Coluna do Hsia Hua Sheng

China: PIB do primeiro semestre de 2023 mostra que reminbi continua firme

19 jul 2023, 16:40 - atualizado em 19 jul 2023, 16:40
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“O valor do reminbi (RMB) é influenciado não só pelas oscilações de curto prazo, mas também pela confiança dos investidores nos fundamentos da China no longo prazo”, diz Hsia Hua Sheng (Imagem: REUTERS/Thomas White/Illustration)

A taxa de câmbio reminbi/dólar (RMB/USD) tem sofrido grandes oscilações recentemente. Neste ano, o yuan da China chegou a se desvalorizar 4,5%, e depois se recuperou … O que está acontecendo com RMB? O RMB enfraqueceu?

No curto prazo, a taxa de câmbio do RMB pode ter uma oscilação maior devido às especulações sobre as taxas de juros das principais economias mundiais, a redução da atividade econômica global, guerras comerciais e tecnológicas, regionalização de cadeia de suprimento e as incertezas sobre a transição da economia chinesa. Mas, no longo prazo, a tendência é ficar estável, devido ao bom fundamento econômico da China.

A China vem adotando medidas de estímulo à economia, reduzindo a taxa de juros do RMB. Diferente dos Estados Unidos, que elevam a taxa de juros para conter a pressão da alta inflação, a China tem reduzido suas taxas como parte de medidas de estimulo à economia. Hoje a taxa de juros em RMB está em torno de 2,65%, enquanto a taxa americana está ao redor de 5,25%.

Essa diferença de taxas de juros interna e externa provoca pressão de desvalorização de curto prazo na moeda chinesa. Nesse contexto, os investidores realocam seus recursos para a moeda que teria maior remuneração no curto prazo. Por isso, alguns investidores de RMB vão preferir aplicar parte de seus recursos em dólares, vendendo RMB e comprando USD, pressionando a desvalorização do RMB.

Como essa diferença é relativa às taxas de juros das duas maiores economias do mundo, a pressão de desvalorização de curto prazo vai depender das diferenças de expectativas dos investidores sobre quando o Federal Reserve encerrará seu ciclo de aperto monetário, e, ao mesmo tempo, até quando o governo chinês usará a redução de taxas de juros como principal ferramenta da política expansionista.

Reminbi da China segue movimento de países com juros baixos para estimular economia

Na verdade, essa desvalorização era esperada. Além da China, o Japão, que vem estimulando sua economia com taxas de juros baixos, também sofreu uma desvalorização de 8% desde o início do ano. Já os países que adotaram uma política monetária restritiva, devido à elevada pressão inflacionária, tiveram suas moedas se valorizando neste ano. Por exemplo, o real do Brasil valorizou quase 8%, e o euro, 2,4%.

Diferente do passado do RMB, quando as oscilações cambiais eram menores, o mercado cambial de RMB tem reagido rapidamente às expectativas e notícias sobre a China. Devido às reformas introduzidas pelo regulador da China, o mercado de câmbio chinês está cada vez mais aberto, orientado para o mercado, eficiente e globalizado.

Com maior integração a outras moedas globais, os investidores institucionais podem movimentar seus recursos de um pais para outro e montar posições e operações financeiras para maximizar e proteger seus retornos com menor risco.

O mercado de câmbio RMB Offshore é um bom exemplo. Sabemos que o RMB pode envolver transações em CNY (onshore) ou CNH (offshore). Se for CNY, então é moeda que só pode circular nas transações dentro do território chinês. Se for CNH, pode circular livremente no mercado fora da China. Embora as taxas de câmbio de CNY e CNH convirjam ao longo do tempo, o câmbio de CNH é mais sensível.

A maioria dos detentores de CNH é composta por investidores estrangeiros que trocam RMB por outras moedas para atender suas necessidades. Como o estoque de CNH aumenta com a internacionalização de RMB, mais investidores participarão desse mercado e mais volátil ele fica no curto prazo, principalmente neste momento, em que existe uma especulação sobre as divergências de políticas monetárias no mundo.

No entanto, o valor do RMB é influenciado não só pelas oscilações de curto prazo, mas também pela confiança dos investidores nos fundamentos da China no longo prazo. O fundamento econômico chinês continua sólido. Mesmo com um ambiente externo extremamente desafiador com a guerra comercial e tecnológica, e  com a queda da economia global, o PIB da China cresceu 6,3% na comparação anual do segundo trimestre de 2023 – lembrando, ainda que a China já cresceu 4,5% no primeiro trimestre.

Olhando com mais detalhe a composição do PIB, podemos perceber que a confiança na economia chinesa se manteve. Com exceção dos investimentos imobiliários, a maioria dos setores é positivo. Os elevados crescimentos de setores de alta tecnologia, economia digital e energias renováveis têm compensado a expansão mais modesta de setores tradicionais de manufaturas, como calçados, vestuários e utensílios. Por exemplo, o setor de “pilhas“ de energia solar cresceu 54,5%, e o de automóveis elétricos cresceu 35%. O comércio eletrônico também cresceu acima de 10%.

O setor de serviços também está se recuperando. Usando dados consolidados, no primeiro semestre de 2023, em média, o gasto de serviço por habitante cresceu 12,7% comparado com o ano passado. Com a volta do trabalho presencial, a alimentação fora de casa cresceu 21,4%, e o transporte coletivo privado, 56,3%. Esse crescimento foi corroborado com dados de atividades econômicas, por exemplo, uso de energia elétrica cresceu 9,9%, e turismo, 63,9%.

PIB da China também expõe problemas a serem melhorados

Isso não significa que esses dados não revelaram problemas estruturais a serem melhorados. A taxa de desemprego entre jovens está elevada. Um outro ponto crítico é o baixo investimento em ativos fixos. Mesmo que os investimentos públicos estejam crescendo nas hidrelétricas e na economia verde, os investimentos do setor privado ainda estão tímidos.

A reestruturação e a crise do setor imobiliário afetaram negativamente o investimento privado neste momento. Tradicionalmente, o setor imobiliário sempre foi um dos líderes de investimento privado, elevando o crescimento do PIB.

Além disso, as empresas chinesas e as multinacionais estrangeiras estão reavaliando o retorno financeiro das suas operações para fazer novos investimentos. Elas estão remodelando suas fábricas e negócios, não só para se inserir na nova economia da China mais moderna, limpa e mais tecnológica, mas também para conectar seus investimentos da China com a nova regionalização de cadeia de suprimento de produção global.

Por exemplo, embora algumas cadeias de produção tenham sido transferidas para outros países do Sudeste Asiático, os principais componentes tecnológicos e serviços técnicos dependem das linhas de produção da China. Os novos investimentos também podem vir das áreas de serviços. Com o envelhecimento da estrutura etária chinesa, os setores financeiros, de seguros, de saúde e de entretenimento podem oferecer ótimas oportunidades de negócios.

Portanto, o governo trabalha para que a confiança na economia chinesa continue firme. Isso é o principal valor do RMB no longo prazo, independente das oscilações cambiais do curto prazo. Essa mudança gradual da composição do crescimento PIB mostra que a China está no caminho certo, com o setor de tecnologia, economia digital e energias renováveis ganhando cada vez mais participação no PIB da China.

Os pacotes de estímulos para impulsionar o consumo e as políticas industriais para atrair investimentos privados também garantem a estabilidade da moeda nesse período de transição, consequentemente, consolidando gradualmente o RMB como mais uma alternativa de moeda global ao dólar e ao euro.

*As análises e opiniões são pessoais e não representam uma visão institucional

Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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