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Onde está o capital humano do Brasil? Sumiu! (foi para o Uber)

23 ago 2020, 10:03 - atualizado em 23 ago 2020, 10:42
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O capital humano acumulado em uma sociedade está em suas redes produtivas complexas (Imagem: Pixabay)

O capital humano só é acumulado em ocupações específicas. Profissões como cabeleireiro, manicure, pedicure, lojista, motorista de táxi e aplicativos, entregadores são as mesmas há milênios de anos.

O capital humano acumulado em uma sociedade está em suas redes produtivas complexas. Uma delicada divisão do trabalho com absurda especialização em cada etapa. Atividades simples não permitem esse tipo de acumulação de capital humano, como majoritariamente no Brasil de hoje.

O conhecimento não flutua, se incorpora em produtos e serviços sofisticados e “nichados” e cria poder de monopólio. As pessoas não “flutuam” por aí, trabalham em algum lugar. A acumulação de capital humano em engenharia é exponencial por assim de dizer, no cabeleireiro “linear”.

O potencial de acumulação de capital difere por ocupação. Os diferenciais de salário são explicados por diferenciais de anos de estudo. Os diferenciais de anos de estudo são explicados por diferencias de ocupações. Os diferenciais de ocupações são explicados por diferenciais de estrutura produtiva (ver Mehta, Aashish & Felipe, Jesus, (2014)).

Os setores industriais e de serviços sofisticados são muito mais intensivos em capital, máquinas, ideias e equipamentos do que serviços tradicionais. As manufaturas high tech demandam muito capital humano, algo que por exemplo uma fábrica de sapatos simples não precisa. Serviços digitais escaláveis como Uber, Google e Netflix são infinitamente mais intensivos em capital humano do que padarias, salões de beleza e restaurantes.

Falta no mundo de Solow, Mankiw e Romer o que sobra nos modelos cepalinos e de economistas do desenvolvimento: uma desagregação do PIB em termos de setores e produtos para entender a dinâmica tecnológica. Dessa ótica fica claro entender onde erramos no Brasil desde os 90: trocamos nossas atividades ricas em tecnologia, a indústria, por serviços tradicionais não sofisticados; o tema principal desse livro.

O capital humano da pessoa se traduz em ganhos maiores e salários se aplicado a uma atividade capaz de remunerá-lo. O engenheiro que dirige Uber ganha o mesmo que o motorista analfabeto. A complexidade produtiva é, provavelmente, a principal variável omitida que ajuda a explicar o resíduo de Solow.

Fabrica indústria
“O que” produzir é tão importante quanto a quantidade produzida (Imagem: Pixabay)

O grande problema dos modelos de Solow, Mankiw e até mesmo de Romer é que não levam em conta a importância da composição setorial como determinantes da intensidade de capital físico e humano de uma economia.

O PIB precisa ser desagregado por setores e produtos. E como tudo que é ruim pode sempre piorar, alguns setores têm maior vocação inovativa do que outros. Esta é mais uma das instâncias da máxima: “o que” produzir é tão importante quanto a quantidade produzida.

Em outras palavras, o padrão de especialização da economia afeta o processo de aprendizagem da sociedade e, portanto, de seu desenvolvimento (ver Palma 2014).

PALMA, J.G., (2014) De-industrialization, ‘premature’ de-industrialisation and the dutch-disease. Revista NECAT, Ano 3, no. 5, Jan

MEHTA, AASHISH & FELIPE, JESUS, (2014) “Education and the Journey to the Core: Path-dependence or Leapfrogging?,” ADB Economics Working Paper Series 395, Asian Development Bank.

Texto escrito por Paulo Gala e Andre Roncaglia, retirado do livro “Brasil, Uma Economia que Não Aprende”.

CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR
Graduado em Economia pela FEA/USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi professor visitante nas Universidades de Cambridge UK em 2004 e Columbia NY em 2005. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR.
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Graduado em Economia pela FEA/USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi professor visitante nas Universidades de Cambridge UK em 2004 e Columbia NY em 2005. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR.
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