Renda fixa melhor que variável? Gestora chama isso de mito — e diz que Ibovespa precisa subir 236% para voltar à média histórica
A ideia de que a renda fixa é a grande vencedora e a bolsa o patinho feio dos investimentos pode não passar de um mito, na visão da gestora SFA.
Em sua carta mensal, a casa faz uma análise baseada em dados e chega à conclusão de que, sob qualquer ótica — deflacionada, em dólar ou com índices mais representativos — o Brasil teve equity risk premium.
“Mesmo com os últimos 20 anos ruins, a bolsa brasileira entregou retornos superiores à renda fixa no longo prazo.”
Na avaliação da SFA, a noção de que “o CDI sempre bate a bolsa” é um mito estatístico — fruto de se olhar a janela errada com o índice errado.
“Os últimos 20 anos parecem uma anomalia, não uma nova regra. Se a história serve de guia, o retorno real das ações nos próximos 20 anos tende a ser superior ao observado nas últimas duas décadas.”
A gestora também faz um alerta: caso o fluxo para ações volte, o mercado não teria estoque suficiente para absorvê-lo sem um repricing significativo.
“O tempo, mais uma vez, é o maior aliado do investidor.”
Aos fatos
A SFA recorda que a frase “o CDI sempre bate a bolsa no Brasil” ganhou força após o Plano Real e, principalmente, nos últimos 20 anos.
De fato, nesse período o CDI superou o Ibovespa. Porém, o contexto importa.
“O Ibovespa é um índice imperfeito: concentrado em poucos setores e ponderado por liquidez, o que distorce seu resultado.”
Por isso, a gestora prefere usar o IBrX, índice mais representativo (ponderado por valor de mercado). Nesse caso, a história muda: o retorno supera o do CDI.
Desde 1995, deflacionando os dados:
- IBrX: +6,7% real ao ano
- CDI: +5,6% real ao ano
- Ibovespa: +4,6% real ao ano
“Ou seja, o equity risk premium existiu. O investidor em ações foi recompensado, mesmo após descontar a inflação.”
Apesar disso, a SFA reconhece que o prêmio foi pequeno — e amplamente impactado pelos últimos 20 anos, em que o mercado acionário apresentou retornos medíocres e ainda não superou os níveis de 2007.
Mesmo assim, o fenômeno parece mais uma anomalia do que o novo normal.
Uma outra forma de constatar o fato é observar o índice IQT Ações Ativo, elaborado pela Quantum Axis, que mede o desempenho médio de fundos de ações ativos.
Esse índice, iniciado em 1997, teve retorno muito superior ao do Ibovespa e do IBrX.
Mas o Ibovespa é mais velho que isso…
A SFA lembra ainda um ponto óbvio, mas frequentemente esquecido: o Ibovespa não começou nos anos 1990, e sim em 1967.
“Se olharmos desde então, com dados deflacionados (usando o IGP-DI) ou em dólar, vemos uma história bastante reveladora. O Ibovespa teve desempenho muito melhor que o CDI.”
Segundo a gestora, dada a quantidade de planos econômicos ao longo das décadas, analisar os dados corrigidos pela inflação é indispensável.
“E como o IGP-DI é mais antigo que o IPCA, é melhor usarmos ele — ou analisarmos o Ibovespa em dólar.”
Nesse caso, o Ibovespa rendeu 6% real ao ano, contra 4,4% real ao ano do CDI.
“Ainda que a diferença pareça modesta, ela representa um prêmio real de 1,57% ao ano, acumulado por quase seis décadas.”
Vale lembrar que, antes de 1987, o CDI sequer existia. Por isso, a SFA utilizou estimativas de “overnight” na comparação — valores nem sempre acessíveis ao investidor comum.
Em dólar, a força do Ibovespa também impressiona.
“Em dólar, o retorno do Ibovespa desde 1967 foi excelente. Novamente, é possível afirmar que existiu equity risk premium.”
- Ibovespa: +10,2% ao ano em dólar
- S&P 500 (SPX): +10,9% ao ano (inclui dividendos)
Ibovespa está parado
A gestora destaca que o mercado de ações no Brasil está praticamente estagnado há 20 anos.
Houve melhora entre 2016 e 2020, mas, com a alta da Selic em 2021, “entramos em um dos piores momentos da história para a renda variável”.
Apesar de o Ibovespa estar em máxima nominal, deflacionado pelo IGP-DI ainda está muito distante do recorde de 2007, ao redor de 200 mil pontos.
Já o SMLL — índice mais ligado à economia doméstica — após a máxima de 2019, caiu 48%.
“As condições recentes moldaram o mercado de capitais, especialmente o de renda variável. O sentimento é ruim e a memória recente não ajuda, considerando os últimos 20 anos.”
Desde então, o retorno real do Ibovespa foi de 1,42%, enquanto o SMLL rendeu 0,5%. O IMA-B, por sua vez, entregou 5,23%.
“De fato, muito ruim”, reconhece a SFA.
Ainda assim, essas duas décadas seriam um ponto fora da curva, não o padrão histórico.
“Quando olhamos o retorno real médio em janelas de 20 anos, desde 1967, o Ibovespa registra 7,6% ao ano, com mediana de 4,4%.”
Nos cálculos da gestora, o índice precisaria subir:
- 86%, para 285 mil pontos, para voltar à mediana
- 236%, para 515 mil pontos, para retornar à média histórica
Seria a alta desse ano apenas o começo?