Coluna do Heverton Peixoto

Na guerra comercial entre China e Estados Unidos, o Brasil pode sair perdendo

01 maio 2025, 10:00 - atualizado em 30 abr 2025, 10:47
China, EUA Brasil
Embora a atual guerra comercial possa abrir oportunidades para o Brasil, não podemos considerar os efeitos negativos que esse cenário pode gerar. (Imagem: REUTERS/Florence Lo)

Estamos todos, consumidores, economistas e analistas, acompanhando de perto os contornos que uma possível guerra comercial entre China e Estados Unidos tem tomado. Desde o início de abril, os governos desses países têm trocado retaliações e reações aos impostos infringidos sobre as exportações e importações que realizam entre si, além de medidas relacionadas aos seus outros parceiros comerciais.

Ainda são incertas as proporções das consequências que podem ser causadas pela disputa comercial, mas existem alguns cenários possíveis e, como parte integrante da dinâmica da economia global, o Brasil também enfrentará impactos.

Embora a atual guerra comercial possa abrir oportunidades para o Brasil, como o redirecionamento de cadeias produtivas e aumento da demanda para suprir produtos antes fornecidos por outros países, já que China e EUA podem buscar parceiros alternativos, não podemos considerar os efeitos negativos que esse cenário pode gerar.

Em termos globais, tendo as duas maiores potências econômicas impondo sanções e aumentando tarifas, existe a perspectiva de enfrentarmos dificuldades na economia mundial. A proposta de reindustrialização dos Estados Unidos, por exemplo, em detrimento da importação de produtos industrializados por eles, poderia colocar em risco toda a cadeia produtiva mundial já estabelecida e eficiente. Por outro lado, cerca de 15% das exportações da China têm como destino os EUA — apesar de o país asiático ter um mercado de consumo interno muito grande, pode não ser o suficiente para absorver todo o excedente de produção.

Como fica o cenário da economia no Brasil?

Da perspectiva do mercado financeiro, a dinâmica de crédito brasileira pode ser impactada de diversas formas. Listei quatro principais riscos que precisam ser observados diante da eminente crise:

Volatilidade cambial e de commodities

A instabilidade global que está se estabelecendo durante as disputas comerciais enfraquece a confiança dos investidores, o que pode provocar a fuga de capitais e investimentos dos mercados emergentes, como o Brasil. Esse movimento pressiona o valor do real, intensifica a volatilidade cambial e afeta diretamente os preços de commodities estratégicas, como a soja e o minério de ferro. As exportações de soja e de petróleo para a China, por exemplo, podem até aumentar, numa tentativa de suprir o mercado da falta da soja e do óleo americanos, mas as incertezas, provocadas por acordos comerciais que podem passar por mudanças a qualquer momento, impactarão exportadores e a balança comercial brasileira.

Aumento do risco percebido

Em um ambiente de tantas incertezas, o risco-país do Brasil tende a subir. Esse indicador econômico é o reflexo da percepção dos investidores estrangeiros sobre a capacidade do Brasil de cumprir seus compromissos financeiros, considerando fatores como estabilidade política, econômica e social. Isso encarece o custo de captação de recursos no exterior e eleva o prêmio de risco exigido pelos investidores (a garantia ou seguro que os investidores precisam para investir no país), afetando o mercado de crédito, soberano e corporativo.

Aperto nas condições de crédito

Com maior aversão ao risco, também resultado das incertezas econômicas globais e nacionais, bancos e instituições financeiras tornam-se mais seletivos e restritivos na concessão de crédito, tanto para empresas quanto para consumidores. O resultado é uma desaceleração na produção, no consumo e nos investimentos — elementos essenciais para o crescimento sustentável da economia. Além disso, a restrição de crédito também dificulta ainda mais que o Brasil desenvolva cadeias industriais maduras e competitivas próprias.

Reação da política monetária e Fiscal

Diante desse cenário, há uma tendência de o governo brasileiro adotar uma agenda expansionista — com redução de juros, estímulos fiscais ou aumento de gastos — como forma de proteger a atividade econômica. No entanto, essa resposta pode gerar ainda mais pressão sobre o mercado financeiro, deteriorando a percepção de risco fiscal, aumentando a expectativa inflacionária e afetando negativamente o comportamento dos juros futuros.

Além disso, muitos produtos consumidos pelos brasileiros e importados dos Estados Unidos têm seus principais componentes fabricados na China, principalmente produtos de tecnologia de ponta. Por outro lado, a China é líder na produção e exportação de mercadorias que podem representar uma revolução industrial e ambiental, como os carros elétricos. Tais produtos podem se tornar mais baratos para outros mercados, inclusive o brasileiro, caso o mercado dos EUA não seja atraente em termos tarifários.

Tanto os Estados Unidos quanto a China já sinalizaram que, nas próximas semanas, podem chegar a acordos mais brandos, que sejam benéficos para ambos os países, mas as incertezas continuam e, por enquanto, nos resta acompanhar os próximos capítulos. O que sabemos, de fato, é que uma guerra comercial envolvendo as duas maiores potências econômicas mundiais pode beneficiar alguns setores da economia brasileira, mas prejudicar imensamente outros tantos. Em termos globais, se as retaliações persistirem, não haverá vencedores para essa guerra, que pode desencadear uma recessão econômica mundial.

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CEO da Omni
CEO da Omni. Graduado em Engenharia Civil com MBA em Corporate Finance no Insead, França. Possui experiência relevante de mais de 15 anos em diferentes indústrias e segmentos, tendo atuado por quatro anos como Diretor Executivo da Wiz Corporate e um ano como Diretor de Transformação Digital da Wiz. Foi também consultor da Mckinsey & Company de 2008 a 2013, participando ativamente de projetos estratégicos no mercado bancário e de seguros da América Latina. Heverton Peixoto iniciou sua carreira na Rede Esho/Grupo Amil, com relevante experiência na indústria de seguros e saúde suplementar.
heverton.peixoto@moneytimes.com.br
CEO da Omni. Graduado em Engenharia Civil com MBA em Corporate Finance no Insead, França. Possui experiência relevante de mais de 15 anos em diferentes indústrias e segmentos, tendo atuado por quatro anos como Diretor Executivo da Wiz Corporate e um ano como Diretor de Transformação Digital da Wiz. Foi também consultor da Mckinsey & Company de 2008 a 2013, participando ativamente de projetos estratégicos no mercado bancário e de seguros da América Latina. Heverton Peixoto iniciou sua carreira na Rede Esho/Grupo Amil, com relevante experiência na indústria de seguros e saúde suplementar.
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