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Por que o pequeno e médio varejo deve viver uma onda das fusões e aquisições?

22 abr 2021, 18:30 - atualizado em 22 abr 2021, 18:30
Coronavírus-Distrito Federal
O ano de 2020 foi de altos e baixos para os varejistas. As regras de isolamento social impostas a partir de março jogaram o setor numa montanha russa de incertezas (Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

A menção do termo “varejo” no noticiário econômico nos remete aos hipermercados, redes de lojas de departamentos e shopping centers.

Todos esses players fazem parte dele, bem como a vendinha de roupa, a barbearia e a padaria da esquina. Isso dá a dimensão desse setor fundamental da economia brasileira, que tem um valor agregado correspondente a 11,5% do PIB nacional, segundo a Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC).

O ano de 2020 foi de altos e baixos para os varejistas. As regras de isolamento social impostas a partir de março jogaram o setor numa montanha russa de incertezas, com trimestres melhores e outros piores.

O freio do início do ano, logo depois que a maioria dos comércios não essenciais tiveram de interromper o atendimento presencial, foi seguido de alguma recuperação de vendas. Mesmo assim, o resultado final do ano foi, pelas previsões do IBGE, um avanço de 1,2%.

Esses resultados, no entanto, foram irregulares.

De acordo com informações da Agência Brasil, quatro dos oito segmentos do varejo tiveram alta nas vendas: supermercados, alimentos, bebidas e fumo (4,8%), móveis e eletrodomésticos (10,6%), artigos farmacêuticos, médicos e de perfumaria (8,3%) e outros artigos de uso pessoal e doméstico (2,5%).

Para a outra metade, foi um ano de queda nas vendas. Combustíveis e lubrificantes (-9,7%), tecidos, vestuário e calçados (-22,7%), livros, jornais, revistas e papelaria (-30,6%) e equipamentos e material para escritório, informática e comunicação (-16,2%).

O grande movimento de reação registrado foi a corrida para a transformação digital, atropelando planejamentos desde grandes cadeias até pequenos comércios, que tiveram de montar lojas online virtualmente da noite para o dia para não quebrarem.

Não à toa, vendas pelo WhatsApp, adesão aos aplicativos (no caso de restaurantes e pequenas redes de supermercados) ou aos marketplaces se tornaram uma tábua de salvação para muitos negócios de pequeno porte. Ao final de 2020, tínhamos mais de 1,3 milhão de lojas online, segundo a pesquisa Perfil do E-commerce Brasileiro.

Uma das soluções mais inteligentes para se manter relevante e conseguir crescer num mercado pulverizado e competitivo como o varejo são as operações de fusões e aquisições.

O crescimento por M&A assegura uma expansão mais rápida do que a abertura de novas lojas, principalmente porque as unidades ou marcas “compradas” normalmente já estão em funcionamento e gerando faturamento. Onde achar um bom ponto ou terreno de 9 mil m2 em São Paulo? Quanto investir numa operação online?

A verdade é que não basta ter presença online. É necessário um roadmap claro do plano de negócio e de migração para o online.

É essencial montar uma loja que tenha uma experiência de compra bastante azeitada para aumentar o grau de engajamento do usuário (Imagem: REUTERS/Fabrizio Bensch)

Qual a jornada para os próximos três anos? Aliás, quem, a esta altura, ainda está no planejamento para aumentar as vendas online, ou tem uma oportunidade de M&A clara ou já pode ser tarde demais.

No Brasil, há grande informalidade no varejo. Se o negócio não possuir um mix de produtos que garanta uma margem boa, fica difícil concorrer.

A meta pode ser alcançar de 10% a 50% de participação da operação online. Conquistar market share na operação online é uma grande luta. Precisa estar rodando de forma bastante otimizada, com tudo bem mapeado, controlando o sourcing e a base de clientes.

É essencial montar uma loja que tenha uma experiência de compra bastante azeitada para aumentar o grau de engajamento do usuário. A ordem é digitalizar sem desumanizar.

Tendo trabalhado no Grupo Carrefour (CRFB3) por anos e participado do processo de compra do Atacadão, tenho segurança para afirmar que o grau de engajamento está cada vez mais nas marcas menores do que nas grandes redes.

A unidade de uma rede de supermercados menor, que tem menos de 20 anos, por estar perto de onde eu moro, me atende hoje muito melhor do que outra, enorme e tradicional.

A grande rede (compradora) tem os recursos e menos engajamento. Do outro lado (vendedor), o mercado é muito desafiador. Para uma rede de médio porte, viabilizar a operação pode levar anos, sempre correndo o risco de não ter fôlego financeiro para tanto. Essa é uma complementaridade muito interessante.

Mesmo o pequeno e médio varejistas também têm oportunidade de crescer. Por mais que os consumidores façam grande parte das compras pelas plataformas online daqui em diante, sempre sobrará algo para se comprar no mercado da vizinhança.

Aquele ingrediente especial para uma receita de fim de semana que não tinha no estoque da loja online, mas você sabe que no empório do bairro vai encontrar com certeza.

Estas jornadas de compra mantêm vivas as chances dos negócios de menor porte sobreviverem associando-se a empresas que possam lhe dar o devido fôlego.

Momentos como os que estamos vivendo agora favorecem a consolidação. E nem mesmo uma grande rede como o Carrefour pode descartar um M&A do lado seller.

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O objetivo é provocar os executivos para que se coloquem em melhor situação para um melhor valuation no processo de M&A. (Imagem: Agência Brasil/ Marcello Casal Jr.)

Em janeiro, a rede canadense de lojas de conveniência Couche-Tard fez uma oferta de US$ 20 bilhões pela marca supermercadista francesa, que acabou vetada pelo Ministério da Economia da França.

Atuando como conselheiro depois de viajar por diversos países participando da consolidação de bandeiras, utilizo minha experiência para entender em que estágio se encontra a loja ou bandeira interessada num movimento de M&A, seja do lado comprador ou vendedor.

Quando vamos no cliente de médio ou pequeno porte, contribuo com a construção de uma visão estratégica. Fazemos muitas perguntas e analisamos os dados, buscando entender o potencial de faturamento futuro, o desempenho atual e a rentabilidade para estruturar a jornada de investimento.

O objetivo é provocar os executivos para que se coloquem em melhor situação para um melhor valuation no processo de M&A. Avaliamos o estágio da transformação digital e recomendamos nossa lição de casa para que tudo fique organizado. Nem sempre é necessário investir R$ 10 milhões para rodar uma operação online.

As maiores redes se profissionalizaram, criaram regras de governança, engajaram-se em compliance ESG, regras de sucessão, montaram conselhos. Os médios e pequenos precisam de caixa para crescer e o auxílio do grande irmão, como ocorreu no caso do Atacadão, pode ser um caminho.

Com todas as indefinições no país, mesmo com o início da vacinação, os investidores internacionais ainda devem ser cautelosos ao longo de 2021, criando uma boa janela para as operações nacionais se posicionarem melhor no mercado para eventuais processos de M&A. Vale acompanhar a movimentação que vem por aí.

Stephane Kaloudoff é CEO do varejo de vinhos Sociedade na Mesa, membro do BR Angels e Conselheiro da Solstic Advisors*

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