Coluna do Caio Mesquita

Caio Mesquita: Empilhando os tijolos

27 set 2025, 15:27 - atualizado em 27 set 2025, 15:05
Caio Mesquita, Empiricus
(Imagem: Divulgação/Empiricus)

Na semana passada, Amancio Ortega, fundador da Zara, gigante espanhol do varejo de moda, apareceu nas manchetes por um motivo pouco habitual. Vendeu um edifício na Madison Avenue, em Nova York, por US$ 50 milhões.

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O problema é que havia pago US$ 115 milhões em 2006. Uma perda de quase 60%, isso em termos nominais. Se colocar a inflação do período na conta, o buraco é ainda maior.

Se fosse um investidor comum, seria um desastre. Para Ortega, é apenas um detalhe. Um tropeço irrelevante dentro de uma estratégia que o transformou em um dos maiores proprietários de imóveis do planeta.

Pouca gente sabe, mas a verdadeira obra-prima de Ortega não é a Inditex, sua holding empresarial. É a Pontegadea, seu family office.

Com paciência e disciplina, ele reinvestiu sistematicamente os dividendos bilionários da Zara em imóveis de altíssimo padrão. Londres, Paris, Madri, Miami, Nova York. Hoje são mais de 20 bilhões de dólares em ativos.

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São prédios icônicos, alugados para inquilinos sólidos, que garantem fluxo de caixa recorrente e previsível.

Essa disciplina vem de longe. Ortega nasceu em 1936, no interior da Espanha, filho de um ferroviário e de uma dona de casa. Cresceu em uma família humilde.

Aos 14 anos, abandonou os estudos para trabalhar em uma loja de roupas em La Coruña. Aprendeu a costurar, cortar tecido, lidar com clientes.

Sua primeira empresa de confecções, a Confecciones GOA, surgiu em 1963. A Zara foi criada em 1975, em sociedade com sua então esposa, Rosalía Mera.

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O sucesso estrondoso da Inditex lhe deu os dividendos que sustentaram o salto para o real estate. Ortega sempre manteve controle majoritário da companhia.

Isso garante que bilhões de euros retornem todos os anos ao seu caixa pessoal. É esse fluxo que alimenta não só os investimentos imobiliários, mas também a filantropia por meio da Fundação Amancio Ortega, criada em 2001.

Nos últimos anos, ele diversificou ainda mais. Comprou participações em portos estratégicos no Reino Unido. Investiu em energia renovável na Europa.

A mesma lógica que aplicou na moda, de escala global e visão de longo prazo, ele aplicou à gestão do patrimônio familiar.

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O episódio de Manhattan mostra que até os maiores tropeçam. O mercado de escritórios mudou. O home office corroeu a demanda. Ativos antigos perderam valor.

Vender com prejuízo faz parte do jogo. O que importa não é ganhar em cada ativo isolado, e sim manter a consistência ao longo das décadas.

E é aqui que o investimento imobiliário mostra sua força. Imóvel é, antes de tudo, um hedge natural contra a inflação. Preços sobem, aluguéis acompanham.

Além disso, imóveis são naturalmente escassos. Não se cria mais espaço no mundo. O estoque é limitado.

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E no segmento premium, alguns imóveis são simplesmente irreplicáveis. O Shopping Iguatemi em São Paulo. A avenida Vieira Souto, no Rio de Janeiro. Apenas para dar dois exemplos. Ícones que carregam um valor que vai além da matemática.

Há também um detalhe cultural que me chama atenção. Ortega é galego. A Galícia é a parte mais portuguesa da Espanha.

E nós, descendentes de portugueses, sabemos bem: existe uma tradição ibérica no investimento imobiliário. Tijolo é segurança, é renda, é herança. É um instinto transmitido de geração em geração.

Ortega imprimiu a mesma mentalidade, em escala global.

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A lição é clara. Perdas pontuais vão acontecer. Mas patrimônio se constrói com diversificação, disciplina e tempo.

É isso que transforma um tropeço em Manhattan em apenas uma nota de rodapé dentro de uma história de sucesso que atravessa gerações.

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Sócio-fundador e CEO da Empiricus
É administrador pela FGVUSP e possui MBA pela Columbia University de Nova York. Foi professor de Mercado de Capitais no IBMEC São Paulo. Trabalhou no Bank Boston e foi diretor de mercado de capitais no Banco Paribas e Banco Brascan. Antes de fundar a Empiricus, foi fundador e sócio-diretor da rede de restaurantes Wraps/Gofresh.
CaioMesquita@moneytimes.com.br
É administrador pela FGVUSP e possui MBA pela Columbia University de Nova York. Foi professor de Mercado de Capitais no IBMEC São Paulo. Trabalhou no Bank Boston e foi diretor de mercado de capitais no Banco Paribas e Banco Brascan. Antes de fundar a Empiricus, foi fundador e sócio-diretor da rede de restaurantes Wraps/Gofresh.