Thinking outside the box

Invasão alienígena ou tensão geopolítica?

17 fev 2023, 19:53 - atualizado em 17 fev 2023, 19:53

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Invasão alienígena ou tensão geopolítica?

Os últimos dias foram curiosos, para dizer o mínimo. Experimentamos mais notícias envolvendo o espaço aéreo da América do Norte. Aviões militares derrubaram neste fim de semana mais objetos voadores não identificados nos céus dos Estados Unidos, na região dos Grandes Lagos, e do Canadá, no território de Yukon.

Os famosos ovnis estão de volta às manchetes.

Ao que tudo indica, embora ainda não formalmente confirmado, os aparatos abatidos eram balões menores do que o balão espião chinês derrubado pelos EUA há uma semana na costa da Carolina do Sul.

Para a tristeza dos amantes das teorias de conspiração sobre alienígenas, a invasão extraterrestre ficou para outro dia. O que temos para hoje é a tensão geopolítica entre EUA e a China.

Vale ressaltar que o Pentágono não confirmou os objetos voadores subsequentes como sendo chineses, enquanto Pequim, por sua vez, acusou os EUA de enviar 10 balões ao espaço aéreo da China em 2022.

Para amenizar o clima, o presidente americano Biden procurou diminuir as preocupações dizendo na quinta-feira que as agências de inteligência não tinham indicação de que os alvos eram aeronaves de vigilância estrangeiras.

Ao mesmo tempo, parece justo perguntar qual é o plano de jogo de Pequim aqui. Veja, estamos falando das duas principais economias do mundo, o que faz com que qualquer atrito, como o que vem acontecendo nos últimos anos, chame sempre a nossa atenção (pode afetar a economia mundial).

Afinal, com briga ou sem briga, os EUA ainda precisam da China para fabricar diversos produtos e a China precisa dos dólares americanos para manter sua economia funcionando.

Ou seja, há uma dependência econômica mútua aqui que não pode acabar do nada, fazendo com que qualquer processo de transformação seja demorado. Dessa forma, a guerra de palavras sobre o suposto balão espião chinês pode estar diminuindo, pelo menos temporariamente.

Até mesmo porque o presidente Joe Biden disse que pretende falar com seu colega Xi Jinping para acalmar a tensão causada pelo barulho do balão.

Há quem argumente que a alta cúpula chinesa podia nem estar ciente de que o primeiro dispositivo de coleta de informações estava pairando no espaço aéreo dos EUA, enquanto outros indicam que foi um erro geopolítico da parte dos chineses.

Seja como for, há outros sinais de que os lados estão ansiosos para virar a página, com o secretário de Estado, Antony Blinken, avaliando uma reunião com o principal diplomata da China, Wang Yi, à margem da Conferência de Segurança de Munique. Assim, uma briga pode ser evitada.

O motivo para a paz? O mundo enfrenta um aperto monetário com poucos precedentes no passado, o que apontaria para uma recessão nos países centrais, enquanto a China luta para finalmente sair das restrições pandêmicas.

O presidente chinês Xi Jinping não é bobo e sabe que para ter um sucesso maior em termos de crescimento precisa que o mundo não caia em uma recessão muito dura e, principalmente, que os EUA não possam retaliar economicamente a China, como fizeram com a Rússia — depois de 2022, qualquer evento geopolítico ganhou peso sobre os mercados.

Ora, os EUA continuam sendo o principal parceiro comercial da China, com o comércio bilateral chegando a US$ 2 bilhões por dia. Enquanto a realidade for essa, o governo chinês precisará controlar a sua resposta aos abates americanos dos objetos voadores.

Claro, isso se os últimos forem mesmo de origem chinesa, como tudo sugere — se tivesse realmente sido apenas uma ferramenta de coleta de dados meteorológicos, Pequim não hesitaria em avisar os EUA formalmente o desvio de rota, conforme a diplomacia internacional pede.

Recentemente, a reunião entre Biden e o presidente Xi Jinping na Indonésia no final do ano passado foi projetada para estabelecer laços entre as duas maiores economias e potências estratégicas do mundo. A esperança era fazer com que as partes trabalhassem em interesses comuns. E as coisas pareciam caminhar bem, apesar do natural atrito entre os países.

Ocorre que, mais uma vez, temos as duas principais economias se estranhando. Sabemos que a tendência é que haja nos próximos anos uma regionalização maior, com a divisão do mundo em dois blocos principais, um mais alinhado aos americanos e outro aos chineses.

Quanto pior for o ambiente geopolítico, mais difícil será para trabalharmos em uma transição saudável de modelo econômico.

Mesmo assim, a história pode nos mostrar que as disputas geopolíticas nem sempre inviabilizam as relações próximas, especialmente as econômicas. Para ilustrar, o comércio de mercadorias entre os EUA e a China atingiu um recorde em 2022, mesmo com efeitos e sanções em vigor desde a guerra comercial da era Trump.

Ao mesmo tempo, o conceito da “Armadilha de Tucídides” nos conta que toda vez que uma nova potencial desafia a potência estabelecida, um conflito armado é inevitável.

O ex-Secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger, diria que a tragédia é inevitável e a tendência é o conflito (a garantia de segurança).

Neste contexto, geopolítica teria supremacia sobre o comércio – se o comércio fosse mais importante, a Primeira Guerra Mundial não teria acontecido. Logo, imaginar que o comércio entre os dois vai servir de desculpa para evitar uma guerra entre os dois parece ser uma ilusão.

Continuando, a situação de agora é problemática, porque a economia da China cresceu no ano passado no segundo ritmo mais lento desde a década de 1970, prejudicada pela pandemia e pelos esforços liderados pelos Estados Unidos para manter equipamentos avançados de fabricação de chips longe do território chinês.

Esperava-se que o relaxamento da política de zero-Covid fosse um novo começo, não apenas para a economia, mas também para as relações internacionais, dado o isolamento da China por tanto tempo.

Agora, porém, o incidente do balão (ou dos balões) pode tornar mais difícil para a economia chinesa recobrar seu brilho.

Quanto mais tempo houver falta de clareza, mais estreita será a janela para tornar o objetivo da reunião na Indonésia possível.

O problema é que isso afeta não só a retomada chinesa, mas o crescimento global como um todo, colocando o Brasil em uma posição peculiar, uma vez que China e EUA são nossos dois principais parceiros econômicos. Com isso, o nosso país nasce como uma potência neutra para servir de pivô nessa relação, ao menos no que nos cabe.

Economista e especialista em investimentos da Empiricus
Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia pela PUC. Pós-graduado no Programa Avançado em Finanças do Insper, trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimentos da América Latina, além de ter feito parte de uma boutique voltada para fusões e aquisições, na área de modelagem financeira e pesquisa. Hoje faz parte no time de analistas da Empiricus, participando de séries como Palavra do Estrategista e Double Income, além do programa Empiricus Private junto do Felipe Miranda, estrategista-chefe e um dos fundadores da casa. É analista CNPI e especialista em investimentos CEA.
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Estudou finanças na University of Regina, no Canadá, tendo concluído lá parte de sua graduação em economia pela PUC. Pós-graduado no Programa Avançado em Finanças do Insper, trabalhou em duas das maiores casas de análise de investimentos da América Latina, além de ter feito parte de uma boutique voltada para fusões e aquisições, na área de modelagem financeira e pesquisa. Hoje faz parte no time de analistas da Empiricus, participando de séries como Palavra do Estrategista e Double Income, além do programa Empiricus Private junto do Felipe Miranda, estrategista-chefe e um dos fundadores da casa. É analista CNPI e especialista em investimentos CEA.
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