A um ano das eleições, COP30 é teste verde para Lula e desafio para o Brasil entregar resultados reais
Nesta quinta-feira (6) tem início o encontro de líderes mundiais da COP30, a 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, maior evento do mundo sobre a questão climática, que reúne quase 200 países. Pela primeira vez, o evento é sediado no Brasil, mais especificamente em Belém (PA), no coração da Floresta Amazônica.
O país chega à conferência com o desafio de reafirmar sua liderança nas negociações climáticas globais e reconstruir sua credibilidade ambiental, abalada por políticas inconsistentes que o colocaram entre os cinco maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta.
“No Brasil, há uma política de governo que muda a cada quatro anos, e não uma política de Estado. Discutimos a proteção do bioma amazônico, mas, ao mesmo tempo, não conseguimos combater o garimpo ilegal. Ou seja, estamos passando um recado distorcido”, afirma Jaques Paes, professor do MBA em ESG e Sustentabilidade da FGV.
O evento também carrega um peso político: ocorre a um ano das eleições presidenciais de 2026. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva busca reforçar sua imagem como um “líder verde”, ao mesmo tempo em que enfrenta críticas sobre a organização da COP e ao apoio da pauta ambiental.
Para Paes, a conferência traz visibilidade e uma oportunidade de alavancagem econômica temporária para o Brasil — mas, em termos de sustentabilidade, os resultados tendem a ser limitados.
“A COP, para mim, é um circo diplomático que combina luxo extremo com pobreza extrema. O que está sendo gasto para estruturar o evento seria suficiente para enfrentar parte das mazelas sociais que a própria ONU busca combater”, avalia.
COP das contradições
Às vésperas da conferência, o governo autorizou a Petrobras a realizar pesquisas exploratórias de petróleo na foz do Amazonas — um movimento que reacendeu o debate sobre a coerência da política ambiental brasileira. A decisão contrasta com o discurso da transição energética, baseado na substituição gradual de combustíveis fósseis por fontes renováveis.
O governo também é alvo de críticas por conta da organização da COP30. O alto custo das diárias e a falta de hospedagem em Belém dificultaram a participação de algumas delegações, especialmente de países mais pobres — justamente os mais vulneráveis às mudanças climáticas.
O Itamaraty já confirmou a presença de 143 países. Ainda assim, até o início de outubro, cerca de 80 delegações buscavam alternativas de hospedagem, e nações do Leste Europeu chegaram a considerar a participação por videoconferência.
Paes destaca que a situação vai além da infraestrutura: expõe uma incoerência em relação aos próprios Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Um deles, por exemplo, fala sobre assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos.
“E a COP está acontecendo em um Estado onde cerca de 85% das pessoas vivem sem saneamento. Então, isso por si só já cria uma dicotomia”, destaca Paes.
Além disso, o avanço técnico das negociações também preocupa. Até meados de outubro, apenas 62 países haviam apresentado oficialmente suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) — metas de redução de emissões de carbono previstas no Acordo de Paris, um tratado mundial que busca reduzir o aquecimento global.
Cerca de 100 países prometeram entregar suas metas até o início da conferência, mas potências como Estados Unidos, Rússia, Índia e Japão seguem em atraso. Mesmo entre aqueles que já apresentaram suas NDCs, as metas decepcionam. A União Europeia, por exemplo, reduziu sua ambição climática ao permitir flexibilidades no objetivo de cortar 90% das emissões até 2040.
“Algumas metas não são factíveis. Na COP28, quando se discutiu o fim dos combustíveis fósseis, o ministro da Austrália se levantou e foi embora, porque a economia do país depende disso. Todos sabem o que precisa ser feito, mas o problema é o ‘como’”, afirma Paes.
O que esperar da COP30?
A COP30 ocorre de 10 a 21 de novembro e carrega forte simbolismo: 33 anos da Eco-92, 30 anos da criação da COP e 10 anos do Acordo de Paris.
Realizada no Rio de Janeiro em 1992, a Eco-92 consolidou o conceito de desenvolvimento sustentável e projetou o Brasil como protagonista nas negociações ambientais internacionais.
Desde 1995, as conferências anuais da ONU reúnem países para avaliar o progresso das metas climáticas e firmar novos compromissos. Entre os marcos anteriores estão o Protocolo de Kyoto (1997) e o Acordo de Paris (2015), que estabeleceu o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C.
A COP30 busca traduzir promessas em ações concretas diante da urgência da crise climática. Entre os principais temas em debate estão:
- Redução das emissões: metas mais ambiciosas para manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C;
- Adaptação climática: criação de um plano global com metas e mecanismos de monitoramento;
- Financiamento climático: ampliação do apoio financeiro dos países desenvolvidos — hoje em torno de US$ 300 bilhões anuais, ainda longe dos US$ 1,3 trilhão reivindicados;
- Transição energética: avanço em tecnologias limpas, como solar, eólica, hidrogênio verde e biocombustíveis;
- Preservação da biodiversidade: medidas para conter o desmatamento e proteger ecossistemas;
- Justiça climática: cobrança por mais responsabilidade dos países ricos, que historicamente mais contribuíram para o aquecimento global.
Outros temas também estarão na pauta, como bioeconomia, economia circular, empregos verdes, direitos humanos, direitos dos povos indígenas, gênero, oceanos, mercados de carbono, agricultura sustentável e o papel da tecnologia e da inteligência artificial.