Polêmica do Scherbi’s não é a única: Anúncios de vagas chamam a atenção com escala 7×0, trabalho de ‘ama de leite’ e salário de R$ 5
Quem nunca navegou em sites como LinkedIn, Vagas.com, Gupy e se deparou com alguma oferta de emprego que tinha muitas exigências, remuneração abaixo da média e falta de benefícios? Embora infelizmente essa seja uma situação frequente no mercado de trabalho, de vez em quando algum anúncio ganha grande repercussão.
Um exemplo que “quebrou o padrão” recentemente foi uma vaga de auxiliar de cozinha na confeitaria Scherbi’s, da chef Isa Scherer, vencedora do Masterchef Brasil 2021.
O anúncio foi divulgado em maio, mas atraiu atenção na internet nas últimas semanas e recebeu críticas nas redes sociais. Tratava-se de um emprego no regime CLT, com expediente das 14h às 22h – sem descanso nos fins de semana e feriados – e salário de R$ 1.800 por mês.
A descrição da vaga recebeu uma enxurrada de críticas na internet, alegando que o salário oferecido é insuficiente para viver em São Paulo, considerada a cidade mais cara do Brasil.
Outra crítica veio do padrão de vida da chef. Além de atuar na culinária, Isa Scherer cria conteúdo como influenciadora digital e foi questionada sobre os locais que frequenta, marcas de roupas usadas e os benefícios oferecidos aos colaboradores do Scherbi’s.
O restaurante se manifestou após a controvérsia, garantindo cumprir integralmente a legislação trabalhista, além dos direitos previstos na CLT e em acordos coletivos.
Desde julho, os salários mínimos para o setor de bares e restaurantes em São Paulo são:
- Piso Especial: R$ 1.804,00
- Piso Diferenciado: R$ 2.070,51
- Piso Normal: R$ 2.360,06
No entanto, a vaga foi anunciada em maio, antes da revisão desses valores. Além disso, a classificação em cada piso salarial depende dos benefícios oferecidos pela empresa empregadora. Para enquadrar-se no piso mais baixo, é necessário conceder outras vantagens aos funcionários, como plano médico e odontológico, seguro de vida e vale refeição/alimentação, por exemplo.
Polêmica à parte, o caso da confeitaria da Isa Scherer não é o único que chama a atenção entre vagas um tanto incomuns – e, muitas vezes, problemáticas.
Em uma análise de sites de emprego e relatos nas redes sociais, muitos anúncios de trabalho são quase absurdos, com propostas que englobam baixos salários, ausência de benefícios e atribuições exageradas.
Vagas que desrespeitam leis trabalhistas e beiram o absurdo
Algumas ofertas publicadas online parecem cômicas se não fossem tristes. Diversos profissionais do ramo gastronômico, por exemplo, publicaram relatos nas redes após o caso da confeitaria Scherbi’s, ressaltando que o cenário no setor é difícil.
Folga? Para quê?
Um restaurante estava buscando alguém para a função de garçonete:

Esse anúncio viola diferentes aspectos da legislação trabalhista brasileira. Para começar, a jornada seria de 12 horas diárias, durante toda a semana, com uma folga a cada quinze dias, que não pode ser aos sábados ou domingos.
A CLT determina que o máximo semanal permitido é 44 horas, conforme o art. 58. A regra permite até duas horas extras por dia, desde que pagas com acréscimo mínimo de 50% em dias úteis e 100% em domingos e feriados.
Outro ponto que descumpre a lei é o registro em carteira após o período de experiência. O art. 29 da CLT exige que o empregador formalize o funcionário em no máximo cinco dias úteis após a admissão.
Pagamento que não cobre um pastel
Quando a vaga foge do regime de carteira assinada, a situação tende a ser ainda mais preocupante. Veja um anúncio para edição de vídeos que seriam publicados no YouTube:

O valor pago por cada edição – trabalho que costuma levar horas – surpreende: apenas R$ 5. Essa vaga freelancer foi compartilhada em um fórum da internet e os comentários são divertidos. Uma reação foi: “não paga nem a luz gasta para processar o vídeo”. Outra pessoa comentou: “não cobre nem a massa do pastel”.
Por ser trabalho autônomo, não há piso salarial, e os valores são ajustados entre contratante e prestador. A título de exemplo, os preços comuns para edição de vídeo giram em torno de pelo menos R$ 150, conforme a agência de marketing digital DUNA.
Babá ‘ama de leite’
A remuneração costuma ser um problema frequente. Veja um anúncio para babá:

Esse é mais um caso que infringe várias normas trabalhistas. O anúncio não menciona o registro em carteira, obrigatório já que a profissional teria jornada fixa, conforme art. 29 da CLT.
Além disso, o salário oferecido não alcança o mínimo legal de R$ 1.518 e não contempla benefícios.
Outra questão delicada é a exigência de que a babá tenha sido mãe recentemente, o que viola o direito à licença-maternidade. Há também um abuso ético na vaga: a babá teria que amamentar a criança, prática abusiva e sem respaldo legal.
Um panorama do mercado de trabalho no país
Casos similares aos citados não são isolados: refletem um mercado que ainda convive com informalidade e baixos salários.
Dados deste ano do IBGE mostram que quase 32% dos trabalhadores brasileiros atuam sem carteira assinada e mais de um terço recebe até um salário-mínimo.
Os anúncios que viralizam chamam a atenção para um problema estrutural: a discrepância entre o que a legislação trabalhista prevê e as reais condições de grande parte dos funcionários no país.
Informações obtidas do G1 e ICL Notícias.