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Rodolfo Amstalden: manual para se comunicar com o abismo

12 mar 2020, 13:11 - atualizado em 12 mar 2020, 13:11
vidro
“Enquanto investidores de longo prazo, somos obrigados a visitar nossos abismos”, diz o colunista (Imagem: Pixabay)

Se você olha por muito tempo para dentro do abismo, o abismo acaba olhando para dentro de você.

Enquanto investidores de longo prazo, somos obrigados a visitar nossos abismos. Várias vezes, durante toda uma vida. Vá se acostumando.

Isso não é um problema, desde que você não se deixe hipnotizar por esses relevos de profundeza sem fim.

Ao se aproximar de um abismo, feche os olhos para se proteger, para não ser sugado pelo escuro vazio das marcações a mercado.

Feche os olhos, sente-se no chão à beira do abismo, com as pernas cruzadas, deixe-se guiar pelo tato e junte algumas pedras que estão à sua volta.

Agora experimente jogar uma das pedras dentro do buraco. Mantenha seus ouvidos atentos. Ao tocar no chão, a pedra fará um barulho. Você escuta?

Cem metros? Duzentos metros?

Quanto mais ela demora para fazer barulho, mais fundo é o buraco.

Se ela não faz barulho algum, ou se você não escuta coisa alguma, tanto faz, é como se o abismo manifestasse uma profundidade infinita, naquele momento.

É impressionante como, através do som, conseguimos medir a altura de um buraco profundo muito melhor do que através dos olhos, e com menos risco.

Por enquanto, não ouço nada. Jogo uma pedra, mas não escuto o fundo do buraco; ele não fala comigo.

Levanto-me, viro de costas, abro os olhos e volto para casa. Me sinto exausto.

Amanhã estarei de novo à beira do abismo, tentarei jogar outra pedra, em busca de algum som.

Parece loucura repetir o processo todo dia, mas eu sei que este enorme buraco muda de tamanho a cada segundo.

É um segredo que só eu sei, e agora você sabe também.

Em posse desse novo segredo, incompreendido e de extremo valor, você me pergunta:

“E então, o que você fará quando finalmente ouvir o barulho?”

Este dia vai chegar, não tenho dúvidas, não sei quando. Posso acreditar em algo sem prever seu tempo.

Quando o dia chegar, o dia no qual eu ouço o barulho da pedra, pularei dentro do abismo, ainda de olhos fechados.

Dá medo. Mesmo ouvindo o som da pedra, não quero fazer parecer que não dá medo.

Pulo apenas porque, quando a hora chegar, o medo de não pular será maior.

Sócio-fundador da Empiricus
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.
Sócio-fundador da Empiricus, é bacharel em Economia pela FEA-USP, em Jornalismo pela Cásper Líbero e mestre em Finanças pela FGV-EESP. É autor da newsletter Viva de Renda.
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