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Ivan Sant’Anna: Se fosse para dar “mierda” aqui, como no Chile, já tinha dado

19 nov 2019, 11:14 - atualizado em 19 nov 2019, 11:14
Manifestantes protestam contra o governo chileno em Santiago
Pois bem, agora o Chile está literalmente na merda, com milhões de pessoas enfrentando nas ruas a polícia e o Exército (Imagem: REUTERS/Henry Romero)

Por Ivan Sant’Anna, autor das newsletters de investimentos Warm Up Inversa e Os Mercadores da Noite

Caro leitor,

Não, meu caro amigo leitor, não estou querendo ofender o Chile ao chamá-lo de mierda.

Em 1962, quando passei um mês naquele país, para assistir a segunda Copa do Mundo vencida pelo Brasil, descobri que os chilenos usam essas expressões “Chile, mierda!” ou “Chile de mierda!” em sinal de regozijo. Pode ser num jogo de futebol ou em qualquer tipo de evento festivo.

É um hábito que eles curtem e há semelhanças em outros setores.

Antes do início de uma prova, é comum pilotos de Fórmula 1 dizerem para um adversário, desejando-lhe boa sorte: Break your neck (quebre o pescoço).

Alguns escritores, principalmente os mais antigos (eu sou dos novos, comecei em 1996), em vez de desejar sucesso a um colega, dizem “Merda!”.

Pois bem, agora o Chile está literalmente na merda, com milhões de pessoas enfrentando nas ruas a polícia e o Exército.

Curioso é que há bem pouco tempo o país era considerado um modelo não só para a América do Sul, como também para o mundo.

Uma das razões pelas quais os chilenos estão protestando são as baixíssimas aposentadorias.

É bom lembrar que eles adotaram o regime de capitalização, regime esse que se torna inviável num cenário de taxas de juros baixíssimas, em muitos casos até negativas, considerando-se a inflação. Que é o que está acontecendo agora.

Para quem não sabe, no Chile a transição da ditadura para a democracia se deu pacificamente. O presidente Augusto Pinochet se submeteu a um plebiscito, perdeu e entregou o poder. Mas deixou como herança uma Constituição na qual o regime de aposentadoria com salário integral é privilégio exclusivo dos militares.

O resto ficou na capitalização. E, mesmo com o risco de ser repetitivo, deu merda. Volta e meia me perguntam se acho que o que está acontecendo no Chile e na Bolívia pode se repetir no Brasil. Duvido!

Senão, vejamos…

Lula foi solto. Algumas centenas de integrantes dos “movimentos sociais” (as aspas entram aqui como deboche mesmo) protestaram na avenida Paulista e em outros lugares, sem a menor repercussão.

O Supremo Tribunal Federal deu um ippon na Lava-Jato e outras centenas foram às ruas. Pacificamente.

Reformaram a Previdência, o que geralmente dá merda (viciei na palavra) em qualquer país e a população aceitou numa boa, seja por resignação bovina, seja por percebê-la inevitável.

Mudaram diversos tópicos da legislação trabalhista. O povo (talvez por causa do alto índice de desemprego) ficou na sua.

Sugiro que os caros amigos leitores continuem acreditando na Bolsa enquanto perdurarem as atuais taxas de juros, coisa que pode durar muitos anos. E se a economia der mais alguns sinais de recuperação, apliquem em fundos imobiliários.

Se fosse para dar merda aqui, já tinha dado.