Thinking outside the box

Após 12 semanas de revisões baixistas para a inflação, o que ainda segura o Banco Central?

22 ago 2025, 18:45 - atualizado em 22 ago 2025, 18:53
Galípolo
No Brasil, as expectativas de inflação seguem em trajetória de queda: já são 12 semanas consecutivas de revisões baixistas no Boletim Focus (Imagem: REUTERS/Agustin Marcarian)

Finalmente, tivemos a tão aguardada fala de Jerome Powell, presidente do Federal Reserve, no Simpósio de Jackson Hole, em Wyoming.

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O discurso esteve em linha com a leitura que o mercado já havia consolidado no início do mês, fazendo de agosto uma janela marginalmente mais favorável — sobretudo em contraste com julho, quando o dólar voltou a se fortalecer de maneira significativa.

Agora, o movimento se inverteu, reproduzindo a dinâmica que prevaleceu no primeiro semestre, marcada por um dólar mais fraco.

O ponto de inflexão foi o payroll de julho, que trouxe sinais mais nítidos de fraqueza no mercado de trabalho americano.

Esse dado reacendeu as apostas em cortes de juros nos Estados Unidos, enfraquecendo o dólar e dando sustentação aos ativos de risco — dinâmica semelhante àquela que predominou no primeiro semestre, em contraste com o quadro de julho.

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Caso a taxa básica americana recue para algo próximo a 3%, a justificativa para manter a Selic em 15% perde força, o que abre espaço para cortes na taxa doméstica e, ao mesmo tempo, favorece a entrada de capital estrangeiro por meio da estratégia de carry trade.

Em outras palavras, a fala de Powell abriu espaço para o mercado acreditar em cortes de juros ainda neste ano.

No Brasil, as expectativas de inflação seguem em trajetória de queda: já são 12 semanas consecutivas de revisões baixistas no Boletim Focus para o IPCA, e tudo indica que a próxima semana marcará a décima terceira.

Esse movimento fortalece as chances de cortes de juros ainda em 2025 por aqui.

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Historicamente, uma virada de ciclo da Selic costuma redirecionar fluxos para a bolsa, que já encontraria um suporte adicional.

Naturalmente, porém, qualquer decisão de flexibilização monetária dependerá de inflação efetivamente controlada, da reancoragem das expectativas e de sinais mais claros de desaceleração econômica.

Com esses vetores gradualmente se alinhando, cresce a probabilidade de um ciclo mais construtivo para o mercado local, ainda que a trajetória permaneça fortemente condicionada ao cenário global.

Afinal, a Selic continua intrinsecamente vinculada ao calendário de cortes nos juros americanos, que por sua vez está travado pela incerteza em torno da guerra comercial conduzida por Donald Trump.

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Caso o impacto tarifário se mostre limitado — e sobretudo na ausência de uma escalada direcionada ao Brasil —, abre-se espaço para que o primeiro corte na taxa Selic ocorra já em dezembro.

Do lado doméstico, há fundamentos consistentes para acreditar que a inflação brasileira possa encerrar 2025 abaixo de 5%, o que reforçaria a possibilidade de o Banco Central antecipar o início dos cortes na Selic.

Para que esse movimento se materialize, será necessário que a inflação corrente continue convergindo de forma qualitativamente benigna, que a atividade doméstica mantenha um processo gradual de desaceleração e que o ambiente externo caminhe em direção semelhante — ou seja, inflação mais controlada e crescimento menos aquecido nos EUA, criando espaço para cortes também por lá entre setembro e outubro.

Assim, se o quadro comercial não sofrer novas tensões, não surgirem surpresas fiscais relevantes no curto prazo e a inflação seguir convergindo para baixo — no Brasil e no exterior — acompanhada de sinais de desaceleração da atividade global, abre-se espaço para levar a Selic a patamares mais baixos.

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Mesmo uma taxa eventualmente abaixo de 12% em 2026, embora ainda elevada, representaria um alívio relevante frente aos níveis atuais e contribuiria para um ambiente mais construtivo para os ativos domésticos.

No entanto, o horizonte político já começa a pesar sobre as expectativas.

As eleições de 2026 ganham espaço, e as pesquisas reforçam o quadro de polarização, um fator de preocupação adicional para os mercados.

O rali esperado para os próximos 18 meses dependerá não apenas da política monetária, mas também da formação de expectativas em torno do processo eleitoral.

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O mercado buscará um projeto claramente reformista e fiscalista para 2027, capaz de destravar reformas estruturais e reancorar expectativas, abrindo espaço para cortes adicionais de juros.

Nesse tabuleiro, movimentos recentes do Centrão indicam uma tendência de aproximação com o ex-presidente Jair Bolsonaro, com definição de apoio prevista até o fim deste ano ou no início do próximo.

De certa forma, mantido um ambiente de relativa pacificação política e institucional, uma tendência marginalmente mais positiva pode se sustentar, impulsionada tanto pela expectativa de cortes de juros quanto pela gradual incorporação de um rali eleitoral aos preços dos ativos.

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Economista e especialista em investimentos da Empiricus
Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia pela PUC. Pós-graduado no Programa Avançado em Finanças do Insper, trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimentos da América Latina, além de ter feito parte de uma boutique voltada para fusões e aquisições, na área de modelagem financeira e pesquisa. Hoje faz parte no time de analistas da Empiricus, participando de séries como Palavra do Estrategista e Double Income, além do programa Empiricus Private junto do Felipe Miranda, estrategista-chefe e um dos fundadores da casa. É analista CNPI e especialista em investimentos CEA.
matheus.spiess@moneytimes.com.br
Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia pela PUC. Pós-graduado no Programa Avançado em Finanças do Insper, trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimentos da América Latina, além de ter feito parte de uma boutique voltada para fusões e aquisições, na área de modelagem financeira e pesquisa. Hoje faz parte no time de analistas da Empiricus, participando de séries como Palavra do Estrategista e Double Income, além do programa Empiricus Private junto do Felipe Miranda, estrategista-chefe e um dos fundadores da casa. É analista CNPI e especialista em investimentos CEA.