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Embraer: a China pode salvar a empresa, mas Bolsonaro deixaria?

27 abr 2020, 17:35 - atualizado em 27 abr 2020, 17:44
Embraer Setor Aéreo Empresas
Pegando no tranco: sem Boeing, Embraer terá de fazer muita força para seguir em frente (Imagem: Reuters/David Becker)

Com o ruidoso fim das negociações com a Boeing, anunciado neste sábado (25), os analistas começam a projetar um futuro bastante preocupante para a Embraer (EMBR3), já refletido pela forte queda dos papéis nesta segunda-feira (27).

Entre os desafios, estão a queima de caixa e o recrudescimento da concorrência. Mas, haveria uma salvação – desde que o presidente Jair Bolsonaro permitisse. O presidente admitiu, neste fim de semana, que a brasileira poderia negociar com outra empresa.

A questão é que, a esta altura, a melhor alternativa seria trocar a americana Boeing pela China – sim, o país que, vira-e-mexe, é atacado pelo presidente e por ministros. Parece impensável, mas, para o UBS, a possibilidade não deve ser descartada, nem subestimada.

Em relatório obtido pelo Money Times e assinado por Myles Walton, Louis Raffetto e Emilee Deutchman, o banco suíço afirma que diversos fatores contribuem para uma eventual joint-venture da Embraer com os chineses.

Sem surpresas

O primeiro é que o fim das conversas com a Boeing aumenta a pressão da brasileira para reforçar sua posição no mercado de aviação regional, sobretudo porque sua maior concorrente, a canadense Bombardier, acabou de se unir à gigante europeia Airbus.

Se voar sozinha pelo mercado mundial de aviação, talvez a Embraer não chegue muito longe. “Não seria uma surpresa, para nós, ver outras empresas iniciando conversações com a companhia”, afirma o UBS. Neste sentido, o banco descarta a Airbus, justamente porque já se aliou à Bombardier.

O presidente Jair Bolsonaro durante o desfile de 7 de Setembro, em Brasília.
Pragmatismo x ideologia: para salvar  a Embraer, Bolsonaro autorizaria uma parceria com a China? (Imagem: Agência Brasil/Marcelo Camargo)

“Cremos que a China ainda aspira à posição de liderança no mercado aeroespacial global, e, na nossa opinião, a Embraer traria tanto o talento para o design e desenvolvimento, quanto, e isso é o mais importante, o conhecimento e a capacidade em serviços globais e redes de apoio”, dizem os analistas.

O trio do UBS acrescenta que a companhia já possui pequenas parcerias com empresas chinesas, mas recorda o principal obstáculo ao negócio: o governo federal ainda detém uma golden share (ação com direito a veto) da Embraer.

Pouca autonomia de voo

O problema é que o mundo dos negócios é bastante pragmático e não costuma esperar ninguém. Sozinha, a Embraer enfrentará diversos problemas nos próximos anos. O mais imediato é a forte queda das encomendas, causada pela paralisação da economia mundial na esteira da pandemia de coronavírus.

Antes que o negócio fosse cancelado, o UBS já estimava uma demanda mais fraca para a Embraer em 2020, com a previsão de entrega de 65 jatos comerciais – contra os 89 entregues no ano passado.

“Vemos o risco de redução [da estimativa], uma vez que esperamos o adiamento de encomendas do backlog de 338 aeronaves”.

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No radar: maior rival da Embraer, a Bombardier se fortaleceu com a parceria com a Airbus (Imagem: Site/Bombardier)

Outra consequência imediata do fim do acordo é a queima de caixa inesperada pela Embraer. O acordo com a Boeing previa a injeção de US$ 4,2 bilhões para que a americana passasse a deter 80% da holding criada pelas duas (além de uma parceria para a fabricação do cargueiro militar KC 390, em que a Boeing ficaria com 49%).

A Ágora Investimentos, por exemplo, calcula que, sem esse dinheiro, a Embraer encerre o ano com geração negativa de caixa, medida pelo ebitda, de US$ 217 milhões.

A projeção inicial era de um ebitda positivo de US$ 179 milhões. Além disso, o ebitda de 2021 foi cortado em 56%, segundo Victor Mizusaki e Flavia Meireles, que assinam a análise.

Destruindo valor

A Ágora projeta, ainda, uma queda nos múltiplos da companhia. O VE/Ebitda (valor da empresa/ebitda) deve baixar os atuais 6,9 vezes (próximo da média histórica) para 5 a 6 vezes. O preço-alvo foi praticamente decapitado, ao cair de US$ 25 para US$ 4 (sim, a gestora utilizou a moeda americana).

Pedro Bruno, analista do Santander, resume os motivos pelos quais o cancelamento é ruim. Primeiro, as ações da Embraer perdem o suporte criado pela expectativa de que o acordo fosse bem sucedido. Segundo, porque a empresa “agora está sozinha para competir com novos players muito maiores”.

Sem dinheiro e com encomendas postergadas, o BB Investimentos acredita que a Embraer “deverá se valer de linhas de crédito adicionais”. E, pior, em meio a “uma das piores crises do setor aéreo, cuja extensão de tempo é imprevisível”, afirma Renato Hallgren, responsável pelo relatório.

De qualquer modo, a Embraer não é uma empresa que se possa desprezar, segundo Lucas Marquiori, que assina a análise do BTG Pactual. Ele observa que o mercado já vinha precificando um eventual fracasso das negociações, à medida que elas ficavam cada vez mais problemáticas.

Recomendações

Com isso, o papel já é negociado com um grande desconto, em relação à sua média histórica. O analista estima o mercado tem utilizado um ebitda de aproximadamente US$ 200 milhões para estipular o valor da companhia, considerando-se um múltiplo de 8 vezes.

Na média, as fabricantes de aviação são avaliadas em 10 vezes. Por isso, o BTG afirma que o múltiplo da Embraer “é muito conservador numa visão de longo prazo”.

O BB Investimentos indica preço-alvo dos papéis de R$ 22,50, com recomendação de marketperform. Já o Santander estabelece R$ 18,50, com indicação de manutenção. A Ágora indica venda, com preço-alvo de US$ 4. A recomendação do UBS é neutra, com preço-alvo de US$ 9.

Diretor de Redação do Money Times
Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.
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Ingressou no Money Times em 2019, tendo atuado como repórter e editor. Formado em Jornalismo pela ECA/USP em 2000, é mestre em Ciência Política pela FLCH/USP e possui MBA em Derivativos e Informações Econômicas pela FIA/BM&F Bovespa. Iniciou na grande imprensa em 2000, como repórter no InvestNews da Gazeta Mercantil. Desde então, escreveu sobre economia, política, negócios e finanças para a Agência Estado, Exame.com, IstoÉ Dinheiro e O Financista, entre outros.
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