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Rodolfo Amstalden: A vitória da indecência sobre a paciência

03 dez 2020, 15:29 - atualizado em 03 dez 2020, 15:29
Rodolfo Amstalden
“Se quiser ficar rico comprando ações, terá que necessariamente comprar problemas, principalmente no Brasil”, diz o colunista (Imagem: Murilo Constantino/Empiricus)

Investidores iniciantes podem chegar à Bolsa com a falsa impressão de que ações sobem quando tudo está bem e caem quando tudo está mal.

Na prática, são raríssimos os contextos em que tudo está bem ou tudo está mal.

Geralmente, os jogos de mercado têm placar de 2 x 1 ou 1 x 2, com a partida decidida aos 45 do segundo tempo.

Essa noção é vital, pois, se você está à espera de um céu de brigadeiro para comprar, não vai comprar nunca, e não vai ganhar dinheiro nunca. 

O óbvio custa caro demais.

Se quiser ficar rico comprando ações, terá que necessariamente comprar problemas, principalmente no Brasil.

Mais importante do que comprar problemas é saber conviver com eles; esperar até que eles se resolvam ou até que acabe a cerveja, fique tarde e eles decidam ir embora.

“Ah, Rodolfo, mas eu não consigo dormir por causa do enorme risco fiscal.”

Então não compre Bolsa, nem Bs longas. Não é para você. O risco fiscal está longe de ser enorme, já foi bem maior do que é hoje. 

Fique à vontade para reclamar da paralisia do governo, do estouro da dívida/PIB, da decepção com os resultados trimestrais, etc. Tudo isso faz parte do jogo. Só não pode vender coisa boa quando um problema aparece, nem deixar de dormir. O resto vale.

Em meio a toda essa bagunça elementar, suspeito que o brasileiro tenha vocação para investir em Bolsa. O Gilson da B3 falou sobre isso, sobre como a pessoa física deu aula de resiliência durante a pandemia.

Trópicos utópicos. Às vezes para o bem e às vezes para o mal, nós, brazucas, estamos culturalmente acostumados a encontrar sentido de viver dentro de situações subótimas (para usar um eufemismo).

É verdade que não somos um povo paciente. Mas é verdade também que essa aparente falta de paciência decorre de um abdicar do perfeccionismo, de topar as coisas como elas são, condições suficientes para se fazer feliz agora mesmo.

Acho inclusive que a paciência, tão valorizada no vernáculo da psicologia financeira, perde feio em vantagem para a imperfeição cultivada dia a dia.

O investidor paciente, à espera da salvação futura, frequentemente explode quando a promessa de felicidade não vem depois de meses, depois de anos. Sempre chega um momento no qual a paciência se esgota.

Já o investidor imperfeito nunca se esgota. Consegue conviver com os seus próprios problemas, e com os problemas trazidos pelo mercado. Consegue ter um dia difícil e dormir profundamente, e até sonhar.

De repente, de tanto dormir, seu patrimônio vai crescendo, e aqueles problemas vão se tornando menores, menores, menores. Ainda menores do que uma hiperinflação de 4% ao ano.

Sócio-fundador da Empiricus
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.