Política

Atacadistas querem prorrogar incentivos, mas economistas alertam para perda de produtividade

23 jun 2021, 17:12 - atualizado em 23 jun 2021, 17:12
Supermercado Índia
Comissão da Câmara adiou a votação do projeto para discutir impacto da prorrogação (Imagem: Reuters/Niharika Kulkarni)

Representantes do setor atacadista e de distribuição defenderam nesta quarta-feira (23), na Câmara dos Deputados, a prorrogação de incentivos do ICMS, que atualmente têm previsão de acabar no fim de 2022. A Comissão de Finanças e Tributação, que promoveu audiência pública sobre o tema, adiou a votação do Projeto de Lei Complementar 5/21, do deputado Efraim Filho (DEM-PB), que estende os benefícios do ICMS por mais dez anos, até 2032.

O coordenador do Fórum Interestadual de Debates do Setor Atacadista Distribuidor, José Damasceno Sampaio, afirmou que o projeto trará segurança jurídica para o comércio na fase de transição da reforma tributária. Sampaio teme a quebra do setor atacadista e de pequenos pontos de venda. “Sem a proposta, haverá desemprego e falta de produtos de primeira necessidade”, previu.

No entanto, economistas alertaram que os benefícios podem diminuir a produtividade nacional, ao aumentar os custos de logística, e até mesmo prejudicar estados mais pobres. Os benefícios fiscais de ICMS somam R$ 60 bilhões por ano.

Desigualdade e caminhões

O relator do PLP 5/21, deputado Da Vitoria (Cidadania-ES), defendeu a aprovação da proposta por acreditar que as regras de transição para acabar com os incentivos fiscais do comércio deveriam ser as mesmas da indústria, que contou com prazo de 15 anos na Lei Complementar 160/2017.

“Às vezes os atacadistas têm mais investimento e geram mais emprego do que a indústria. Neste momento, não podemos fazer ruptura dos incentivos. O País é desigual e temos passivo para acertar”, argumentou.

O deputado Heitor Freire (PSL-CE) acrescentou que o comércio foi prejudicado pelas medidas de isolamento necessárias para conter a disseminação do novo coronavírus. “Se os incentivos fiscais não forem prorrogados, o comércio vai fechar e os preços vão subir. Quem vai pagar a conta é o consumidor final. Os estados estão ansiosos para acabar com os incentivos para tributar mais.”

Heitor Freire afirmou que o PLP 5/21 corrige injustiças enquanto a reforma tributária não é aprovada pelo Congresso. “O que queremos é a reforma tributária. O sistema fiscal é muito complexo. Até mesmo auditores e tributaristas não se entendem, imagine o pobre do empreendedor”, disse.

Já o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP) avalia que os incentivos tributários não beneficiam os consumidores por causa do aumento dos custos de logística e do tempo de distribuição. “Às vezes produtos vão de São Paulo para Minas e para a Bahia, para em seguida voltar para o consumidor que continua em São Paulo”, observou. “Geramos trânsito de caminhões para correr atrás de incentivos, e não atrás de clientes.”

Alexis Fonteyne também justifica o prazo maior de 15 anos para redução dos incentivos para indústria. “Os investimentos para a indústria são maiores do que nos centros de distribuição. A indústria precisa de maquinário e emprega muito mais gente.”

O deputado Enio Verri (PT-PR) afirmou que os incentivos fiscais prejudicam o País. “Este tipo de política favorece a circulação de caminhões e de notas fiscais sem estarem acompanhadas dos produtos. Guerra fiscal não traz redução de desigualdade regional”, contrapôs.

Quebra

José Damasceno Sampaio, representante dos distribuidores, disse que os atacadistas oferecem contrapartidas que são controladas pelos estados em termos de acordo. “A empresa deve comprovar capacidade financeira e apresentar aumento real do recolhimento do ICMS a cada ano. Deve comprovar que houve geração de emprego e não pode ter débito ou dívida ativa no estado para usufruir do benefício”, apontou.

O conselheiro da Associação Brasileira Pró-Desenvolvimento Regional Sustentável (Adial-Brasil), Carlos Luciano, lembrou que os efeitos da pandemia foram devastadores para o comércio. “Acabar com incentivos no fim do próximo ano seria crítico para estas atividades, em especial no Centro-Oeste, no Norte, no Nordeste e em estados como o Espírito Santo”, alertou.

Carlos Luciano defendeu especialmente os polos regionais de comércio eletrônico em estados com menor desenvolvimento industrial. “A alternativa dos fundos para equalizar investimentos regionais não proporciona segurança jurídica. Vão condenar estados menos desenvolvidos a continuar subdesenvolvidos”, reclamou. “Queremos continuar a investir no Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Estas regiões merecem um lugar ao sol”, disse.

Produtividade

O diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), Bernard Appy, alertou que o PLP 5/21 não vem acompanhado de estimativa de impacto financeiro e deveria trazer medidas compensatórias para perda de arrecadação da União. Ele afirmou que, com os benefícios do ICMS, montam-se centros de distribuição em localidades onde o custo econômico da distribuição é maior.

“Isso tem lógica do ponto de vista da empresa, mas não do País. A gente está usando mais caminhão, mais caminhoneiro, mais combustível, mais estrada, para levar o produto para o mesmo consumidor final”, disse. “Com a perda de produtividade, o Brasil produz menos do que poderia. Manter empregos improdutivos é um erro.”

Bernard Appy afirmou que as políticas atuais servem para que estados roubem empresas que, por vocação, iriam para outros estados. “São Paulo dá benefício para frigorífico. Sem o benefício, os frigoríficos estariam nos estados do Centro-Oeste, onde estão os bois. É provável que um frigorífico no Centro-Oeste gere mais emprego do que um centro de distribuição”, avaliou.

O economista Sérgio Gobetti lembrou que 45% dos benefícios fiscais estão concentrados nos seis estados mais desenvolvidos do País: São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ele ainda afirmou que o aumento dos benefícios do ICMS, durante a guerra fiscal dos anos 1990, foi compensado pelo aumento de tributação sobre gasolina, energia e comunicações.

Outro efeito foi que os benefícios favorecem na maior parte a importação, onerando as exportações e o produto nacional. “Fala-se que gera emprego, mas quantos empregos brasileiros produtivos foram destruídos por estes poucos empregos que foram gerados na venda de produtos importados sem impostos?”, questionou.

Sérgio Gobetti reclamou da falta de estabilidade nas regras de transição dos incentivos fiscais. “Aprovamos a regra em 2017 e estamos em 2021 tentando mudar as regras do jogo novamente. É um absurdo que se pense em políticas públicas dessa forma.”

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