Política

Maconha: relator é favorável a proposta que autoriza plantio para fins medicinais

01 set 2020, 18:51 - atualizado em 01 set 2020, 18:53
Luciano Ducci
O relator da comissão especial, Luciano Ducci: “projeto apenas regulamenta a legislação vigente” (Imagem: Gustavo Sales/Câmara dos Deputados)

Em reunião virtual nesta terça-feira (1º), a comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa projeto de lei sobre medicamentos formulados com cannabis (PL 399/15) ouviu mães de pacientes que já fazem uso desse tipo de medicamento e também representantes de entidades que tratam do assunto.

O relator do projeto que autoriza o plantio de maconha no País para fins medicinais, deputado Luciano Ducci (PSB-PR), apresentou parecer favorável à proposta; porém, não há consenso sobre a aprovação do texto.

O projeto, de autoria do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE), altera a Lei 11.343/06, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, para viabilizar a comercialização de medicamentos que contenham partes da planta cannabis.

Pela proposta, o plantio será feito por empresas farmacêuticas e de pesquisa e o comércio só poderá ocorrer se existir comprovação de sua eficácia terapêutica atestada em laudo médico para todos os casos de indicação de seu uso, e apenas com autorização da Anvisa.

A presidente da Cultive – Associação de Cannabis e Saúde, Maria Aparecida de Cavalho, é mãe da Clárian, que tem síndrome de Dravet, uma epilepsia severa com risco de morte súbita.

“É inegável a transformação que a maconha fez na vida da minha filha, diminuindo 80% das crises, diminuindo a sudorese depois de quatro meses tomando o óleo, melhorou o cognitivo, a coordenação motora, minha filha está se alfabetizando, melhorou a vida de todos da família. Realmente, sem a maconha, eu não teria a minha filha aqui hoje”, afirmou.

Desde 2014, o Conselho Federal de Medicina autoriza a prescrição de remédios com canabidiol. No ano seguinte, a Anvisa retirou a proibição do uso de canabidiol e, em 2016, autorizou remédios com THC. Em 2017, ocorreu o registro do Metavyl, à base de cannabis. E, a partir de 2020, a venda de produtos com cannabis em farmácias passou a ser autorizada. O plantio do produto, no entanto, continua proibido. E a autorização para importação de remédios é cara e exige uma série de documentos.

Acesso aos remédios

Liane Maria Pereira é a mãe da paciente que obteve o primeiro habeas corpus no Rio Grande do Sul para usar cannabis medicinal. O desejo dela é que o medicamento seja acessível a todos que precisam.

“Nós não temos como sair de consultório médico com uma receita e esperar meses ou anos para ter essa medicação. Ela ter que ser como qualquer receita. Temos que ter direitos para dar essa medicação logo a nosso filho e nosso paciente. A voz das associações é muito importante, né? ”As associações foram a forma encontrada para viabilizar o acesso a medicamentos de elevado custo, como é o caso daqueles feitos à base de canabidiol. A Associação Brasileira Cannabis Esperança (Abrace) é uma delas, como explica o representante Cassiano Teixeira.

“A Abrace hoje fornece o acesso para 8 mil pacientes, entre eles mil pacientes que não pagam um real. Temos fornecidos alguns casos judiciais para o SUS, creio que são seis casos já. Temos 17 pesquisas sendo realizadas na Abrace, inclusive 3 pesquisas com Covid”, disse.

Dependência química

Mas o projeto que autoriza o plantio de maconha no país para finalidades medicinais não é unanimidade. A representante da ONG Amor Exigente, que orienta 1 milhão e 200 mil famílias de dependentes químicos por ano, Janicleide Xavier, teme que a proposta possibilite a ampliação do uso da maconha. Ela conta que perdeu o filho há três anos, depois que ele passou a usar maconha para acabar com dores de cabeça insistentes.

A representante da ONG Amor Exigente teme que a proposta possibilite a ampliação do uso da maconha (Imagem: Eilon Paz; eilonpaz.com)

“Ele teve surtos psicóticos, teve sua primeira internação e foi diagnosticado com esquizofrenia após fumar maconha. O que me preocupa é que, no nosso Brasil, as pessoas não estão preparadas para achar que o remédio pode ser usado para fins medicinais. Brasileiro sempre dá um jeito de fazer gambiarra com tudo”, lamenta.

O coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, deputado Diego Garcia (Pode-PR), concorda e se revolta diante da possibilidade de a proposta ser votada durante uma pandemia.

“Com a receita, você vai poder fazer uso. É de uma irresponsabilidade tremenda num momento como esse, da pandemia, nós estarmos levando para Plenário uma discussão que sequer passou por uma comissão especial”

Ex-ministro da Cidadania, o deputado Osmar Terra (MDB-RS) tem opinião igual.

“Na Califórnia, nos Estados Unidos, quando aprovaram maconha medicinal, 90% das pessoas não tinham doença nenhuma. Bastava dizer que estava com uma dor que o médico dava uma receita.”

Osmar Terra
“Na Califórnia, nos Estados Unidos, quando aprovaram maconha medicinal, 90% das pessoas não tinham doença nenhuma”, disse Osmar Terra (Imagem: abio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

A proposta

O projeto de lei permite o cultivo de sementes ou mudas certificadas e plantas com até 1% de THC, portanto não serão ativas. O texto também proíbe o comércio da planta, chá ou sementes. O ex-diretor da Anvisa William Dib acha que a proposta uniu o que há de melhor nas legislações do mundo inteiro e dá segurança às empresas para produzir e dar acesso aos medicamentos.

O relator da proposta, deputado Luciano Ducci, explica que seu texto estabelece o uso desse tipo de medicamento apenas em casos de pacientes que não responderam bem a outras terapias ou tiveram efeitos colaterais com medicamentos disponíveis no mercado. Ele lembra que lei 11.343/06 permite à União autorizar o plantio de vegetais como a cannabis para fins científicos ou medicinais, em local e prazo determinado, mediante fiscalização. Segundo ele, o projeto apenas regulamenta a legislação vigente.

“A gente espera poder, com esse projeto, ter um marco novo de regulação da cannabis no Brasil. É um projeto que está muito seguro e que tem consistência muito boa para ser um marco nesse país”, afirmou.

Se aprovado pela Câmara, o projeto ainda precisa ser analisado pelo Senado.

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