Com grande safra, Brasil começa temporada de exportação de milho cheia de desafios

É no segundo semestre que as exportações de milho do Brasil ganham maiores volumes, mas o início da temporada de embarques sinaliza desafios como uma China mais ausente nas importações e uma forte concorrência esperada dos Estados Unidos, de acordo com analistas ouvidos pela Reuters.
Não bastassem essas questões, há ainda dificuldades logísticas em meio a um atraso na colheita de 2024/25. Ao mesmo tempo em que começa o período de exportações de milho, o Brasil ainda tem uma parte importante de sua safra recorde de soja para embarcar, competindo por espaço nos portos, acrescentaram os especialistas.
Ainda assim, as indicações são de um crescimento nos embarques do cereal do Brasil, segundo exportador mundial atrás dos EUA, graças à colheita da segunda maior safra da história. De acordo com os últimos dados do governo — geralmente mais conservadores que os do setor privado –, a colheita somará 128,3 milhões de toneladas, aumento de 11% ante o ciclo passado.
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“As dúvidas vêm do lado da demanda. Do lado da oferta, o Brasil tem uma safra muito boa, temos um excedente exportável, porém vamos precisar encontrar compradores”, disse o analista de inteligência de mercado da consultoria StoneX Raphael Bulascoschi.
A StoneX estima as exportações brasileiras na atual temporada em 42 milhões de toneladas. Este volume supera os embarques de 38,5 milhões da safra passada, mas fica abaixo do recorde de 54,6 milhões de toneladas visto há dois anos.
Bulascoschi lembrou que a China foi um importador de milho importante do Brasil entre 2022 e 2023, mas está “mais ausente no mercado”, após uma grande safra com sua política de ser autossuficiente.
“Isso é uma preocupação. A gente pensa bastante: onde vai ter mercado para tanto milho? O consumo global está aquecido? Está aquecido, mas os Estados Unidos no ano passado colheram uma safra muito boa, e este ano está apontando também, tudo indica, que vão colher uma safra recorde”, comentou.
O especialista da Consultoria Agro do Itaú BBA Francisco Queiroz concorda que a China “fora do mercado de importação de milho” influencia negativamente os embarques do Brasil, que terá de contar com a demanda de países como Irã, Egito e Vietnã, mas que não têm mesma capacidade de volume do gigante asiático.
Queiroz lembrou ainda que entre fevereiro e junho os embarques de milho do Brasil ficaram quase 17% abaixo do mesmo período da safra passada. “Temos uma projeção de 42 milhões de toneladas (de exportação anual), porém a depender dos embarques a partir de agora, podemos revisar esse número para baixo”, disse ele.
Fator EUA para o milho
Ele destacou que o milho nacional se mostrou competitivo ante o norte-americano recentemente. Mas ressaltou que, se a safra dos EUA se confirmar recorde, a janela de exportação brasileira deve ser “bastante limitada”, já que nos últimos meses do ano os exportadores da América do Norte colocam o produto da safra nova no mercado.
O especialista do Itaú BBA citou ainda entre os desafios um possível alongamento da exportação de soja do Brasil, que deverá exportar mais de 100 milhões de toneladas este ano.
Segundo ele, caso não haja uma solução das questões comerciais entre EUA e China, isso deve seguir trazendo a demanda chinesa para a soja brasileira também no segundo semestre, dificultando um maior ritmo dos embarques de milho. As vendas mais lentas do cereal pelos produtores também são outro desafio.
Para a analista da AgRural Daniele Siqueira, além do atraso na colheita, a grande safra de milho e o câmbio trazem dificuldades para que toda a exportação prevista aconteça ainda este ano.
“O que pode jogar mais milho para 2026 é o tamanho da safrinha, que é muito grande, e eventualmente uma dificuldade do Brasil de competir com o milho dos EUA e da Argentina nos próximos meses, especialmente devido ao dólar mais baixo, que torna a originação do milho no Brasil mais cara”, disse ela.
Para o analista da Céleres Gabriel Santos, apesar de todas essas questões, as exportações brasileiras poderão crescer mais. “A nossa expectativa é de um milho brasileiro muito competitivo, teve a surpresa agradável na produtividade, o despejo vai ser alto, e vai ter competitividade para exportar essas 51 milhões de toneladas”, disse ele, referindo-se à estimativa da consultoria.