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Orlando Cintra e Celio Bozola: Por que sua startup precisa de governança?

15 set 2020, 12:33 - atualizado em 15 set 2020, 12:34
Sucesso, Comemoração, Equipe, Trabalho, Negócios, Governança
O tema “governança” vem se expandindo para além dos limites internos das empresas (Imagem: Depositphotos)

A tendência é crescente e notável! A sigla ESG, ASG – Ambiental, Social e Governança, em português, vem se tornando um carimbo sem o qual as organizações que precisam acessar capital tendem a enfrentar restrições de investidores.

Isso reflete preocupações de consumidores e na sociedade, que, cada vez mais, querem privilegiar empresas que sejam bem administradas, mas que também respeitem princípios éticos, a boa convivência social e o meio ambiente. Ou seja, o tema “governança” vem se expandindo para além dos limites internos das empresas.

A preocupação crescente com o tema levou à criação e avanço de fundos de investimento focados em empresas que seguem os mandamentos ESG e ganhou ainda maior impulso com a carta assinada por Laurence Fink, CEO da BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, em que o executivo assumiu o compromisso de posicionar a sustentabilidade no coração da estratégia de investimento da companhia.

Quem não compartilha da visão de Fink, é bom que se diga, pode pagar um preço alto. O risco é grande. Duas histórias de grandes empresas globais ficaram famosas em tempos recentes por manchar suas reputações e gerar graves crises financeiras e de imagem por conta do mau comportamento de seus CEOs.

A primeira delas é a WeWork, que viu seu valor de mercado despencar de US$ 47 bilhões para US$ 8 bilhões depois que foram identificados diversos desvios de conduta do seu cofundador Adam Neumann, levando o Softbank, principal investidor da companhia, a pressioná-lo para que apresentasse sua demissão. Uma semana depois do desligamento de Neumann, o IPO da empresa, que já estava prestes a acontecer, foi suspenso.

Outro episódio que ocupou as manchetes foi o de Travis Kalanick, que renunciou ao cargo de CEO do Uber em 2017 após a postura ética da empresa ter sido fortemente questionada por causa de denúncias sobre casos de assédio sexual na companhia que não foram analisados, levando seus principais investidores a exigir sua saída do comando do negócio que ele mesmo criou.

Os casos de Neumann e Kalanick trazem à tona a importância das startups estabelecerem claras políticas de governança desde seus primeiros passos. Toda startup almeja um dia ser uma gigante como WeWork e Uber, que, se tivessem feito a lição de casa quando ainda estavam no estágio seed, não teriam sido afetadas por crises promovidas por seus próprios chefes executivos.

Sim, se você quer levar sua startup ao status de unicórnio e ficar no radar de investidores recomendamos atentar para a essencialidade da governança antes mesmo de montar sua operação na garagem. Se sua visão é criar um negócio de sucesso, e ninguém abre uma empresa planejando fracassar, procure colocar todos os pratos na mesa já no business plan.

Alinhar quais os papéis, limites e responsabilidades de todos os shareholders, dos fundadores e do C-level aos investidores e conselheiros, facilitará a resolução de conflitos e ajudará a evitar fortes dores de cabeça no futuro quando a empresa ganhar musculatura e, quem sabe, entrar para o seleto grupo do bilhão.

Em nossas conversas com empreendedores, temos notado que muitos tendem a colocar seus negócios em primeiro lugar, focando exclusivamente na geração de receita e deixando de lado a constituição de regras de gestão que, mais adiante, podem trazer prejuízos irreparáveis no momento de escalar, como ocorreu com a suspensão do IPO da WeWork.

WeWork
“WeWork e Uber, se tivessem feito a lição de casa quando ainda estavam no estágio seed, não teriam sido afetadas por crises promovidas por seus próprios chefes executivos”, afirmam Orlando Cintra e Celio Bozola (Imagem: REUTERS/Brendan McDermid)

Por isso, outro bom motivo para estabelecer um programa de governança desde cedo, como já sublinhamos, é deixar o negócio estruturado para receber investimentos, seja de um anjo, um VC ou até mesmo se chegar a fazer um IPO.

Mas isso não significa que as regras fundamentadas quando ainda não se tem 10 funcionários sejam as mesmas ao empregar milhares de colaboradores. O plano de governança deve ser flexível e se adequar a cada etapa de evolução da startup. Desta forma, no momento de sentar para negociar um aporte os fundadores terão chances bem mais sólidas de atingir um valuation mais elevado. Em outras palavras, é uma questão, sim, de sobrevivência.

Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) indicou que 54% dos gestores de startups e scale-ups afirmam não possuir regras formalizadas de governança e, em uma escala de 0 a 10, dão nota média de 6,2 para o conhecimento que têm sobre o assunto, demonstrando que estas empresas nascentes ainda têm muito por fazer neste quesito.

Para apoiar os empreendedores, o IBGC desenhou um guia para implementar governança em startups dividido em 4 etapas – Ideação, Validação, Tração e Escala.

Na primeira, a de Ideação, a recomendação é definir os papéis e responsabilidades, bem como qual será a contribuição e dedicação de cada sócio. Com isso, em momentos de crise como o que estamos vivendo a startup terá a celeridade necessária para tomar decisões estratégicas a partir de princípios definidos já no plano de negócios. E é importante também não esquecer da propriedade intelectual; não adianta chorar depois quando roubarem sua ideia.

Na fase de Validação é hora de definir os direitos e deveres dos integrantes da equipe, além de estruturar controles e indicadores para apurar resultados e se submeter a auditorias. Na etapa de Tração, quando o modelo de negócio já tiver sido validado e a startup começa a escalar, a orientação é para diferenciar os papéis de sócios e executivos e estruturar um conselho com poder de voto com o objetivo de garantir a implementação e cumprimento das melhores práticas de gestão.

Por fim, ao alcançar o patamar de Escala a startup, já consolidada, precisa ter incorporado profundamente políticas de governança e dedicar-se a assegurar sua permanência na cultura de toda organização.

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“A governança não pode se tornar uma âncora para a evolução de uma startup, que, como toda startup, precisa praticar uma cultura agile e estar sempre pronta para buscar novos caminhos para inovação”, comentam Cintra e Bozola (Imagem: Pixabay)

Mas cuidado. A governança não pode se tornar uma âncora para a evolução de uma startup, que, como toda startup, precisa praticar uma cultura agile e estar sempre pronta para buscar novos caminhos para inovação e modelos disruptivos que assegurem sua competitividade no mercado.

Marly Parra, Observadora do Conselho de Líderes do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável, pontua muito bem:

“O argumento dos fundadores de que perderiam agilidade ao implantar a Governança Corporativa pode ser rapidamente neutralizado pelo risco de perder valor no mercado com os erros de gestores inexperientes. A reputação de uma marca e dos gestores é crucial para conquistar investidores”. E acrescenta: “Portanto, os fundadores devem estabelecer já no ‘Day One’ seus processos de governança para não colocarem a sobrevivência da empresa em xeque. Além do negócio visionário, é preciso assegurar a credibilidade para a prosperidade da empresa”.

E ela tem toda razão. Como conselheiros e investidores-anjo temos a missão de conscientizar os empreendedores sobre a importância de implementar boas práticas de governança de forma homeopática. Governança não se constrói do dia para noite. Ela deve ser inerente à cultura de qualquer negócio. É a partir da sua implantação, definindo processos, entregas, responsabilidades, regras de gestão e, claro, com grandes talentos, que sua startup construirá uma estrada segura para seu crescimento sustentável.

Como anda a governança na sua startup?

Texto escrito por Orlando Cintra e Celio Bozola. Bozola foi presidente e conselheiro de empresas no segmento de TIC e atualmente se dedica a conselhos e a promoção de iniciativas de inovação, sendo membro fundador do BR Angels e mentor da BrazilLAB.

Fundador e CEO do BR Angels
Orlando Cintra é Membro do Conselho de empresas como SMARTIe (Solvi Ambiental), Solstic Advisors e HyperloopTT além de Founder & CEO do BR Angels, grupo de investimento anjo formado por CEOs e empreendedores. Como Executivo de grandes corporações como SAP, HP e Informatica Corp, atuou em diversas posições como Presidente e Vice-Presidente Sênior para América Latina
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Orlando Cintra é Membro do Conselho de empresas como SMARTIe (Solvi Ambiental), Solstic Advisors e HyperloopTT além de Founder & CEO do BR Angels, grupo de investimento anjo formado por CEOs e empreendedores. Como Executivo de grandes corporações como SAP, HP e Informatica Corp, atuou em diversas posições como Presidente e Vice-Presidente Sênior para América Latina
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