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O resultado da COP da biodiversidade e clima: Quem paga a conta?

25 nov 2024, 11:25 - atualizado em 25 nov 2024, 11:25
clima cop
(iStock.com/Gudella)

Nas últimas semanas, ocorreram a COP 16 de Biodiversidade, na Colômbia, e COP 29 do Clima no Azerbaijão. Tanto a Convenção da Diversidade Biológica (CDB) como a Convenção Quadro Clima (UNFCCC) são tratados internacionais multilaterais de meio ambiente, ou seja, possuem força vinculante para as Partes signatárias desses documentos (Hard Law).

Apesar de temáticas distintas, com a CDB endereçando a preservação da biodiversidade e a UNFCCC tratando do combate às mudanças climáticas, ambos os tratados se organizam em um processo de tomada de decisão exatamente igual – as Conferências das Partes (COP).

As COPs nada mais são que uma reunião final, resultado de um longo processo de negociação composto por vários grupos e reuniões prévias, tratando de diversos pontos da agenda estabelecidos pelas próprias Partes. Nesse sentido, nesse ano, a COP de Biodiversidade e a COP de Clima compartilharam do mesmo tema: financiamento.

Financiamentos para clima e biodiversidade

Tanto na COP 16 como na COP 29, o tema de financiamento ganhou muita importância, ou seja, a capacidade de nações ricas financiarem e pagarem pela preservação de biodiversidade e pelo combate das mudanças climáticas em países em desenvolvimento.

Na COP 16 de biodiversidade muito se negociou sobre o item de financiamento, como estabelecido no Marco Global de Biodiversidade. O novo marco global de biodiversidade estabeleceu como parte das suas metas, especificamente nas metas 11 e 18, ao estabelecer o objetivo de:

“Minimizar o impacto das mudanças climáticas e da acidificação dos oceanos sobre a biodiversidade e aumentar sua resiliência por meio de ações de mitigação, adaptação e redução de riscos de desastres, incluindo soluções baseadas na natureza e/ou abordagens baseadas em ecossistemas, ao mesmo tempo, em que se minimizam os impactos negativos e se promovem os impactos positivos das ações climáticas sobre a biodiversidade”.

Nessa lógica, o documento propõe a restauração de pelo menos 30% da biodiversidade degradada em áreas terrestres, marítimas e costeiras. Para isso, o marco global, na meta 19, estabelece mobilizar pelo menos 200 bilhões de dólares por ano até 2030, visando financiar projetos e ações voltados para a biodiversidade e repartição de benefícios.

Falta de aportes

Entretanto, a COP 16 falhou em concretizar esse propósito. A decisão aprovada define a estrutura para o uso desse fundo (Global Environment Facility Trust Fund), mas não conseguiu até o momento o aporte dos valores combinados – houve somente doações iniciais por Áustria, Canada, Reino Unido, França, Alemanha, Japão, Noruega, Espanha no valor de US$ 390 milhões de dólares – muito abaixo de US$ 200 bilhões/ano.

Na COP 29, o assunto já vem sendo negociado há mais tempo. Desde 2009, as Partes signatárias da Convenção Quadro Clima das Nações Unidas (UNFCCC) decidiram pelo financiamento de US$ 100 bilhões/ano até 2020 de países ricos para países em desenvolvimento no propósito de financiar projeto e iniciativas para combates das mudanças climáticas.

De acordo com análises da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), só em 2022 os países ricos conseguiram atingir a meta de US$ 100 bilhões/ano, ou seja, se demonstrou um instrumento pouco eficaz ao longo da sua história (2009 – 2022).

Agora com a COP 29, as Partes tentaram negociar as novas metas de financiamento, denominadas New Collective Quantified Goal (NCQG). A NCQG pretende aumentar ainda mais a escala e valores do financiamento, sendo que países em desenvolvimento tinham como objetivo o valor de 1 trilhão de dólares/ano. Entretanto, com a finalização da COP 29, somente foi acordado o valor de 300 bilhões de dólares ao ano por parte dos países ricos – valor muito abaixo do necessitado.

Quem paga a conta da COP?

Nesse ponto, ambas as COPs, de Clima e de Biodiversidade, apesar de insistirem no instrumento de financiamento, estão sofrendo do mesmo problema: falta de aporte dos valores a incerteza na metodologia para uso dos recursos. Na COP 16 o fundo para as metas do Marco Global somente teve doações iniciais bem abaixo do esperado.

Na COP 29, as Partes tentaram negociar financiamentos bem mais ambiciosos, com valores demandados na ordem de trilhões de dólares, sendo que o próprio histórico da Convenção demonstra problemas crônicos para pagamentos desses valores, ou seja, se não conseguiram atingir valores mais baixos anteriormente, como atingirão valores extremamente maiores no futuro?

Resultado confirmado com o valor acordado – bem menor que o necessário. Aqui vai ficando evidente que fundos são, sim, criados, porém ninguém paga por eles.

O que fazer?

Dada essa situação adversa e eficácia falha e limitada desses fundos para financiamento no escopo das COPs, é interessante considerar que o Brasil deve trabalhar em sua própria agenda de financiamento.

É possível perceber que alguns países desenvolvidos têm maior proatividade em financiar atividades de preservação ambiental que outros, sendo que esses recursos podem ser oriundos tanto de fundos públicos como privados.

Ou seja, pode ser mais eficaz focar em financiamentos bilaterais com países mais interessados, do que insistir em grandes fundos multilaterais dentro da estrutura da CDB ou da UNFCCC. Por exemplo, a Noruega é muito mais proativa e interessada em financiar que os EUA e faz isso de forma direta, não precisando passar pelos fundos das COPs.

Entretanto, para fortalecer esse financiamento bilateral, o país precisa de políticas públicas concretas e claras para solicitar investimento. Qualquer financiador, de qualquer setor, evita investir em projetos que não consigam mensurar resultados – “a fundo perdido”. Mesmo com grandes fundos nacionais, como o Fundo Amazônia, o Brasil pode dispor de mais oportunidades promissoras para financiamento.

A regulação do PSA no Brasil

A despeito do país ter regulado o Pagamento por Serviços Ambientais (Lei Federal 14.119/2021), até o momento, o país não regulamentou a lei. Igualmente, analisando o direito comparado, a Brasil é o único país do G20 que não possui um grande PSA público – a Lei somente permite essa possibilidade, mas não há nenhum grande PSA nacional disponível.

Poderia haver um grande PSA de verba pública para reparação de florestas (objetivo da nossa NDC). O próprio Programa de Recuperação de Pastagens Degradadas (outro objetivo da NDC) a princípios ser operado por meio de empréstimos bancários e não como um grande PSA público.

Nessa questão, o Brasil precisa começar a “ligar os pontos” e usar de grandes PSAs públicos, com capacidade de monitoramento/resultados concretos, e insistir em financiamentos bilaterais com outros países. Esse caminho, a princípio, parece mais promissor do que aguardar pelas negociações infrutíferas das COPs.

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Advogado e pesquisador do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getulio Vargas. Doutor e Master of Laws em Direito Ambiental pela Pace University School of Law, Mestre em Direito dos Negócios na Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGVLaw).
leonardo.munhoz@autor.moneytimes.com.br
Advogado e pesquisador do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getulio Vargas. Doutor e Master of Laws em Direito Ambiental pela Pace University School of Law, Mestre em Direito dos Negócios na Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGVLaw).
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