AgroTimes

El Niño, commodities e custos: Desafios e oportunidades para o agronegócio em 2024

09 jan 2024, 16:05 - atualizado em 09 jan 2024, 16:09
agronegocio el niño
A redução de preços e o aumento dos custos de produção pode afetar produtores, mas elevar o poder de barganha do agronegócio em 2024 (Imagem: Pixabay/reijotelaranta)

Na primeira coluna do ano de 2024 é quase obrigatório trazermos um olhar para o ano que começa. Como será o ano para o agro brasileiro? E o olhar sobre a sustentabilidade no agronegócio em 2024?

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

São perguntas que nos assaltam a mente, principalmente no contexto atual, nos âmbitos paroquiais e internacionais. Achamos bem interessante fazer esse exercício até mesmo para contextualizarmos a nossa pauta quinzenal sobre agronegócio e sustentabilidade para o nosso leitor dentro de uma visão mais estruturada e estratégica para o ano.

A Matriz SWOT (FOFA em português) é uma ferramenta de análise estratégica muito aplicada na administração de negócios e empresas.

Essa matriz permite identificar pontos fortes e fracos do negócio e tratá-los sob a perspectiva das oportunidades e desafios (ou ameaças) para o sucesso de determinado negócio, empreita ou produto e pode ser representada conforme abaixo:

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Fonte: FGV

Assim, se analisarmos a conjuntura atual – e potenciais desdobramentos dessa conjuntura no decorrer do ano de 2024 – podemos tentar aplicar a ferramenta para o contexto macro e micro do setor, traçando juntos uma espécie de planejamento estratégico para o agronegócio brasileiro em 2024. 

A força do agronegócio brasileiro como ponto de partida

A análise em perspectiva das forças representativas e consolidadas do agronegócio brasileiro não podem deixar de compor a premissa básica para esse raciocínio.

Dentre as forças do “S” da matriz SWOT que envolvem o agro brasileiro estão números cada vez mais expressivos de produção, aumentos vertiginosos e consistentes de produtividade, aplicação cada vez mais amplificada de novas técnicas de cultivo, além de um empreendedorismo “profundo” e arraigado do homem do campo.

Mão-de-obra cada vez mais especializada e capacitada para a gestão no campo, tecnologia de ponta dentro e fora da porteira, além dos recursos financeiros disponibilizados no atual Plano Safra para o financiamento público e privado do agronegócio brasileiro.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Compõe ainda esse quadro políticas públicas há muito estabelecidas, através de marcos regulatórios consolidados e testados, além de novos arcabouços e institutos jurídicos que conferem segurança jurídica e sustentabilidade às operações comerciais, de financiamento e aos investimentos no campo e na cadeia ampla do agronegócio.

Além de tudo isso, temos consumidores ávidos no mundo inteiro por produtos agropecuários de qualidade, produzidos de forma sustentável e a reduzida capacidade de oferta destes mesmos produtos pelos nossos concorrentes mais diretos por estes mercados internacionais.

Riscos e desafios para o agronegócio em 2024

Entretanto, existem riscos e desafios a serem superados nesse ano, tanto para quem produz, quanto para que financia, compra e investe no setor.

O “W” da matriz SWOT indica entre tais desafio:

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
  1. Baixa nos preços de muitos dos produtos agropecuários, tanto no mercado interno quanto no mercado internacional – principalmente se comparados com os preços dos últimos anos –;
  2. Os problemas climáticos que se avolumaram do segundo semestre de 2023 com o fator “El Niño” e suas consequências nos regimes de chuvas para o plantio etc.;
  3. O custo dos financiamentos – com taxas de juros ainda bastante “salgadas” -, dos insumos e até o aumento de preço das terras disponíveis nos últimos anos;
  4. Aumento do risco de crédito e comercial nas operações por conta do somatório dos fatores anteriores e (v) exacerbação dos antagonismos internacionais.

Claro que ainda existem outros riscos e desafios a serem lembrados, tais como a necessidade de maior disponibilidade e abrangência de seguro rural, falta de infraestrutura de escoamento e armazenagem da produção agropecuária, falta de sucessão nos negócios no campo, dentre outros, mas estes são desafios muito mais estruturais do que conjunturais e já estão compondo há muito o “W” da matriz.

