Mercado vê amadurecimento do setor de tokenização com revisão da norma 88 da CVM; veja o que dizem especialistas

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) anunciou a abertura de uma consulta pública para reformar a Resolução CVM nº 88, de 27 de abril de 2022, que ampliou o acesso à captação de recursos para empresas de pequeno e médio porte e também abriu espaço para a tokenização de dívidas.
A regra, embora vista como positiva pelos operadores do mercado, ainda estava longe de ser um arcabouço regulatório completo para o setor. A falta de regulação, inclusive, chegou a gerar atritos entre a autarquia e operadores do mercado cripto.
Agora, especialistas consultados pela reportagem do Crypto Times avaliam que a consulta pública para revisar a norma 88 é bastante positiva, enxergando-a como um reflexo do amadurecimento institucional do mercado de ativos digitais e uma necessidade de atualização regulatória frente ao avanço tecnológico do setor.
“A ABToken vai iniciar um trabalho próximo das empresas do setor para a composição de uma manifestação em relação à consulta pública com fundamentos nas dores reais das empresas do mercado de capitais e na busca de aperfeiçoamento normativo para o setor”, comenta Regina Pedroso, Diretora Executiva da ABToken, em nota enviada à reportagem.
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A norma 88 da CVM e a tokenização de ativos
Para Tiago Severo, sócio do Panucci, Severo e Nebias Advogados, head das práticas de cripto e tokenização do escritório, o regime atual da resolução nº 88 foi fundamental para o desenvolvimento do ecossistema de plataformas eletrônicas de investimento.
“No entanto”, continua Severo, “ele ainda estava restrito à figura do microempreendedor inovador, com tetos de captação e limitações à recompra e negociação secundária que, na prática, já estavam sendo tensionadas pela realidade de mercado”.
Assim, com os novos limites propostos — que chegam a R$ 25 milhões para empresas e até R$ 50 milhões para securitizadoras — Severo acredita que haverá um um salto de escala nesse modelo de distribuição.
“Mas mais importante do que apenas os valores, é o fato de que a CVM reconhece que o mercado está pronto para dar este passo”, conclui.
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E a evolução das regras
Quem também animou ficou animado com a revisão da norma foi Gustavo Moreira, advogado, sócio e diretor jurídico da GCB Investimentos e principal referência em tokenização de dívida via CVM 88 no Brasil.
“O impacto é a desintermediação real: emissão, custódia e eventos dos títulos passam a ser registrados em blockchain, eliminando escrituradores e estruturas tradicionais de depósito e registro, além de reduzir o papel de custodiante e outros intermediários que encarecem as operações. Isso torna viáveis projetos entre R$ 2 milhões e R$ 10 milhões, como por exemplo, de pequenos empreendimentos imobiliários a usinas solares e carteiras de CPRs, antes restritos ao crédito bancário”, diz ele.
Para o futuro, Moreira entende que a resolução tende a evoluir em linha com o regime FÁCIL da CVM — outra iniciativa do órgão para dar às empresas de menor porte acesso aos mercados de capitais.
As propostas incluem:
- Elevar o limite de receita do emissor para R$ 250 milhões (metade do FÁCIL, que é R$ 500 milhões);
- Permitir captações de até R$ 150 milhões por patrimônio separado (metade do FÁCIL, que é R$ 300 milhões);
- Dispensar auditoria obrigatória para captações de até R$ 50 milhões;
- Eliminar o período de lock-up de quatro meses;
- Autorizar a liquidação de DVP (delivery versus payment) em stablecoins (com potencial de uso do Drex, o real digital); e
- Criar um mercado secundário permissionado com provedores de liquidez, inclusive algorítmicos, integrados às plataformas.
“Caso sejam implementadas, essas medidas podem transformar 2025 em apenas o início de um ciclo muito maior. A experiência brasileira, já reconhecida pela velocidade de adoção e pela redução de custos, e que inspira reguladores como a SEC, tende a se consolidar como referência também em segurança jurídica, provando que inovação e proteção ao investidor podem caminhar juntas”, conclui ele.