutura no curto prazo.

Simultaneamente, o governo central também está fazendo uma peneira para classificar e avaliar, caso a caso, quais são os governos municipais que precisam de ajuda, por quanto tempo e qual seria destino de recurso. Por exemplo, algumas localidades foram afetadas por saídas de empresas americanas, afetando negativamente situação fiscal. Já as outras localidades receberam novos investimentos estrangeiros para construir fábricas de chips ou equipamentos de energias renováveis.

Esse processo criterioso de análise por localidade consome tempo, mas é válido para eliminar o problema pela raiz e evitar desperdício de dinheiro publico.

Cada caso é analisado para poder redimensionar região conforme ao novo tempo econômico da China rodeada de retração econômica global. Os resultados dessa otimização dos recursos para promover o desenvolvimento econômico mais sustentável provavelmente não foram considerados num horizonte de curto a médio prazo analisado pela Moody’s.

E o Brasil com isso?

Nada impacta o Brasil também. O mercado de investimento financeiro brasileiro é pouco exposto ao mercado de títulos renda fixa e de ações da China. O uso de RMB como alternativa de dólar no comércio internacional de empresas brasileiras será ainda mais fortalecido com essa melhoria de eficiência de mercado de moeda RMB.

Ela poderia ser usada não só comercio com a China, ela também será usada no comércio internacional com outros países do mundo.

O investimento de empresas chineses no Brasil em 2024 também não será impactado. Embora algumas multinacionais chinesas tenham sua perspectiva de crédito também baixada como consequência da revisão soberana, elas continuam investindo no Brasil, aumentado sua parceria e presença com empresas brasileiras na geração de rendas e empregos na cadeia local.

*As análises e opiniões são de responsabilidade exclusiva do autor e não representam uma visão das instituições das quais o autor pertence.

Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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