Colunistas

Rodolfo Amstalden: A mesma praça, o mesmo banco

22 out 2020, 12:55 - atualizado em 22 out 2020, 12:56
Rodolfo Amstalden
“Hoje, com muita boa vontade, consigo gostar de um em cada cinco IPOs”, diz o colunista (Imagem: Murilo Constantino/Empiricus)

Cabelos brancos, isso sim é crescimento exponencial.

Tenho colecionado uns cabelos brancos enquanto ainda posso reparar neles.

Não que hoje eu seja um ancião, mas já consigo perceber alguns benefícios (dentre óbvios malefícios) da passagem do tempo.

Quando eu era jovem, eu era cheio de novas paixões.

A cada novo dia de pregão, uma nova ação, uma nova paixão.

Quinze anos atrás, todas as ofertas de ações me pareciam incrivelmente interessantes, incomparáveis, amazing tickets to ride.

Cabiam tantos amores intrínsecos no meu jovem coração sistêmico!

Naquela época, todas as recomendações de compra eram geniais.

Qualquer ação que caísse de repente era pra comprar, e qualquer uma que subisse poderia ser vendida com sentimento de glória.

Hoje, com muita boa vontade, consigo gostar de um em cada cinco IPOs, ler um a cada dez relatórios do sell side com título engraçadinho.

Passo meses trancado no meu quartil predileto, sem vontade de vender ou comprar nada.

Não sei dizer se eu era trouxa, ou se sou trouxa agora. Provavelmente ambos.

Mas sei que tenho ficado mais chato, mais cético, menos apaixonado pelas virtudes alheias e mais atento aos meus próprios vícios.

O analista de ações que amadureceu em mim gosta hoje de exatamente as mesmas coisas das quais gostava ontem.

As pessoas da Faria Lima me evitam no happy hour, graças ao Bom Pai.

Sou pouco interessante numa conversa de bar, pois falo de assuntos repetidos: a meia dúzia de ações que insisto em considerar atrativas, os três fundos imobiliários que teimo em carregar até o fim do túnel.

Na medida em que me aproximo inevitavelmente da morte, vejo minha vida se curvar, rendendo-se à gravidade da minha alma cansada, até que comece a dar voltas em torno de um mesmo eixo, mil vezes, infinitas vezes, querendo tornar eterno o analista dentro de mim.

No limite final, minha carteira de ativos perfeita, com os retornos esperados que só eu espero, e que me fazem feliz, é a carteira do meu eterno retorno nietzscheano.

Preso para sempre em uma vida da marmota que se repete, quais são os raríssimos ativos que eu compraria em todos os episódios da minha série preferida?

Melhor deixarmos tudo isso combinado desde já.

Não quero passar minha velhice distraído por paixões aleatórias.

Devo eleger um único exercício físico para me manter são.

Escolher três rótulos de vinho que tomarei como hábito, todos tintos e secos.

Cinco álbuns de vinil para revezar na vitrola.

Sete livros para reler.

Não mais do que nove ativos.

Sócio-fundador da Empiricus
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.
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