Saúde

Coronavírus: Brasil saiu rápido demais de uma quarentena frouxa; eis as provas

22 maio 2020, 12:25 - atualizado em 22 maio 2020, 12:47
Enfermeiras Saúde Coronavírus
Só no Brasil: enfermeiros são hostilizados em Brasília por defender o isolamento social (Imagem: REUTERS/Ueslei Marcelino)

O Brasil saiu rápido demais de uma quarentena bastante frouxa para combater o coronavírus, apesar das queixas de parte dos brasileiros que defendem abordagens alternativas às recomendadas pela Organização Mundial de Saúde e pelos médicos. Esta é a conclusão inevitável, quando se comparam os dados do isolamento social brasileiro com os de outros países.

O Credit Suisse deu uma pista, em um relatório enviado a clientes nesta sexta-feira (22) e obtido pelo Money Times. Assinado por Regis Cardoso, a análise utiliza dados dos relatórios de mobilidade do Google, desenvolvidos para contribuir com informações sobre o isolamento social em diversos países.

No caso do Credit Suisse, os números foram utilizados para comparar o gradual retorno à normalidade, com o objetivo de antecipar a volta da demanda por combustíveis. Neste sentido, o banco suíço compara o Brasil aos Estados Unidos, e afirma que estamos voltando mais rápido da quarentena e, portanto, é possível que a venda de combustíveis acelere.

Retrato da crise

Mas, o mais interessante, é observar relações que o analista do Credit Suisse não destacou, simplesmente por estar interessado em outras correlações. Ao comparar o Brasil com outros países apresentados no estudo, vê-se com clareza como alcançamos, em cerca de um mês, o terceiro lugar em número de casos – e com fortes chances de tomarmos a vice-liderança da Rússia.

Queda da mobilidade (%)
País 29/mar 11/abr 13/mai
Brasil -51% -38% -36%
Argentina -71% -59% -45%
EUA -40% -35% -28%
Itália -82% -67% -47%
França -76% -65% -40%
Espanha -81% -81% -52%
Alemanha -59% -33% -25%
Reino Unido -65% -60% -54%
Portugal -68% -63% -49%
Japão -21% -24% -25%

A primeira data analisada pelo Credit Suisse, com base nos relatórios de mobilidade do Google, é 29 de março. Naquele dia, segundo o Google, o trânsito de pessoas era 51% menor que em janeiro no Brasil. Pode parecer muito, mas, dos dez países listados pelo banco suíço, estávamos à frente apenas dos Estados Unidos (40%) e do Japão (21%).

Excluindo-se Brasil, EUA e Japão, a taxa média de isolamento dos demais sete países era de 72%. Traduzindo: enquanto outros povos levavam realmente a sério o perigo da pandemia de coronavírus já em março, colocando a grande maioria da população em isolamento, os brasileiros – e não só o presidente Jair Bolsonaro – mostravam que, na prática, viam a Covid-19 como uma gripezinha.

Entre 29 de março e 11 de abril (a segunda data apresentada no relatório do Credit Suisse), nove dos dez países listados afrouxaram as medidas de isolamento social. A exceção foi o Japão, que elevou de 21% para 24% as pessoas nesta condição.

O Brasil acompanhou esse movimento, e o isolamento social, segundo o relatório do Google, baixou de 51% para 38%. Novamente, os EUA pareciam mais relapsos que nós, com 34%. Mas, novamente, os sete países (excluindo-se Brasil, EUA e Japão) apresentaram uma média de 59% de isolamento, mesmo após relaxar as medidas.

Relaxar não é “liberou geral”

Ou seja, os países que levaram a pandemia a sério partiram de um patamar mais alto de isolamento, e, mesmo relaxando-o, ainda mantinham mais pessoas nessa condição em meados de abril, que os brasileiros, que começaram num nível já baixo e, ao furar a quarentena, reduziram ainda mais o percentual.

O último dia analisado pelo Credit Suisse é 13 de maio, quando o Brasil contava com 36% de isolamento, segundo os critérios do Google. O Japão havia elevado seu percentual para 25%; e os EUA regrediram para 28%. Os outros sete países da amostra mantiveram o ritmo de relaxamento, mas, ainda assim, 44% da população estava reclusa, em média.

Aumento da circulação (pp)
País 29/03 a 11/04 12/04 a 13/05 Total % até 11/04
Brasil 12 2 14 86%
Argentina 11 15 26 43%
EUA 4 7 11 37%
Itália 16 20 36 45%
França 11 25 36 31%
Espanha 10 19 29 35%
Alemanha 26 8 34 77%
Reino Unido 6 6 12 50%
Portugal 5 14 19 27%
Japão na -1 -4 na

A evolução desses números mostra o óbvio: os países que adotaram medidas sérias de isolamento social para conter o coronavírus já começaram a relaxá-las, mas ainda mantêm níveis maiores que o Brasil e os EUA, de quem Bolsonaro e sua equipe copiam passos e atitudes.

O resultado não poderia ser mais claro. Em 29 de março, os EUA tinham 140.223 casos confirmados; em 11 de abril, 525.436; em 13 de maio, 1,380 milhão. Nesta quinta-feira (21), já eram 1,565 milhão, assumindo a liderança isolada desse sombrio campeonato.

Rumo ao topo

O Brasil, seu fiel seguidor, passou de 4.256 casos confirmados em 29 de março, para 20.727, em 11 de abril; 188.974 em 13 de maio; e 310.087 casos ontem. Como a Rússia contabiliza cerca de 320 mil casos, é possível que alcancemos o segundo lugar em número de contaminados nos próximos dias.

donald Trump
Referência do governo brasileiro: Donald Trump também minimizou a crise no começo; hoje EUA lideram casos de coronavírus (Imagem: REUTERS/Leah Millis)

Enquanto isso, a Itália, que ocupou a nada honrosa liderança no ranking de contágios, desbancando a China, onde o vírus surgiu, impôs um severo isolamento social. Em 29 de março, 82% das pessoas estavam em casa; em 11 de abril, 67%; em 13 de maio, 47%.

O resultado? De líder do ranking, com 97.689 casos, no fim de março, conseguiu achatar sua curva e contava, ontem, com 228 mil casos, atrás de EUA, Rússia, Brasil, Alemanha e Reino Unido.

Num campeonato em que ser o último colocado é o que importa, o Brasil faz tudo para estar no topo do ranking – e na contramão do mundo.

Diretor de Redação do Money Times
Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.
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Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.
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