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Opinião

André Sacconato: Cenário Fiscal ameaça bonança dos Estados Unidos

05 nov 2018, 19:22 - atualizado em 05 nov 2018, 19:22

Por André Luiz Sacconato, doutor em economia pelo IPE-USP, é socio da Integrare Brasil e professor de MBA nos cursos da FIA-USP. Foi coordenador de projetos e responsável por setor externo e fiscal na Tendências Consultoria, economista sênior na áreas de modelagem de mercados na LCA consultores e diretor de pesquisas da BRAiN- Brasil Investimentos e negócios.

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Após a eleição do governo Donald Trump houve muita preocupação com o futuro da economia americana, mas neste primeiro ano e meio de governo as preocupações parecem não se justificar dado os indicadores econômicos que estão sendo divulgados principalmente no mercado de trabalho e crescimento do PIB.

Minha visão é que esta analise é parcial e estática. Se nos aprofundarmos nos fundamentos econômicos perceberemos que há sim motivos de preocupação. Se esta não vem do setor real ou mesmo da inflação, vem de onde geralmente se iniciam as grandes crises: do setor fiscal. Esse setor já da alguns sinais de que, com a economia em plenos emprego, já se deveria ter um plano para arrefecimento da política fiscal expansionista. O déficit em proporção do PIB arrefeceu em relação ao usado para recuperação da crise de 2008, quando atingiu em 2009 quase 10% do PIB, e atingiu seu mínimo em 2015, quando chegou a 2,4% do PIB, e se estabilizou próximo a 3,5% nos últimos anos, com pequenas variações. Isso representa que em 2017 o governo americano gastou quase US$ 700 bilhões de dólares a mais que arrecadou. Com isso a relação dívida/PIB não para de crescer chegando a 76,5% do PIB em 2017, apenas uma leve baixa de 0,2% por conta do crescimento da economia, mas muito acima do numero de 2009 que estava em 52,9% do PIB.

O esforço para deter esse déficit já começa a ficar muito grande. E será maior quanto mais tempo demorar para agir. Agora, que a economia americana cresce robustamente e tem uma taxa de desemprego baixa, o esforço ainda seria menor, mas já é robusto. Um trabalho do congressional budget office mostra que se o governo quiser chegar com a mesma relação dívida/PIB que tem hoje em 2048 tem que fazer um corte próximo a 1.9% do PIB, do seu déficit. Isso significa US$ 400 bilhões anuas, ou um aumento de 11% nas receitas ou corte de 10% nas despesas, anualmente. Se mantiver o mês o padrão de gastos e receitas, o país chegara em 2048 com essa relação próxima a 150%.

Algumas considerações mostram que esse cenário de ajuste é pouco provável no curto e médio prazo.

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1 – O espaço dos desembolsos obrigatórios vem aumentando nos desembolsos totais o que engessa a possibilidade de um ajuste fiscal. Os desembolsos discricionários, ou não obrigatórios chegaram a representar 9% do PIB em 2010, hoje representam apenas 6,3%. Em relação aos desembolsos totais passaram de 50% na década de 90 para 32%.

2 – Desse total de 32% dos desembolsos totais das não obrigatórias, 16% são gastos com defesa. De acordo com compromissos de campanha e com declarações e envios de orçamento recentes para o congresso é muito difícil imaginar que o governo Trump faça os ajustes aqui. Portanto o ajuste de US$ 400 bi anuais necessários para a manutenção da relação dívida pública teria que ser feita em 16% dos desembolsos totais, o equivalente a US$ 610 bilhões o que parece muito pouco factível. Claro que é um exercício estático, considerando que as receitas e outras despesas são constantes, apenas para comparativo.

3 – Do lado dos desembolsos obrigatórios, por conta da abrangência da seguridade social,, esse gasto se mantem como uma proporção constante dos gastos totais, mesmo com o aumento geral destes e representa 25% das despesas obrigatórias e quase 5% do PIB, Por outro lado com o  envelhecimento da população e aumento da abrangência, os desembolsos de medicare e medicaid continuam tomando uma parcela cada vez maior dos desembolsos totais e passaram de aproximadamente 20% das despesas  na década de 90 obrigatórias para quase 30%.Isso representa um aumento de 3% para 5% do PIB.

O cenário parece então muito adverso para um ajuste no curto e médio prazo. A soma de um fiscal expansionista e de uma economia rodando a todo vapor (taxa de desemprego rodando no mais baixo índice já registrado: 3,9%) vai gerar certamente uma pressão sobre preços e necessidade de uma intervenção do FED nos juros. Como o estoque de riqueza das famílias americanas esta muito ligada a oscilação da Bolsa de valores, ao aumento nos juros deve causar a queda na bolsa e queda dos valores dos ativos das famílias. A soma desta queda e do aumento dos valores dos financiamentos deve levar a um desaquecimento da economia, o que já pode acontecer em 2020, dado que o aumento de juros deve ser muito próximo.

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Os brasileiros devem estar atentos a essa dinâmica, dado que isso altera o portfólio dos investidores estrangeiros. O governo Trump que já deveria adiantar o ajuste não está fazendo. Prefere deitar sobre os louros dos indicadores da economia atual. Já vimos essa história do Brasil em 2010. E sabemos como acabou.

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