Como funciona o “nariz eletrônico” da UFPE que detecta metanol em bebidas alcoólicas

Diante do aumento dos casos de intoxicação por metanol em bebidas adulteradas, uma inovação brasileira pode se tornar um divisor de águas na segurança do consumo de álcool. Pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) desenvolveram um dispositivo apelidado de “nariz eletrônico inteligente”, capaz de detectar adulterações — inclusive a presença de metanol — em até um minuto.
O projeto, coordenado pelo professor Leandro Almeida, do Centro de Informática (CIn) da UFPE, combina sensores químicos e inteligência artificial (IA) para, a partir de uma gota da amostra, indicar se a bebida está dentro dos padrões de qualidade ou foi manipulada.
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Como o “nariz eletrônico” funciona
A lógica é simples: assim como o olfato humano reconhece um perfume ou um vinho pelo cheiro, o dispositivo “lê” o aroma químico das bebidas — mas, em vez de neurônios, usa sensores e algoritmos de IA.
O conjunto integra mais de dez sensores sensíveis a compostos voláteis — moléculas que evaporam e formam o cheiro. Ao receber uma gota, o aparelho capta o padrão de gases liberados e converte o aroma em dados digitais. Esses dados são processados por IA e comparados com uma base de referência de bebidas autênticas.

É um “sommelier eletrônico”: aprende o cheiro original e acusa qualquer desvio — diluição em água, mistura indevida ou adição de metanol. Cada bebida legítima (cachaça, uísque, vinho) carrega uma “assinatura olfativa” única; se algo entra ou sai, a assinatura muda. A detecção ocorre em menos de 60 segundos, com taxa de acerto de 98% nos testes de laboratório.
“É como se o sistema tivesse memorizado o cheiro de uma bebida verdadeira e, a partir daí, pudesse acusar qualquer falsificação”, explicou Leandro Almeida ao Jornal do Commercio.
Para alcançar essa precisão, o time alimenta o dispositivo com amostras originais, calibra os sensores e ensina à IA o que é “normal”. Depois, treina com variações adulteradas — diluídas, contaminadas ou misturadas — até reconhecer padrões suspeitos automaticamente. É como um detector de metais: sabe o que procurar — só que, aqui, o que muda são as partículas químicas.
Uma tecnologia com “cheiro” de futuro
A pesquisa é conduzida pelo CIn.AI, núcleo de inteligência artificial da UFPE, em parceria com o CRCN-NE e o IFPE. O projeto tem apoio da Facepe e do CNPq, e já foi apresentado no REC’n’Play 2025, no Recife.
Além de bebidas, os pesquisadores avaliam novos usos: controle de qualidade em alimentos (café, carnes, óleos, pescados), monitoramento do ar e até diagnósticos por odores liberados por fungos e bactérias. “É possível pensar em totens para bares e restaurantes ou versões portáteis, para fornecedores e clientes verificarem a autenticidade em tempo real”, detalhou o pesquisador.

Próximos passos
O foco agora é levar o protótipo para fora do laboratório. A estimativa é de R$ 10 milhões em investimentos para transformar a solução em produto acessível a fabricantes, distribuidores e, no futuro, ao consumidor.
A urgência é clara: o metanol — usado ilegalmente para aumentar volume e cortar custos — é altamente tóxico e, mesmo em pequenas quantidades, pode causar cegueira, coma e morte.
Ainda em fase de testes, o “nariz eletrônico inteligente” já desperta interesse de empresas e autoridades sanitárias. O Ministério da Saúde avalia a possibilidade de aplicar a tecnologia em escala nacional, sobretudo em regiões com histórico de intoxicações.
Se chegar ao mercado, a inovação pode inaugurar um novo padrão de fiscalização e confiança nas bebidas comercializadas no Brasil e no mundo.