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Max Bohm: Itaú versus XP Investimentos – um grande novelão brasileiro?

26 jun 2020, 9:10 - atualizado em 26 jun 2020, 9:23
Max Bohm
“O que pretendem XP e Itaú com essa falsa briguinha em torno de incentivos” diz o colunista

Diante da repercussão vista nesta semana, não poderia deixar de dar a minha opinião sobre a mais nova pendenga do mercado financeiro: o conflito entre Itaú e XP.

Dono de 49,9% da XP, o Itaú veiculou uma campanha publicitária na qual ataca a postura dos agentes autônomos, justamente os principais soldados da corretora brasileira.

Em resposta ao anúncio, Guilherme Benchimol, CEO e fundador da XP, respondeu pelas redes sociais, defendendo a educação financeira e a democratização dos investimentos promovida por sua empresa, ao mesmo tempo que criticou os abusos dos grandes bancos com altas taxas cobradas dos clientes e a despreocupação com a real necessidade do investidor.

Um grande jogo de cena. Melhor do que muita novela das nove da Globo.

Pessoal, não sejamos ingênuos.

A comunidade de investidores já sabe que os agentes autônomos ligados às corretoras carregam os maiores conflitos de interesse deste setor. Quanto mais os clientes girarem suas carteiras, melhor. E a recomendação dos agentes será sempre voltada àqueles produtos com maior rebate (a famosa “comissão”).

É um grande combo, sendo que eles recomendam os lanches (investimentos) que mais engordam as receitas dos escritórios de agentes autônomos — o que, consequentemente, aumenta a receita das corretoras a que estão vinculados e, claro, o montante sob a XP.

Também é amplamente sabido que o seu “amigo” gerente do banco só vai indicar investimentos que façam com que ele bata as metas (dele) e gere mais margem para os bancos (Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil, etc.). E dá-lhe CDB remunerado a 80% do CDI; título de capitalização que nas entrelinhas te faz perder uma boa parte dos recursos em caso de saque antecipado; fundos DI com taxas de 4%, e por aí vai.

É claro que ainda há os desavisados e menos informados, mas diante da rapidez das informações hoje, desconfio que até a vovó já esteja mais esperta, porque o netinho já a alertou dos interesses escusos dos gerentes e dos assessores de investimento.

Portanto, o que pretendem XP e Itaú com essa falsa briguinha em torno de incentivos e conflitos de interesses?

Para mim, trata-se de uma grande ação de marketing, na qual cria-se uma polarização com a qual o Itaú, em última instância, é o grande vencedor. Se as pessoas defenderem os gerentes de banco, o Itaú ganha. Caso os investidores continuem do lado dos agentes autônomos, o Itaú ganha também, já que é o banco dono de metade da XP. É o famoso ganha-ganha (“win-win situation”).

Mas por que justo agora vem a público essa grande estratégia de marketing do maior banco privado brasileiro?

Nesta semana, dois movimentos no setor financeiro me chamaram a atenção.

O banco suíço Credit Suisse, que tem US$ 1,4 trilhão (cerca de R$ 7,4 trilhões) sob gestão, anunciou a compra de 35% do banco digital Modalmais, avaliando o mesmo em R$ 5 bilhões.

Para quem não conhece o Modalmais, trata-se de uma plataforma de investimentos com quase 1 milhão de clientes e cerca de R$ 10 bilhões de ativos sob custódia. Em outras palavras, um projeto de XP.

No mesmo dia, o banco BTG Pactual anunciou a intenção de levantar R$ 2,6 bilhões em uma oferta primária. Apesar de o BTG não ter confirmado a destinação dos recursos, o mercado especula que o banco de André Esteves estaria planejando uma incursão similar ao que foi feito pelo Credit Suisse, adquirindo parte de uma plataforma digital do mercado como o Banco Inter, que viu suas ações disparem nesta semana.

Na minha humilde opinião, acredito que o BTG vai usar esses recursos para reforçar a sua própria estratégia digital, aumentando sua participação no Banco Pan via compra das ações da Caixa Econômica Federal no banco.

Ou seja, dois eventos importantes que mexem no tabuleiro de xadrez dos bancos e de suas plataformas digitais.

Seria ingenuidade nossa achar que esse movimento dos bancos mirando as corretoras já não circulava pelas entranhas do sistema financeiro. De bobo, o Itaú não tem nada.

Assim, o Itaú aproveitou o momento e lançou uma grande campanha de marketing, retroalimentada por sua pupila XP, com o objetivo de desviar as atenções do mercado e dos clientes para eles.

Espertamente, Itaú e XP estão alimentando esse rebuliço todo com sucesso, pois não se fala de outra coisa há três dias. E, de uma hora para outra, não se vê mais ninguém falando de Credit Suisse, Modalmais, BTG, Banco Inter ou Banco Pan.

Você pode chamar o top management do Itaú de qualquer adjetivo, menos de incompetente.

Um banco que há anos entrega ao acionista uma rentabilidade superior a 20%, mesmo com a alta incidência de impostos sobre seus lucros, pode ter várias peculiaridades, menos falta de competência.

Setubal, Benchimol e companhia sabem muito bem o que estão fazendo. Está tudo em casa. Era hora de reforçar suas posições nesse ambiente financeiro cada vez mais competitivo, e eles estão sendo bem-sucedidos nessa estratégia.

Se você gosta de novela, continue acompanhando os próximos capítulos, mas vou te dar um spoiler: quem mata o vilão no final é o protagonista Itaú.

 

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Equity Research, CNPI, CGA
Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.
max.bohm@moneytimes.com
Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.