Internacional

Brasil e China desviam do dólar e vão fazer negócio sem passar pela moeda dos EUA; entenda

29 mar 2023, 14:18 - atualizado em 29 mar 2023, 14:18
Lula China Brasil
Lula recebeu a visita do vice-presidente chinês em sua posse, em janeiro, em Brasília (Imagem: REUTERS/Ricardo Moraes)

Mesmo sem a presença do presidente Lula, a comitiva brasileira na China voltará do país asiático com um novo acordo debaixo do braço. Isso porque Brasil e China vão criar uma instituição bancária que permitirá que as transações bilaterais entre os dois países não precisem passar pelo dólar.

A iniciativa trata-se de um claro pivô pelo fortalecimento das relações sino-brasileiras, desviando-se do poderia da moeda dos Estados Unidos.

O anúncio ocorreu na manhã desta quarta-feira (29), durante o Simpósio de Negócios China-Brasil, realizado em Pequim. O evento reuniu mais de 500 empresários de ambos os países, bem como autoridades nacionais.

O novo formato de comércio será viabilizado pela criação de uma Clearing House (Câmara de Compensação) a ser operada, no Brasil, pelo Banco Industrial e Comercial da China (ICBC, na sigla em inglês). Como se trata de uma instituição financeira de grande estatura na China, o banco seria capaz de garantir aos empresários brasileiros a conversão imediata dos ganhos em moeda nacional – no caso, o real brasileiro. Isso ocorrerá toda vez que decidirem fechar novos negócios em renminbi (yuan chinês).

Fazendo alusão ao acordo, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que o fortalecimento dos intercâmbios comerciais entre os países deve trazer mais bem-estar para as duas nações.

Desde 2009, a China é a maior parceira comercial do Brasil, respondendo, em volume de transações, o valor recorde de US$ 150 bilhões. Na balança comercial, o Brasil tem superávit de US$ 29 bilhões, embora as vendas para a China sejam esmagadoramente de commodities. Por sua vez, o país asiático vende ao Brasil produtos de maior valor agregado.

Pequim acelera iniciativas de ‘desdolarização’

A mais recente iniciativa chinesa em aprofundar laços econômicos e comerciais com o Brasil não ocorre no vácuo. Nos últimos meses, não faltam exemplos de acordos e declarações de líderes em prol da utilização do renminbi como divisa para a realização de acordos comerciais. Trata-se de um claro desafio à dominância do dólar dos EUA.

Na visita de duas semanas atrás de Xi Jinping à Rússia, Vladimir Putin disse que cerca de 75% do volume negociado entre os dois países já é feito ou em rublo ou em yuan. O movimento atesta o grande enlace que há entre os dois principais adversários do Ocidente.

Putin chegou, inclusive, a defender que os acordos entre a Rússia e os países da Ásia, África e da América Latina sejam feitos na divisa chinesa. Se aceita, tal iniciativa fortaleceria ainda mais o yuan, uma vez que os negócios não seriam, necessariamente, com a China.

Putin China
China e Rússia estreitam laços, após a guerra da Ucrânia expulsar o país euroasiático da ordem ocidental.

Em janeiro, foi a vez do ministro das Finanças da Arábia Saudita, Mohammed Al-Jadaan, fazer um aceno à China. À época, ele declarou que o país estava aberto para discutir a comercialização de petróleo em outras moedas que não o dólar dos EUA.

Pequim tem conseguido aumentar consideravelmente sua influência no Oriente Médio, tendo sido capaz, inclusive, de mediar um acordo de paz considerado improvável entre Irã e Arábia Saudita, rivais históricos da região.

Como pano de fundo da negociação está o interesse chinês em assegurar a estabilidade para o suprimento de commodities energéticas (os países persas pertencem à Opep+), tendo como uso preferencial a moeda chinesa.

De acordo com o último dado liberado pelo Banco Popular da China (PBoC, na sigla em inglês), houve um aumento de 19,6% nos acordos negociados em renminbi entre os países que pertencem à Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês). A alta  representa um aumento no montante de quase US$ 750 bilhões.

Ainda assim, o dólar dos EUA permanece com mais de 80% do ‘market share’ cambial nas negociações internacionais.

China ameaça protagonismo brasileiro no Mercosul

Aproveitando-se do vácuo deixado pela política externa do governo Jair Bolsonaro, que desconsiderava o Mercosul como uma prioridade para o Brasil, a China acabou tomando a posição brasileira de principal parceiro comercial da Argentina.

Atualmente, a China é responsável por 21,5% das importações do país latino. O Brasil, por sua vez, representa 19,7% do mercado.

Uma das soluções oferecidas pelos chineses à problemática economia argentina é, justamente, o swap cambial. A operação permite aos empresários argentinos a possibilidade ter moeda chinesa para comprar seus produtos.

Outro país que parece disposto a ‘atropelar’ o Mercosul para negociar mais flexivelmente com a China é o Uruguai. Em julho do ano passado, o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, havia anunciado que o país tinha iniciado conversas com representantes do governo chinês para um acordo de livre comércio entre as partes.

A iniciativa eximiu produtos chineses da Tarifa Externa Comum (TEC). Porém, o projeto foi amplamente criticado pelos demais membros do bloco comercial sul-americano.

Estagiário
Jorge Fofano é estudante de jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da USP. No Money Times, cobre os mercados acionários internacionais e de petróleo.
Jorge Fofano é estudante de jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da USP. No Money Times, cobre os mercados acionários internacionais e de petróleo.
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