Coluna do Hsia Hua Sheng

Economia da China: O que se espera dos números do terceiro trimestre de 2023?

02 out 2023, 12:09 - atualizado em 02 out 2023, 12:10
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“Desde o início de 2023, a China tem trabalhado na circulação interna, dentro da estratégia de circulação dual”, explica Hsia Hua Sheng (Imagem: Unsplash/Li Yang)

É esperado que os indicadores econômicos do terceiro trimestre de 2023 reforcem a tese de que a China está deixando para trás as piores instabilidades nessa transição econômica estrutural, após as interrupções causadas pela Covid-19. A evolução dos números até agosto aponta para essa direção.

Gradualmente, a China está seguindo seu caminho planejado para uma economia mais moderna, verde, socialmente justa e altamente tecnológica.

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Apesar de um ritmo mais lento, os principais indicadores chineses da circulação interna já demostram sinais de recuperação. Em agosto, as vendas no varejo de bens de consumo, um indicador importante da força do consumo do país, aumentaram 4,6 % em relação ao ano anterior.

Da mesma forma, o valor agregado industrial da China também aumentou 4,5%. Essa taxa é melhor que o desempenho de julho. A taxa de crescimento em investimento fixo também registrou um resultado positivo.

Esses dados confirmam a atuação importante do pragmatismo nessa transição econômica. Já que o comércio internacional e a globalização dos mercados são influenciados pelas questões de conflitos geopolíticos, e não mais pela eficiência econômica, a China não pode depender mais somente desse macro ambiente global para apoiar crescimento do PIB.

A solução é crescer de forma segura com o próprio mercado doméstico. Por isso, desde o início de 2023, a China tem trabalhado na circulação interna, dentro da estratégia de circulação dual, especificamente, cultivando seu crescimento com base na demanda doméstica de serviços, no fortalecimento da indústria e da cadeia produtiva nacional, no investimento de capital e no desenvolvimento da alta tecnologia autônoma.

Os setores de maior destaque na China

Destaco aqui os setores domésticos que estão se recuperando mais rápido e que devem brilhar também nos números do terceiro trimestre, em comparação com períodos anteriores:

a) Cadeia de manufatura de automóveis e aviões – A venda doméstica de carros elétricos das marcas chinesas (por exemplo, BYD, Greatwall, Chery, JAC Motors etc.) tem crescido de forma acelerada, superando até as maiores montadoras globais japonesas e alemãs. Após automóveis, é a vez de consolidar localmente a cadeia produtiva da produção aeronáutica, com a entrada oficial do C919. A partir de 04 de agosto, quem visita o Panda Gigante, na cidade de ChengDu, pode pegar a ponte aérea Shanghai- Chengdu, da China Eastern Airline, operada com aviões C919.

b) Setor de turismo – Além dos números recordes dos próprios turistas chineses nos pontos turísticos, a China começou a facilitar a emissão de vistos para estrangeiros. Por exemplo, a partir de15 de agosto, os Consulados da China no Brasil, além de encurtar o prazo de agendamento para entrevistas, simplificaram os formulários on-line. Há também horários flexíveis para atender brasileiros com viagens urgentes para China. Os grandes eventos esportivos (como os Jogos Asiáticos nesse momento), feiras e shows internacionais também vão atrair mais turistas.

c) Setor de restaurante, alimentação e de vestuários – Com a volta ao trabalho presencial e a retomada da produção nas indústrias, a população retoma as compras de roupas e volta a “comer fora”. Aqui, surge um fenômeno interessante: diferentemente dos períodos anteriores da pandemia, quando as pessoas se aglomeravam para comer nos restaurantes e frequentar shoppings físicos, hoje, essa demanda se concentra virtualmente em entregas rápidas e nos deliveries para refeições.

d) Setor de eletrônicos e de Inteligência Artificial – A integração do ecossistema da internet das coisas com a Inteligência artificial (IA) está promovendo um upgrade dos processos de fabricação e de padronização nas grandes marcas de eletrônicos chineses. Mesmo que tenha uma longa caminhada para chegar no estado de arte da fabricação dos chips, as empresas chinesas têm demonstrado sua autonomia e capacidade técnica de produzir semicondutores suficientemente adequados para aplicações comerciais, como o lançamento de aparelhos eletrônicos que “conversam” entre si.

e) Setor de joias – O setor de joias, ouro e pedras preciosas também cresce a uma taxa de dois dígitos. Uma parte da população usa ouro como um investimento alternativo às aplicações e à poupança, que sofre com a queda das taxas de juros em RMB.

f) Setor de infraestrutura de energias renováveis – A demanda de energia elétrica vai aumentar com o maior uso dessa fonte de energia também nos veículos automotores. Além de continuar investindo em hidrelétricas, a China está recuperando área degradadas para fins de criação de fontes de energias renováveis com tecnologias eólica ou solar. Com aumento dessa capacidade geradora, a China vai conseguir manter o custo baixo na sua cadeia produtiva de transformação.

Os setores ainda enfraquecidos

Apesar do bom desempenho desses setores domésticos, isso não significa não haja fraquezas estruturais a serem resolvidas na economia chinesa. Não só a queda de vendas no setor imobiliário, mas o excesso de endividamento de algumas das maiores construtoras são críticos.

Isso será resolvido gradualmente com os novos incentivos do governo central, que também vai aliviar o aperto orçamentário dos governos municipais. Por exemplo, o novo programa de urbanização que facilitará o financiamento para moradores de áreas rurais para adquirir seu primeiro imóvel também na cidade.

A recente queda do FDI e a saída de capital estrangeiro, devido às restrições americanas aos investimentos na China, também são pontos críticos. Para superar essas restrições geopolíticas, a China está trabalhando em dobro para reconquistar os investidores estrangeiros.

A China está aprimorando suas instituições e regulações financeiras e cambial para oferecer segurança institucional para empresas estrangeiras que investem na China. Um exemplo são os projetos em estudo que garantem a liberdade de circulação de capital e câmbio nas zonas livres financeiras em Shanghai e Beijing.

Portanto, a pior fase de instabilidade econômica já está sendo superada na China. A partir dos dados divulgados até agosto, espera-se um número do terceiro trimestre melhor do que o mercado projeta e mais estável que os de períodos anteriores.

Os setores relacionados com a dinâmica da circulação interna são fundamentais para essa recuperação: manufaturas de carros e aviões, turismo, alimentação, restaurantes, eletrônicos, Inteligência Artificial, joias e infraestrutura para economia verde.

Pelos últimos números do início de setembro, os setores imobiliários e FDI poderão apresentar resultados críticos. Mas, esses números poderão ser menos críticos do que em períodos anteriores, demonstrando a boa efetividade dos incentivos governamentais.

*As análises e opiniões são de responsabilidade exclusiva do autor e não representam uma visão das instituições da qual o autor pertence.

Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) S.A. e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- EAESP). Ele é economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), doutor e mestre em administração em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV – EAESP). Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais e possui várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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