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A (re)volta do mercado de venture capital no Brasil

26 jun 2024, 12:30 - atualizado em 26 jun 2024, 12:30
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Os fundos de venture capital no Brasil alocaram R$ 5 bilhões, entre janeiro e setembro de 2023. (Imagem: Getty Images)

O mercado de venture capital passou por uma certa correção de rota nos últimos anos, marcando 2023 como um ano desafiador para as startups.

A quebra do Silicon Valley Bank (SVB), somada com a alta na taxa de juros da economia americana, além de outros eventos como a guerra da Ucrânia, fez com que presenciássemos um recuo considerável dos investimentos globais, principalmente em empresas early stage.

Segundo um report da Distrito, os investimentos em startups brasileiras recuaram 86% no primeiro trimestre de 2023, em comparação com o mesmo período do ano anterior.

Já no terceiro trimestre, o mercado demonstrou alguma recuperação. O total de investimentos alcançou US$ 596,7 milhões, um aumento de 54% em relação ao trimestre anterior (US$ 385,8 milhões). Porém, o número ainda veio 16% menor que em 2022 (US$ 711,06 milhões).

Ainda, segundo a Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), em parceria com a TTR Data, os dados de janeiro a setembro de 2023 mostram que os fundos de venture capital no Brasil alocaram R$ 5 bilhões, o que representou um terço na comparação com o mesmo período de 2022. Dado esse cenário, analistas reiteram que os anos de 2021 e 2022 foram de anormalidade no mundo de investimentos de risco, causando uma bolha que dificilmente será vista novamente.

O mercado de venture capital é de extrema importância para um país em desenvolvimento como o Brasil. Além de fomentar inovação e empreendedorismo através de tecnologia, ele acelera setores em crescimento (como energia limpa e biotecnologia), traz novos conhecimentos (muitas vezes vindos de mercados estrangeiros). Também tem impacto expressivo em países emergentes em que o capital de risco é um catalisador significativo para o desenvolvimento econômico.

Felizmente, o ano de 2024 parece ter começado favorável à volta dos investimentos em startups, mas de forma muito mais lenta e cautelosa, e revelando uma nova dinâmica na análise dessas empresas — em sua grande maioria em estágio muito inicial. Pragmatismo parece ser a palavra da vez.

Venture Capital: Quais são as variáveis que estão chamando a atenção dos fundos?

De acordo com Carolina Strobel, uma das mulheres que mais admiro no mercado e fundadora da Antler, os fundos estão de olho em algumas características principais nas startups.

Aproveito a pincelada dela para adicionar minha opinião pessoal a cada ponto:

Olhar de crescimento sai do longo para o curto prazo: planos de negócios sem expectativa clara de geração de lucro e com alto investimento inicial parece ter saído da moda. Modelos financeiros sustentáveis e escaláveis são mais bem vistos. Sai o EBITDA, entram o Burn Rate (ou queima de caixa) e o lucro líquido.

Outro ponto de atenção é que os fundos não podem mais forçar uma réplica do modelo americano nas suas análises: os exagerados múltiplos do valuation até a metodologia de blitzcalling (crescimento a qualquer custo) podem trazer comparações errôneas, já que nosso mercado endereçável, taxas de consumo e outras variáveis são muito menores que o gigante americano.

Esqueça contratações massivas e folha explosiva: contratações direcionadas e seletivas, de perfis específicos, devem ser priorizadas e, o mais importante, garantir que os novos colaboradores tenham a cultura da empresa, provocando um baixo turnover. O incentivo através de equity continua sendo condição sine qua non para manter times sustentáveis e resilientes.

Utilização de caixa para crescer em número de usuários não deve ser regra: a utilização do fluxo de caixa para crescimento em base instalada não deve ser o padrão, deve-se olhar para empresas que maximizam o seu unit economics.

Ter uma base de clientes ativos menor, mas com recorrência e baixo churn, toma o lugar da necessidade de investimentos massivos em marketing e atração de leads muitas vezes não qualificados. O bom e velho LTV/CAC nunca foi tão importante para analisar a capacidade da tecnologia e o quanto o produto pode ser à prova de futuro na linha do tempo.

O perfil do fundador mudou: sai o foco no fundador de perfil visionário para um perfil que já tenha experiências práticas, tendo se provado perante dificuldades em outros projetos. Foco no cliente, adaptabilidade e capacidade de execução são características-chave para ganhar a confiança dos investidores, sem falar na resiliência — por isso a preferência por figuras que já tenham tido casos de sucesso anteriormente.

Pessoalmente, acredito que um fator importante que pode acelerar a retomada do mercado de venture capital são as startups de inteligência artificial (IA). O potencial disruptivo e inovador das tecnologias de IA torna esse mercado altamente atraente para investidores de VC por várias razões, dentre elas, a abrangência da aplicabilidade da tecnologia, a qual transita facilmente entre o aumento de produtividade e eficiência até a geração de receita independentemente do setor.

Além disso, a IA não possui barreiras geográficas, visto que uma solução pode facilmente resolver problemas globais em larga escala.

Segundo a Crunchbase, no primeiro trimestre de 2024, o financiamento global de startups atingiu US$ 66 bilhões (um aumento de 6% em relação ao trimestre anterior). Deste volume, quase US$ 12 bilhões foram destinados ao mercado de IA, reafirmando o apetite dos investidores.

Como uma grande otimista que sou, acredito que, em breve, os bons ventos de retomada chegarão à América Latina para impactar positivamente novos projetos em nossa região.

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Cofounder & CBPO da Lerian, uma startup que desenvolve soluções financeiras open-source. Especialista em finanças e economia com bacharelado em economia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2010); intercâmbio bilateral em Ciências Econômicas e Empresariais na University of A Coruña (2010); MBA em Gestão de Comércio Exterior e Negócios Internacionais pela Fundação Getulio Vargas (2012); MBA Executiva de Economia pela ExxonMobil Business Academy (2014); Mestre em Administração de Negócios pela Coppead UFRJ (2016) e Business Dynamics pela MIT Sloan School of Management. Atua desde 2014 no mercado financeiro e aborda temas como Banking as a Service, Open Banking, embedded finance, PIX, moedas digitais, finanças descentralizadas, fintechs, empreendedorismo feminino, entre outros.
marilyn.hahn@moneytimes.com.br
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