Felipe Paletta: Como situações da vida se assemelham ao comportamento dos mercados?

“A maioria das pessoas no mercado está olhando para os resultados corporativos e métricas convencionais. [Mas] É a liquidez que move os mercados.”
Stanley DruckenmillerCONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADECONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Caro leitor(a),
Final de campeonato.
Após uma partida muito ruim fora, seu time do coração leva para casa uma derrota magra, 1 a 0.
“Perfeitamente reversível”, você logo pensa.
Chega o dia do jogo e para não perder nenhum minuto você chega 2 horas antes no estádio. Procura com calma a cadeira sinalizada no ingresso, enquanto vê lentamente a massa preencher os espaços vagos.
Começa a partida.
Primeiro tempo… nada.
Metade do segundo… nada.
Você olha para o telão do estádio e o coração começa a bater mais rápido. 0 a 0.
Liga a tela do celular para ver o horário, são 23:40. Coração bate ainda mais rápido.
Torna a olhar para o campo e vê de rabo de olho quando o assistente de lado de campo ergue a placa de acréscimo: 7 minutos.
“Não vai dar tempo”, pensa.
Estático, você percebe comportamentos claramente ambivalentes.
Enquanto os pessimistas começam a subir as arquibancadas para pegar o metrô aberto, os otimistas pulam e vibram mais do que nunca, extravasando todo sentimento de pertencimento.
Nesta fração de segundo é como se você acreditasse sem acreditar. Como se estivesse comprado até os tubos em Bolsa, achando que o mercado ia cair.
De repente, acontece. Juiz coloca o apito na boca, o silêncio toma conta do estádio e, ainda sem entender a situação, você volta a realidade quando o cara do lado toca no seu ombro pedindo passagem.
Liga a tela do celular novamente e percebe: 10 minutos para o metrô fechar. Olha para o lado e vê pelo menos 40 mil pessoas tentando sair ao mesmo tempo.
Agora, só lhe resta esperar.
Bom, talvez essa seja exatamente a história que muitos investidores terão de contar sobre 2020.

Assim como em 2008, a crise de 2020 não foi uma morte súbita, não aconteceu do nada. Antes dos mercados caírem vimos a evolução da crise na China, sinalizações de altos prêmios em Bolsa, enfim.
Tivemos tempo de refletir sobre os riscos. Aqueles 7 minutos, lembra?
Era o tempo suficiente.
Falando assim até parece fácil, mas claro que aqui tenho o benefício da análise histórica para concluir que deveríamos ter subido as arquibancadas junto aos pessimistas.
Mas e se aquela bola tivesse entrado? Pois é…
Acho intrigante quando Stan Druckenmiller coloca em perspectiva essa questão de fluxo e fundamento.
“É a liquidez que move o mercado”.
Note que esta é uma afirmação válida apenas para comportamentos de curto prazo, caso contrário Telebrás (TELB3; TELB4) ainda seria uma das maiores exposições da Bolsa brasileira.
Falando assim, de forma tão objetiva, dá a entender que os fundamentos de uma empresa ou fundo imobiliário (digo, sua capacidade de geração de caixa, qualidade dos ativos, margens e competitividade) não possuem relevância em sua precificação.
Bom, sabemos que isso não é verdade.
Por outro lado, essa afirmação nos ajuda a entender que a preferência por liquidez no curto prazo, especialmente em momentos de estresse, faz com que o mercado deixe de lado os fundamentos e gere distorções claras entre preço e valor.
E se engana quem pensa que esses movimentos grandes de irracionalidade não se corrigem em um espaço também curto.
As 5 fases do mercado em qualquer crise
Vamos tomar a crise do novo coronavírus como exemplo.
Primeiro, tivemos a Fase de Pânico. Depois, entendo que seguimos da seguinte forma:
- Fuga para liquidez: se o gringo é quem faz volume aqui, quando voltar quero estar junto com ele em Petrobras (PETR3; PETR4), Vale (VALE3), Itaú (ITUB4), enfim, em blue chips;
- Fixações temáticas: bora para os setores que devem se dar bem com a crise do coronavírus;
- Acesso a arbitragens de valor: diante das últimas fases, o que ficou para trás? Uma administradora de shoppings deveria cair tanto quanto uma de aviação?
- Relativa eficiência: nesta última fase, os fundamentos já voltam à pauta, a volatilidade arrefece e as grandes distorções são corrigidas.
Entre evoluções e involuções, de uma fase à outra, parece-me que tanto as fases de pânico como a de fuga para liquidez ajudam a compreender muito das oportunidades que ainda existem no mercado.
Na crônica que abre a edição, o pânico está para o apito do juiz, assim como a fuga para liquidez está para a muvuca ao sair do estádio.
E onde estamos agora?
Diria que ainda estamos na fase de acesso a arbitragens, já que ainda é possível encontrar várias distorções em termos de precificação, especialmente entre as blue chips e as demais empresas listadas.
Quer um exemplo, olhe só esse gráfico:
Agora olhe esse aqui:
Veja que, do começo da crise até a recuperação parcial recente, o Ibovespa (IBOV) tem superado o desempenho do índice de boas pagadoras de dividendos, o IDIV.
Uma amostra da preferência de curto prazo dos investidores por liquidez e por empresas de maior valor de mercado.
No entanto, se olharmos em qualquer janela mais ampla de tempo é possível notar que o IDIV performou bem melhor do que o Ibovespa. Desde a sua criação, o retorno é quase duas vezes maior.
Não tenho dúvidas de que alguns setores já exibem nas cotações um otimismo destacado. O seu foco, no entanto, tem de estar nas discrepâncias que continuam aí.
Foque nos grandes movimentos, de meses e anos e não em pequenas tacadas de dias ou semanas.
Uma boa opção para surfar essa distorção que citei é comprando o ETF DIVO11, que persegue a rentabilidade do índice de dividendos.
Ou, se quiser embarcar comigo, posso te mostrar algumas companhias que acredito que trarão ainda mais retorno aos acionistas nos próximos anos.
Não é sobre aqueles 7 minutos, é sobre o que vem depois.
Gostou do texto? Tem algum assunto relacionado ao mundo dos investimentos que te interessa? Então escreva para o e-mail redacao@moneytimes.com.br
Um abraço e até a próxima!