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Bruno Mérola: Still got the blues

20 ago 2021, 11:35 - atualizado em 20 ago 2021, 11:35
“Na construção de uma carteira de fundos, o investidor diligente deve saber o que esperar de cada gestor” diz o colunista.

Já estava quase dando aquela pescada de dois minutos no barbeiro, na semana passada, quando o locutor da rádio anunciou: a próxima música a tocar seria o novo single do John Mayer.

Na minha opinião, “Continuum”, de 2006, é um dos melhores álbuns da história. Ali, o músico abandonava o pop, que já havia rendido a ele três Grammys no início da carreira, para voltar às suas origens do blues, influenciado por Stevie Ray Vaughan e moldado pela tradicional e concorrida Berklee College of Music.

Nos anos seguintes, montou a banda de blues John Mayer Trio e passou a colaborar com lendas de diferentes gerações, como B. B. King, Eric Clapton, Gary Clark Jr. e Jimmie Vaughan, irmão mais velho de Stevie.

Quanto maior a expectativa, maior o tombo. A música nova é ruim demais e não lembra em nada os solos de guitarra presentes em 9 das 13 músicas de “Continuum” — em especial este aqui.

Diferentemente do cinema, em que grandes atores e atrizes arriscam-se em personagens cada vez mais autorais à medida que ganham reconhecimento, poucos são os músicos e bandas que conseguem manter sua essência ao longo de décadas, sendo que a maioria costuma ser lembrada pelo que produziu no início da carreira.

Entre meus favoritos, vamos combinar que Oasis nunca mais foi o mesmo após “(What’s the Story) Morning Glory?”, de 1995, e, mais recentemente, The Weeknd já abandonou a pegada mais dark de “Trilogy”, de 2012, para migrar ao pop eletrônico que o levou ao intervalo do Super Bowl deste ano.

Imediatamente após a decepção com o novo single, relacionei o tema à gestão de fundos de investimento.

Aqui, há duas reflexões importantes.

A primeira é se, de fato, gestores com mais tempo de estrada e que ganharam muito dinheiro no início do fundo perderiam, em algum momento, sua essência ou a garra necessária para manter o alfa elevado, acomodando-se com retornos medianos.

No lugar desses gestores, será que também não nos inclinaríamos ao conservadorismo à medida que enriquecemos, na física e na jurídica?

E seriam os ganhos iniciais resultados de um mix de apostas ousadas que jamais deveriam ser repetidas, uma gestão de risco mais flexível e oportunidades anormais de mercado?

Não me entenda mal: todo o mérito àqueles que se arriscam, identificam e aproveitam as oportunidades raras de ganhar muito dinheiro. Frequentemente, as grandes porradas são explicadas por poucos acertos, faz parte do jogo.

No entanto, devemos (tentar) separar sorte de habilidade, curto prazo de consistência, beta de alfa.

A segunda é algo que o analista ou investidor em fundos deve ficar ainda mais atento: o “style drift” ou “desvio de mandato” é a mudança de estilo de um gestor ao longo do tempo, metendo-se com aquilo que não é sua especialidade ou que não foi previamente combinado com o investidor.

Na construção de uma carteira de fundos, o investidor diligente deve saber o que esperar de cada gestor.

Assim, um fundo de ações small caps deve ter toda ou a maior parte de sua exposição a empresas de menor valor de mercado ou com menos liquidez. Um multimercado global deve operar juros, moedas e Bolsas de vários mercados e evitar o viés em Brasil só por estar fisicamente na Faria Lima. Do mesmo modo, um gestor de crédito high grade não deveria aumentar o risco da carteira para high yield à medida que os spreads de crédito se reduzem sem ter experiência nisso.

Essa mudança de estilo ou desvio de mandato é um dos poucos motivos graves pelos quais você deve resgatar um fundo de investimento, assim como mudanças relevantes na equipe de gestão, controle inadequado de risco (exposto especialmente em crises) ou perda da consistência de desempenho de longo prazo.

Na prática, os assinantes da série Os Melhores Fundos de Investimento já acompanharam a retirada de sugestão de gestores por todos os motivos acima nos últimos cinco anos, além dos que nem chegaram a ser indicados pelo mesmo crivo.

Há também o outro lado da mesma moeda.

Enquanto monitora-se a consistência de desempenho e de estilo dos gestores investidos ao longo do tempo, o investidor deve sair da bolha e olhar com atenção para quem está começando.

Não dá para acertar quem serão as próximas SPX, Verde, Kapitalo, JGP, Dynamo, Atmos, Bogari e Brasil Capital sem sair da zona de conforto.

Por isso, tenho dedicado uma parte relevante do meu tempo para conversar com executivos de bancos de investimento e de tesouraria e com analistas talentosos que decidiram empreender e montar seus próprios negócios.

Há quase seis meses, montamos uma carteira com nossas maiores apostas de novas estratégias ou gestoras de multimercados e fundos long biased. Prestes a completar seis meses, quero te convidar para conhecer o fundo da Vitreo que se inspira nessa carteira.

Pelo tamanho ainda menor, capaz de gerar retornos acima da média e brilho nos olhos, é como participar do tradicional blues de terça-feira no O’Malley’s em shows intimistas antes que se tornem sucesso de público — e algumas dessas gestoras, aliás, têm até nome musical, mas aí já é spoiler demais.

Especialista em Fundos de Investimento, CFA, CFP®, CGA
Engenheiro com especialização em finanças, passou quase cinco anos no Itaú Unibanco. No Itaú Private Bank, fazia recomendações de investimentos para os Ultra High-Net-Worth Individuals (UHNWI) - em bom português: os clientes mais ricos e exigentes do Brasil. Atualmente, é o responsável da Empiricus pela série Os Melhores Fundos de Investimento.
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Engenheiro com especialização em finanças, passou quase cinco anos no Itaú Unibanco. No Itaú Private Bank, fazia recomendações de investimentos para os Ultra High-Net-Worth Individuals (UHNWI) - em bom português: os clientes mais ricos e exigentes do Brasil. Atualmente, é o responsável da Empiricus pela série Os Melhores Fundos de Investimento.
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