Brics x Trump: Tarifas dos EUA aproximam Brasil e Índia em aliança comercial

O Brasil e a Índia estão na mira dos Estados Unidos. Os produtos de ambos os países estão sendo tarifados por motivos como relações comerciais com a Rússia e divergências políticas. E como a união faz a força, as nações estão se aproximando.
No LIDE Brazil-India Forum, que acontece nesta quinta-feira (7) em Mumbai, autoridades públicas e líderes empresariais reforçaram a necessidade de diversificar mercados e adotar uma postura diplomática pragmática.
O governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, destacou que o Brasil precisa negociar diretamente, sem politizar o tema. “Tem que ligar, tem que negociar, seja pela diplomacia, seja pelo próprio presidente. A discussão não pode ser levada nesse tom político, tem que ser objetiva”, afirmou.
Riedel ressaltou o potencial da Índia como parceiro comercial, especialmente para produtos como carne, peixe, celulose e etanol. Para ele, as restrições dos EUA funcionaram como alerta para acelerar a busca por alternativas na Ásia. “Japão e Singapura estão na nossa rota, e a Índia já demonstrou interesse em celulose solúvel para a indústria têxtil”, disse.
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Já o presidente da FIEMS e vice-presidente da CNI, Sérgio Longen, avaliou que as tarifas americanas tiraram o setor industrial da zona de conforto. “Precisamos olhar para outros mercados e não depender de um único parceiro. A abertura com a Índia é um passo importante”, afirmou. Para ele, a “chacoalhada” das taxas deve ser vista como oportunidade: “Enquanto uns choram, outros vendem lenços”.
O ex-governador de São Paulo, João Doria, manifestou solidariedade à Índia pela sobretaxa de 50% aplicada pelos EUA, que, segundo ele, repete o “equívoco” também cometido contra o Brasil. Doria defendeu que Brasil e Índia busquem novas oportunidades comerciais sem escalar tensões diplomáticas, propondo uma articulação ampla com outros países afetados, como México, Canadá e União Europeia, para criar uma força global que minimize a dependência dos EUA.
Kenneth Nóbrega, embaixador brasileiro na Índia, destacou que as relações bilaterais de mais de 75 anos se baseiam em confiança e interesses comuns, com parcerias estratégicas em energia, defesa, segurança alimentar, saúde e digitalização. Nos últimos dois anos, Brasil e Índia trocaram mais de 120 missões diplomáticas, e os presidentes Lula e Modi mantêm diálogo constante. “A principal mensagem é que Brasil e Índia estão abertos a negócios”, afirmou.
Jean Paul Prates, ex-presidente da Petrobras, enfatizou o papel vital dos setores de energia e mineração para os dois países e as oportunidades de cooperação.
Ele destacou o potencial do Brasil em energia solar — com uma das maiores radiações solares do mundo — e em biocombustíveis, setor no qual o país é líder global, especialmente no etanol de cana-de-açúcar e em combustíveis de aviação.
Prates apontou ainda a expansão da infraestrutura de gás natural no Brasil, o início da operação de terminais de LNG (Gás Natural Liquefeito, em inglês) e a necessidade de desenvolver as indústrias química e de fertilizantes, áreas promissoras para parcerias bilaterais.
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Embraer de olho na Índia
A Embraer (EMBR3) aproveitou o evento para revelar planos para fortalecer sua presença no mercado indiano, especialmente no setor de defesa. Segundo Márcio Monteiro, vice-presidente de Inteligência de Mercado da Embraer Defesa e Segurança, a empresa está na disputa por um contrato que pode se tornar o maior da sua história — e que inclui a instalação de uma fábrica de aeronaves no país.
O projeto envolve o cargueiro militar C390 Millennium, que substituiria a frota da Força Aérea Indiana, e será produzido em parceria com o grupo Mahindra. A Índia também pode se tornar um hub regional para a Embraer.
O executivo destacou a atuação da companhia na gestão do espaço aéreo brasileiro e indiano, por meio da Atech, e o potencial do mercado de aviação comercial local, especialmente para os jatos da linha E2. Ele celebrou a abertura da subsidiária Embraer Índia e do novo escritório em Nova Delhi, reforçando o compromisso com o mercado indiano.
EUA tarifa Índia e o Brasil; entenda
Nos últimos dias, Donald Trump impôs uma sobretaxa de 25% sobre produtos indianos, elevando a alíquota total para 50%.
A medida é uma retaliação à recusa da Índia em reduzir as importações de petróleo russo, que, para os EUA, financia a guerra na Ucrânia. A decisão agravou as tensões comerciais, e o governo indiano qualificou a nova cobrança como injusta, afirmando que continuará defendendo seus interesses.
No Brasil, o governo norte-americano aplicou uma sobretaxa de 40%, totalizando 50%, sobre mais de 3,8 mil produtos brasileiros. A justificativa oficial envolveu desequilíbrios comerciais, barreiras tarifárias brasileiras e críticas ao tratamento do ex-presidente Jair Bolsonaro pelo STF, que Trump qualificou como “caça às bruxas”.
A tarifa entrou em vigor na quarta-feira (6), afetando cerca de 57% das exportações brasileiras para os EUA, especialmente nos setores de agronegócio e indústria, embora alguns produtos tenham sido excluídos, como suco de laranja, aviões, castanhas, fertilizantes e gás natural.
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Brics fortalecem laços e buscam reduzir dependência do dólar
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro-ministro indiano Narendra Modi devem se reunir por telefone para tratar das tarifas americanas, segundo Celso Amorim, assessor especial da Presidência. Também está prevista conversa com o presidente chinês Xi Jinping.
Modi planeja visitar a China ainda este mês, a primeira viagem ao país em sete anos, com paradas no Japão. A retomada do diálogo entre Índia e China tem sido marcada por visitas de alto nível nos últimos meses.
Vale lembrar que os países do Brics avaliam maneiras de reduzir o uso do dólar nas transações internacionais. No encontro do bloco em julho de 2025, foram discutidas iniciativas como:
- Fortalecer o Banco de Desenvolvimento do Brics para financiar projetos em moedas locais;
- Criar mecanismos para pagamentos multilaterais em moedas nacionais, com plataformas como Brics Bridge e Brics Pay;
- Propor um sistema alternativo ao SWIFT para proteger os países das sanções vinculadas ao controle ocidental;
- Reforçar o Arranjo Contingente de Reservas como alternativa ao FMI;
- Incentivar o comércio bilateral utilizando moedas locais, reduzindo custos e volatilidade cambial.
Embora exista a discussão sobre uma possível moeda comum no futuro, o foco atual é fortalecer acordos bilaterais e sistemas financeiros locais para reduzir a dependência do dólar.
China e Rússia, por exemplo, já operam sistemas alternativos de pagamento, e o Brasil, como presidente do bloco em 2025, apoia iniciativas para operar no comércio global sem o dólar.
Em resposta, Trump ameaçou impor tarifas elevadas a países do Brics caso avancem na substituição do dólar.