Colunistas

Um mundo afogado em dívidas

04 out 2020, 16:02 - atualizado em 02 out 2020, 19:48
União Europeia
Segundo Paulo Gala, Brexit e Trump são frutos do mundo de “estagnação secular” ou de “novo normal” (Imagem: REUTERS/Yves Herman)

O mundo desenvolvido não consegue crescer na velocidade de outros tempos, o desemprego europeu é enorme, os empregos criados nos EUA desde 2008 remuneram mal e a participação dos americanos na forca de trabalho ainda é baixa para padrões históricos.

Os países emergentes não conseguem crescer para atingir o grupo de economias desenvolvidas: Brexit e Trump são frutos desse mundo de “estagnação secular” ou de “novo normal”.

É importante lembrar que um dos pilares do “new normal” sempre foi a recusa no uso do gasto público como estímulo legítimo de demanda no curto prazo, especialmente, no tocante a investimentos em infraestrutura.

Em meados de 2013, o próprio Bernanke apontava também os temores em relação ao efeito contracionista no PIB dos cortes de gastos públicos nos EUA. Apesar de clamores por uma política fiscal mais expansionista), nenhum governo teve a coragem de ir adiante com essa agenda.

Na Europa, a introdução da moeda única provocou quedas nas taxas de juros, booms de consumo, endividamento e bolhas imobiliárias nesses países. Não houve progresso de fato com upgrading industrial e aumento de capacidades locais de produção. O setor privado e público dos PIGS está ainda muito endividado. Portugal e Espanha passam por recuperações moderadas depois de anos de estagnação. Os governos dos PIGS tem enorme dificuldade em fazer politicas anticilcas por conta do tamanho das dívidas públicas. Abriram mão da política cambial (não tem mais moeda), não podem fazer política fiscal e estão endividados; a política monetária é do banco central europeu. O único mecanismo de ajuste que lhes restou foi a deflação interna.

Por que o mundo não cresce mais como antigamente? A meu ver, dois fenômenos da última década ajudam a explicar essa nova estagnação secular: excesso de dívida e excesso de oferta.

A explosão do endividamento público e privado vem já desde os anos 90, tendo certamente os EUA como motor principal. O motor da renda foi substituído pelo motor do credito. Ninguém tem ativos, tudo é colateral de dívidas.

A sobreoferta mundial tem a ver com a ascensão da Ásia dinâmica do leste. Só a China hoje conta com mais de 100 milhões de trabalhadores produzindo bens manufaturados, tendo saído praticamente do 0 em 1980. A consequência disso é inflação baixa permanente, que provoca juros baixos, que por sua vez não são capazes de estimular novos investimentos, nem novo endividamento.

Dinheiro
“O mundo entrou num looping vicioso e Brasil caminha para a mesma trajetória”, disse o colunista (Imagem: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

O mundo entrou num looping vicioso e Brasil caminha para a mesma trajetória. Não há demanda pela via do investimentos como no passado. Governos altamente endividados não tem coragem de acionar o gatilho do investimento público.

O mesmo raciocínio pode ser transposto para o Brasil, só que em níveis de taxas de juros nominais e reais ainda muito elevados. Se estivermos mesmo no “novo normal” por aqui, nada de juros altos por um bom tempo agora.

O ano de 2016 marcou o final do longo processo de crescimento no Brasil baseado no modelo CCC (crédito, commodities e consumo) iniciado ainda em 2003, e potencializado por políticas anticíclicas no pós-crise de 2008. A forte alavancagem das empresas e famílias brasileiras criou novos patamares de dívida, com juros muito mais elevados do que a media mundial.

CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR
Graduado em Economia pela FEA/USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi professor visitante nas Universidades de Cambridge UK em 2004 e Columbia NY em 2005. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR.
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Graduado em Economia pela FEA/USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi professor visitante nas Universidades de Cambridge UK em 2004 e Columbia NY em 2005. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. CEO/Economista da Fator Administração de Recursos FAR.
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