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China desafia o padrão: Dívida soberana em dólar pode ditar nova taxa livre de risco

21 nov 2025, 9:55 - atualizado em 21 nov 2025, 9:55
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China emite US$ 4 bi em títulos em dólar, com demanda 30x maior que oferta, reforçando credibilidade e impacto para investimentos no Brasil. (Imagem: REUTERS/Florence Lo)

Normalmente, o poder de determinar taxas livres de risco está nas mãos do governo americano, uma vez que os Estados Unidos contam com a confiança dos investidores globais, a melhor reputação fiscal e o menor risco de crédito. A negociação dos títulos soberanos (Treasuries) americanos forma a curva de taxa livre de risco, que serve como referência-chave para todas as decisões de financiamento, investimentos e precificação de ativos.

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No entanto, essa situação pode mudar. A China vem ganhando gradualmente a confiança dos investidores globais, graças à sua disciplina fiscal, além das políticas industriais voltadas para inovação e economia verde. Com isso, seus títulos públicos offshore também podem começar a contribuir para a formação da taxa livre de risco em dólares.

Na semana passada, a China realizou uma emissão bem-sucedida de US$ 4 bilhões em títulos públicos denominados em dólar, divididos em duas fatias de US$ 2 bilhões cada: uma com vencimento de 3 anos e outra de 5 anos. A demanda foi extremamente elevada: o livro de ordens ultrapassou US$ 118 bilhões, cerca de 30 vezes o montante emitido.

A emissão chinesa saiu com spreads praticamente inexistentes em relação aos Treasuries. A tranche de 3 anos foi emitida com rendimento de 3,65% (0,05 ponto percentual acima do Treasury equivalente), enquanto a tranche de 5 anos teve rendimento de 3,79% (0,07 ponto percentual acima).

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O que isso significa para o mercado de dívida soberana global?

  • O mercado reforça a credibilidade da China como emissor “quase livre de risco” no mercado internacional, disposto a financiar o país quase no mesmo nível do Tesouro americano — algo extremamente raro para um país emergente.
  • Os investidores globais confiam cada vez mais na estabilidade econômica, disciplina fiscal e integração global da China. Consideram o país como potencial principal emissor na Ásia, possivelmente criando um novo “offshore dólar asiático” (Asia Dollar), competindo com EUA e países desenvolvidos (como o Euro Dollar).
  • A China demonstrou capacidade de atrair capital de investidores globais e de se financiar nos mercados internacionais mais líquidos. O perfil dos investidores incluiu fundos internacionais, bancos globais e instituições asiáticas, mostrando uma base diversificada e sofisticada. Isso reduz a dependência do sistema bancário doméstico da China e torna o financiamento soberano mais equilibrado entre fontes internas e externas.
  • Como a emissão foi realizada em Hong Kong SAR, a China fortalece a cidade como hub financeiro asiático, atuando como centro global de emissão e negociação de títulos em dólares. Isso também aumenta o interesse dos investidores em RMB, já que a emissão em dólares da China participa da determinação das taxas livres de risco.

Quais são as implicações para o Brasil?

A emissão chinesa em dólar reduz o custo de capital das empresas chinesas que atuam no Brasil, permitindo múltiplas fontes de financiamento no exterior com taxas quase “livres de risco” e prazos mais longos.

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Isso fortalece investimentos em energia, logística, infraestrutura e tecnologias limpas, além de ampliar a capacidade das instituições financeiras chinesas de realizar novos projetos e aquisições no país — especialmente em renováveis, agricultura sustentável, minerais críticos e infraestrutura portuária e ferroviária.

O movimento também reforça o crédito verde no Brasil, considerando o papel da China como líder global em finanças sustentáveis, ajudando na reindustrialização do país e ampliando o financiamento para projetos de cadeia de suprimento de hidrogênio verde, saneamento e agricultura de baixo carbono.

Além disso, a emissão consolida não apenas Hong Kong como hub financeiro internacional, mas também a formação de um ecossistema financeiro chinês, criando novas oportunidades de integração e redução de custos de financiamento entre Brasil e China.

Dessa forma, além dos mercados de títulos de dívida nos Estados Unidos e na Europa, as maiores empresas, instituições financeiras e órgãos governamentais brasileiros podem acessar títulos denominados em dólares ou Dim-Sum bonds em CNH em Hong Kong, Lotus Bonds em Macau ou Panda Bonds (RMB / CNY) em Xangai, dentro do novo contexto de uma arquitetura financeira multipolar.

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*As análises e opiniões são de responsabilidade exclusiva do autor e não representam uma visão das instituições das quais o autor pertence.

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Vice-presidente do Bank of China (Brasil)
Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- Eaesp). É economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), mestre e doutor em administração em finanças pela FGV. Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais, com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais. Possui, ainda, várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
hsia.sheng@moneytimes.com.br
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Hsia Hua Sheng é vice-presidente do Bank of China (Brasil) e professor associado de finanças na Fundação Getulio Vargas (FGV- Eaesp). É economista pela Universidade de São Paulo (FEA - USP), mestre e doutor em administração em finanças pela FGV. Foi pesquisador visitante na NYU Stern School of Business e na Shanghai University of Finance and Economics (SHUFE). É especialista em finanças internacionais, com foco em mercados emergentes, com larga experiência profissional em multinacionais. Possui, ainda, várias publicações em revistas acadêmicas e profissionais de excelências internacionais e nacionais.
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