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Angela Bittencourt: Se tem neblina, a gente encosta…

04 abr 2019, 10:29 - atualizado em 04 abr 2019, 10:48

Se tem neblina, a gente encosta. Passei por isso muitas vezes e nunca sofri um acidente ou provoquei algum. Já balancei num penhasco… não se enxergava nada, nada. Mas a marcha à ré me livrou do pior. Deus ajudou!

Caminhoneiro de carga perigosa, meu pai cruzava o mapa do Brasil. Nas décadas de 1950 e 1960, levava semanas para atravessar o país. Ele saía de Cubatão, em São Paulo, e chegava em Manaus, no Amazonas. Cresci ouvindo suas histórias. “Ele exagera”, dizia minha mãe. Às vezes, meu pai, com suas histórias, parecia constatar a própria existência; outras vezes, o seu relato soava como um alerta.

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Órfão de pai muito cedo, ele aprendeu a dirigir aos 8 anos em uma fábrica de caminhões. Imprudência do gerente? Talvez. Mas meu pai transpirava responsabilidade. Não levantava a voz. Bastava um olhar e todos (não só eu e meu irmão e depois os netos) entendiam quando parar era uma necessidade.

Saltemos para os dias de hoje, ou melhor, ontem…

O tempo fechou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara ao final da audiência pública com o ministro Paulo Guedes (Economia), que não se segurou (nem conseguiria) com a agressiva acusação do deputado Zeca Dirceu (PT-PR).

“O deputado disse que o ministro era ‘tigrão’ com aposentados, mas ‘tchutchuca’ com privilegiados. De microfones cortados, Guedes respondeu que ‘tchutchuca é a mãe. É a vó’. Fim da sessão”, conta o meu colega Eduardo Campos, repórter do Seu Dinheiro.

Antes dessa última cena, sobrou neblina na comissão. E (vamos e venhamos) o ministro Paulo Guedes nem chegou a atravessar a pista. Ele não acusou o deputado de ser filho do ex-ministro José Dirceu (PT), acusado de vários crimes praticados nos governos Lula e Dilma. Dirceu pai foi condenado por crimes referentes ao escândalo do mensalão.

Sob forte pressão, Guedes tentou explicar pontos da proposta da reforma da Previdência que está sob análise na comissão da Câmara. Não conseguiu. Foi bombardeado por representantes da oposição. Não foi apoiado por parlamentar de expressão ali presente ou por ministros que o acompanhavam.

Guedes lutou sozinho. Apanhou, mas bateu!

Disse em alto  e bom som que os deputados têm o poder do voto, a responsabilidade de decidir sobre a reforma das aposentadorias — ou seja, o mesmo que decidir o futuro do país.

“Meu papel é relativamente simples: ter estudado isso, feito uma proposta. Quem vai julgar são vocês. Meu trabalho é dizer tecnicamente qual é a nossa proposta. Eu não preciso me exaltar”, afirmou na primeira hora da sessão (que se estendeu por mais de seis horas).

Guedes trincou os dentes sob ataques ao regime de capitalização. Foi acusado de favorecer os bancos porque eles poderão ser os gestores dos recursos que (se adotado esse regime) serão recolhidos pelos trabalhadores para construir suas aposentadorias.

O ministro lembrou que as aposentadorias no Legislativo são espetaculares. E são. Nenhum deputado abriu a boca.

Após muita oscilação, a Bolsa caiu. O dólar e os juros subiram. Nesta manhã, as moedas dos países emergentes como o Brasil apanham do dólar. Com o real não deve ser diferente. Mas, afora as interferências do mercado externo, os ativos negociados no Brasil serão testados.

O saldo do tumulto e do bate-boca a que assistimos na comissão da Câmara ontem será conhecido ao longo desta quinta-feira. Mas que não se espere um passeio no parque, porque há muito em risco na partida que começa daqui a pouco.

O governo é pobre em articulação no Congresso, ficou patente que o ministro da Economia não será o articulador (sequer de plantão) e que o presidente Jair Bolsonaro vai ter que ceder em algumas de suas posições. De cara, deverá buscar um sinônimo discreto para o velho “toma lá, dá cá” que tanto repudia, postura que lhe garantiu 57,7 milhões de votos em outubro passado.

Nesta manhã, o presidente reúne-se com líderes partidários. O resultado do encontro será avaliado nos seus mínimos detalhes por gestores, chefes de tesourarias bancárias e grandes investidores — aqueles que ainda resistem a botar dinheiro no Brasil, mas apostam na política econômica bancada por Paulo Guedes.

Quem se candidata a tranquilizar (e a segurar) o ministro?

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