Coluna do Hsia Hua Sheng

China: Novos estímulos à economia não trarão um milagre, e sim estabilidade

26 jun 2023, 12:47 - atualizado em 26 jun 2023, 12:47
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Chinaprecisa de tempo para absorver as mudanças estruturais que vêm sendo adotadas pelo governo, e as correções de rumo para alcançar um patamar mais elevado de renda, diz Hsia Hua Sheng (Imagem: Pixabay/ Pexels)

Recentemente, o governo chinês agiu rápido para reerguer a economia. Uma série de medidas de estímulos tem sido adotada para garantir o crescimento da China. Mas, ao contrário de um pacote agressivo de estímulos que acelere a economia, como queriam os analistas e investidores do mercado, o governo fez um pacote conservador.

O objetivo desse pacote é garantir a estabilidade e a sustentabilidade da China. Essa condição vai permitir a continuidade de sua reforma estrutural, reduzindo os efeitos negativos durante esse curto intervalo de transição. O planejamento econômico da China abrange períodos de 5 anos.

O governo trabalha com medidas de curto prazo para garantir as condições necessárias para poder executar gradualmente uma política industrial mais moderna e de alto valor tecnológico e sustentabilidade ambiental no horizonte de 5 a 10 anos.

Desde o início de junho, o governo tem relaxado a política monetária para injetar mais dinheiro na economia,  reduzindo a taxa de juros. O Banco Central da China começou no dia de junho, ao cortar a taxa de remuneração da poupança e de depósitos a prazo.

Uma semana depois, a taxa de empréstimos para médio prazo também foi reduzida para promover mais dinamismo na economia de pequenas e médias empresas, que são responsáveis por movimentar a economia doméstica e  p comércio internacional. E, no dia 20, a taxa de juros de longo prazo, que serve de referência para o financiamento imobiliário, também foi recuou.

O mercado financeiro, que foca no curto prazo, ficou desapontado, quando viu que o Banco Central chinês adotou o gradualismo na redução de taxa de juros, com queda média de 0,10 ponto percentual, pois os investidores estão acostumados com  o estilo do FED americano, que tem elevado a taxa de juros nos Estados Unidos aceleradamente com múltiplos de 0,25 p.p. para conter a alta inflação.

Para piorar, o mercado também ficou desapontado com a visita do secretário de Estado dos EUA, Antony Bliken, à China. Mesmo que tenha trazido esperança sobre a estabilidade política da intensa rivalidade entre EUA-China, pouco resultado concreto foi transferido para campo econômico.

O mercado tem reagido com a desvalorização do Renmimbi ($RMB) e maiores oscilações nos principais índices do mercado acionário americano (Dow Jones e Nasdaq) e chinês (Shanghai Composite Index e Shengzhen composite index).

China não será ajudada por política monetária agressiva agora

Mas, a situação e o horizonte econômico da China são diferentes. O tempo é o melhor remédio para a China. O Banco Central chinês sabe disso. O país precisa de tempo para absorver as mudanças estruturais que vêm sendo adotadas pelo governo, e as correções de rumo para alcançar um patamar mais elevado de renda. Um pacote de política monetária agressiva não vai ajudar nesse momento e só vai criar mais volatilidade no mercado.

Por exemplo, para setor imobiliário, a redução de taxa de juros para financiamento não vai aumentar o ritmo de construção de prédios, mas vai permitir que as construtora terminem as obras iniciadas. A prioridade do setor imobiliário não é mais construir freneticamente, criando movimentos especulativos de preços para investidores. Hoje, esse setor volta à sua origem, para atender a necessidade de moradia da população e rentabilizar as construtoras conforme o retorno médio da economia.

No médio e longo prazo, os preços de imóveis vão se ajustando, até que a demanda se encontre com a oferta e a  situação se equilibre. Vários grupos de investidores estrangeiros e domésticos já estão, aos poucos, entrando novamente no mercado para explorar essas oportunidades.

Paralelamente, as reformas institucionais e estruturais continuam a todo vapor. Há comissões econômicas do Congresso que estudam e fazem propostas concretas para aprimorar leis e regulamentações que favorecem ainda mais a economia e o ambiente de negócio na China.

Em 16 de junho, o primeiro-ministro, Li Qian, aprovou políticas de incentivo ao financiamento de empresas de inovação tecnológica. Essas comissões também refinaram as regulamentações dos fundos de private equity, visando maior transparência e maior segurança institucional para estabelecer regras justas, a fim de garantir a segurança jurídica do patrimônio dos cotistas, investidores e seus investidos.

Grandes multinacionais voltam a investir no país

Ainda está cedo para avaliar a reação dos investidores e empresários globais às medidas que vêm sendo adotadas pela China, uma vez que elas são graduais e demandam tempo para demonstrar seus efeitos. Mas, as multinacionais globais, principalmente as empresas do setor de tecnologias, de energias renováveis e de inteligências artificiais, estão interessadas em conversar com os setores privados e públicos. Também estão visitando a China para entender melhor esse novo momento. E aos poucos, várias multinacionais estão voltando a investir na produção na China.

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Por exemplo, mesmo no meio da guerra tecnológica entre Estados Unidos e China, a decisão recente da Micron Technology de investir aproximadamente US$ 600 milhões para expandir sua produção na China demonstra essa confiança no mercado, na economia e nas políticas chinesas.

A empresa americana Micron é um importante player na cadeia de semicondutores, sendo tradicional e bem conhecida na produção de memória de computador e armazenamento de dados.

Diferentes das outras indústrias, o desenvolvimento de alta tecnologia e de inteligência artificial se beneficiam significativamente a capacidade de um concentrador de inovação (Hub), que consegue congregar todos os fatores de produção de forma rápida e precisa.

A China é o único país hoje que tem essa capacidade. Além de ter um quadro industrial tecnológico, centros de pesquisas e ecossistema de cadeia de suprimento com equipamentos mais avançados, a China possui infraestrutura logística eficiente e de baixo custo que conecta toda cadeia de produção em Taiwan e Hong Kong. Essas intensas trocas comerciais de componentes também se estendem aos países próximos da China, tais como Coreia do Sul e Japão, e outros países de sudestes asiático.

Portanto, gradualmente, as reformas estruturais vão surtir efeitos positivos e duradouros na economia chinesa. Mesmo que mais incentivos em áreas como fiscal, habitacional e consumo possam vir, esses novas medidas visam  garantir estabilidade econômica e reduzir a exposição de riscos sistêmicos na China, nesta nova fase desafiadora de transição estrutural. É bom lembrar mais uma vez: um crescimento acelerado e quantitativo, que não traga qualidade e igualdade social, não é o objetivo chinês.

*As análises e opiniões são pessoais e não representam uma visão institucional

Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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