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Cripto: falhas técnicas e de governança: o curioso caso do NEO

11 mar 2018, 11:02 - atualizado em 10 mar 2018, 22:55

Por Jamil Civitarese, da Investing.com

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Nesta semana, houve algumas falhas técnicas de impacto no mercado de criptomoedas. O suposto hack da Binance que trouxe rápida queda ao mercado. O índice CRIX, da Universidade Humboldt de Berlim, é composto pelos principais 20 criptomoedas e caiu cerca de 6%. A falha foi corrigida, mas o mercado continuou em baixa por motivos diversos. Quando há falhas do tipo, é esperado que investidores se retraiam pela maior percepção de risco associado ao mercado como um todo.

Quando há acusações de falhas grosseiras em projetos de criptomoedas, o esperado é que eles caiam por algum tempo. Isso valeu para o IOTA e, supostamente, deveria valer para as falhas do NEO apontadas recentemente a partir do dia 25 de fevereiro. NEO, um projeto que visa ser uma plataforma para ICOs e aplicações descentralizadas, teve falhas em sua blockchain que ficou desativada por duas horas e apresentou lentidão em diversos momentos. Diversos analistas comentaram negativamente os fatos, por exemplo, Eric Wall.

A criptomoeda NEO é um projeto que a uma primeira vista motiva um estudo mais aprofundado. Seu algoritmo de mineração é interessante, anunciam 1000 transações por segundo, é um projeto pronto para cumprir com as demandas legais do governo chinês e outras características. Não sem razão, a NEO consta como a sexta maior capitalização do mercado. Com todas as más notícias, entre o dia 25 de fevereiro e o dia 4 de março, a capitalização de mercado da moeda subiu. O projeto ainda não é visto como desinteressante, apesar da falha.

Vale notar que seu principal concorrente, o Ethereum, já teve falhas técnicas. Quando no lançamento da organização autônoma “the DAO”, mostrou-se que os smart contracts da Ethereum podem ter falhas extremamente críticas; no lançamento do jogo CryptoKittens, a sua rede ficou extremamente congestionada. E mesmo assim essa moeda cresceu e hoje é a segunda mais valiosa em capitalização de mercado. Não é simples dizer que o estado presente da tecnologia conduz certamente os preços.

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No entanto, o Ethereum conta com ativos fortíssimos: seu core é sério e extremamente respeitado pela comunidade, assim como seus colaboradores e desenvolvedores são empolgados e envolvidos com o projeto. Quando avalio uma criptomoeda, a qualidade do time de desenvolvimento é uma das métricas mais importantes. Esse time puxa a capacidade de inovação tecnológica para cima, e isso importa mais que a tecnologia presente em si. Há pesquisa acadêmica que sugere que o desenvolvimento técnico de uma moeda puxa seu preço para cima, sendo importante ficar atento a essas questões.

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Crise do NEO

O que a crise do NEO mostra sobre a moeda? Que ela teve um problema? Isso muitas moedas tiveram e continuam tendo. Entretanto, a resposta dada pelo time de desenvolvimento mostra uma grande fragilidade. O diretor de R&D, Malcolm Lerider, da NEO deu uma resposta que mais tarde foi desmentida pelo resto da equipe e que mostra, no mínimo, falhas de comunicação sobre o próprio algoritmo, conforme consta no thread do twitter de Eric Wall. Em uma resposta mais detalhada em seu Medium, Lerider explicou melhor a questão, porém a resposta inicial a crises é um forte indicador da capacidade do Core lidar com críticas e nesse teste o NEO ainda não passou.

Há outros pontos do NEO que são fortemente criticáveis, como a concentração de sua rede. A moeda ainda é recente e possui um longo roadmap, porém essa questão deve ser analisada com cuidado. O core anunciou o interesse em descentralizar. Entretanto, acredito que os esforços de descentralização anunciados são tímidos ainda. Penso que isso pode ser fruto da ideia – errada, mas não pecado capital – de alguns times de desenvolvimento que focam primeiro em resolver os problemas da criptomoeda e depois tratar de sua expansão. É uma questão para ficar atento, mas releváveis se o core mostrar coerência em seguir com a descentralização conforme ICOs e projetos na blockchain do NEO são lançados.

Essa descentralização se torna ainda mais importante quando reparamos o que considero ser o principal ativo do NEO: sua proximidade e vontade de colaborar com o governo chinês. Essa proximidade é uma grande vantagem, afinal é improvável que a China se mantenha sempre longe dessas tecnologias. Se as redes descentralizadas de fato trouxerem vantagens comerciais e tecnológicas, será questão de tempo a liberação da rede no país, trazendo valor de uso para a rede que tiver maior capacidade de atender às regras do governo. Entretanto, se a rede for centralizada e obediente a um governo qualquer, não me parece razoável acreditar que ela permitirá aplicações de fato seguras.

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Há, portanto, uma questão bem conhecida dos brasileiros na criptoeconomia mundial: uma tecnologia com alguns problemas de governança com fortes chances de sobreviver pela proximidade do governo. Há uma interação entre vantagens – compliance com governo chinês – e desvantagens – centralização e má-governança – que permitem achar que há riscos da moeda a longo prazo. Os anúncios de descentralização e algum distanciamento da moeda do governo chinês foram passos dados para resolver algumas dessas desvantagens.

Em suma, ainda é cedo para desclassificar o NEO, seja por motivos técnicos ou políticos, mas o seu core precisa ser mais transparente e dar respostas mais precisas quando pego em choques que inevitavelmente ocorrerão. Enquanto seu desenvolvimento for centralizado e, mesmo assim, ocorrerem respostas imprecisas, creio que há motivos para desconfianças quanto a seriedade do projeto como diversos analistas internacionais têm indicado. Esse é o maior pecado que consigo ver no projeto atualmente. Por agora, a proximidade com o governo chinês e a capitalização de mercado podem atrair investidores, mas a longo prazo podemos dizer que esses são os únicos determinantes para o sucesso? Mesmo que sua resposta para essa pergunta seja “sim”, convém se manter atento para as possíveis dificuldades que a moeda pode sofrer.

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