Os desafios a serem geridos e superados

Se aplicarmos aos desafios o termo “ameaças” conforme indicado no “T” da matriz, para 2024 temos, em nossa visão, como principais pontos: (i) a pouca capacidade que ultimamente o país vem demonstrando em termos de articulação de interesses perante organismos e fóruns internacionais; e (ii) a potencial judicialização das repactuações de vencimentos, taxas e garantias das operações comerciais e financeiras na cadeia do agro, decorrentes da conjuntura atual de preços reduzidos, potencial quebra de safras e custos altos de produção.

No primeiro aspecto podemos dizer que com o abandono “lento e gradual” da tradicional neutralidade que sempre caracterizou a política externa brasileira, temos enfrentado mais percalços para participação nas cadeias globais e nas discussões em torno do arrefecimento das barreiras não-tarifárias, do que angariado êxitos no alinhamento com políticas internacionais que muitas das vezes não atendem aos melhores interesses nacionais.

Já em relação à segunda “ameaça”, podemos dizer que um “teste de estresse” das novas estruturas jurídicas de financiamento privado no agronegócio e das recentes alterações na legislação dos títulos e da recuperação judicial no agro, pode representar, no final das contas, um dissabor para novos investidores e redundar em maior escassez de crédito fundamental para a recuperação de preços e margens dos produtores nos curto e médio prazos.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Oportunidades não faltam em 2024

Por outro lado, no “O” de oportunidades da matriz ainda podemos ter um olhar interessante para esse ano de 2024. A redução de preços e o aumento dos custos de produção reduz a margem do produtor no campo, mas tende a aumentar a margem e o poder de barganha da agroindústria para 2024.

Os ganhos de escala tendem a ser necessários, favorecendo as operações de aquisições, fusões e associações no campo. O cooperativismo deve ser revitalizado como ferramenta de aumento de poder de barganha e ganho de escala para os produtores rurais, assim como a redução de preços de terras por conta dos desafios conjunturais enfrentados podem gerar novas oportunidades de consolidação para agentes mais capitalizados

Já a segurança jurídica com a utilização de instrumentos já consolidados no agronegócio para repactuação das dívidas e vencimentos, com a menor burocracia que envolve as emissões de títulos e o registro dessas operações desde a Lei do Agro de 2.020, podem representar importante ferramenta para aliviar o “estresse teste” da judicialização que alguns insistem em tentar “vender” e reproduzir no mercado de tempos em tempos.

Na seara da sustentabilidade no campo, a escalabilidade das técnicas já consolidadas de manejo e sistemas de plantio sustentáveis, sistemas de ILPF e do financiamento mais barato a projetos com essas características, podem gerar um aumento da oferta de novas áreas de produção com recuperação de pastagens e entrega de produtos agroambientais que ajudaram no balanço de receitas marginais dos produtores no campo e nas emissões de títulos verdes.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Além disso, a potencial regulação dos mercados de créditos de carbono no Brasil, já em fase final de aprovação pelo Congresso Nacional – reforçada pela importância do agro sustentável conforme reconhecido pelos participantes da última COP 28 e Dubai – poderá se converter em uma fonte importante de novos recursos, além de “dissuasão” ou “arrefecimento” de barreiras não-tarifárias aos nossos produtos no mercado internacional.

Conclusão

Feito o SWOT do agronegócio brasileiro para 2.024 – sem considerar, claro, as especificidades de cada cultura, cada negócio, cada produto – podemos afirmar que, como sempre para conversão das “ameaças” em “oportunidades” a chave é a gestão no campo e nos negócios da cadeia ampla do agro.

Governos, empreendedores, agentes financiadores, mercado, investidores e a sociedade como um todo devem entender o contexto vivido e atuar da melhor forma possível para buscar o melhor resultado. Aliás, esse é e sempre foi o principal desafio de se produzir no Brasil, vencido desde sempre, desde os idos da conquista do cerrado, pelo empreendedorismo do produtor rural e sua capacidade de assumir riscos e produzir cada vez mais e melhor no campo.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Compartilhar

André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
andre.passos@moneytimes.com.br
André Ricardo Passos de Souza, é sócio-fundador do PSAA - Passos e Sticca Advogados Associados -, com MBA em Finanças e Mercado de Capitais pela MP Consultoria/Banco BBM, LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais pelo IBMEC, bacharel em direito pela UERJ. Professor nos programas de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Conselheiro Fiscal da Beneficência Portuguesa de São Paulo.