Juros

A IA está roubando empregos, e isso pode tirar o sono do presidente do Fed

26 nov 2025, 7:00 - atualizado em 19 nov 2025, 8:29
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Powell alerta que o avanço da inteligência artificial e as demissões em grandes empresas estão freando a criação de empregos nos EUA, criando um novo desafio para a política monetária do Fed. (Imagem: Kevin Dietsch/Pool via REUTERS)

Jerome Powell está preocupado com o mercado de trabalho dos Estados Unidos. E a culpa é do avanço da inteligência artificial.

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Durante suas falas após a reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), no final de outubro, o presidente do Federal Reserve destacou que a adoção de IA pelas empresas está quase estagnando a geração de empregos. “Grandes empresas indicam que não precisarão contratar por anos. Estamos monitorando isso de perto”, afirmou.

As recentes demissões em grandes empresas exemplificam essa tendência. A Amazon anunciou a saída de 14 mil funcionários, cerca de 4% da força administrativa. A Salesforce demitiu 4 mil pessoas, e a Target cortou mil postos e fechou 800 vagas em aberto.

De acordo com o relatório da Challenger, Gray & Christmas, foram anunciadas quase 946 mil demissões nos EUA em 2025, o maior total desde 2020 — sendo 17 mil relacionadas à IA e 20 mil à automação. Apenas em outubro, os cortes aumentaram em 153 mil em relação ao mesmo mês do ano anterior, o maior avanço para o período desde 2003.

“Estamos começando a passar por uma mudança que pode ser mais estrutural, dependendo da evolução futura. A inteligência artificial aumenta a eficiência e, consequentemente, algumas vagas que poderiam ser criadas anos atrás podem ser reduzidas hoje”, afirma Bruno Yamashita, analista de alocação e inteligência da Avenue.

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Desemprego nos EUA

Apesar do avanço tecnológico pressionar o mercado e acender um sinal de alerta no Fed, o cenário nos EUA é de criação líquida de vagas quase nula e baixa mobilidade corporativa, ao mesmo tempo em que o desemprego se mantém em patamares considerados saudáveis — em torno de 4,3%, próximos do pleno emprego.

Segundo Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad, entre os motivos estão fatores cíclicos, como o custo de capital ainda elevado após os aumentos nas taxas de juros em resposta às pressões inflacionárias pós-pandemia, além de incertezas no cenário macro e político — como guerra comercial e potencial desaceleração econômica — que desestimulam demissões.

Já os fatores estruturais também chamam atenção. “Em primeiro lugar, temos a demografia: a aposentadoria acelerada dos Baby Boomers contrai a oferta de mão de obra experiente, mantendo o desemprego baixo. Também há menos incentivo para a chegada de trabalhadores estrangeiros nos EUA, o que pode contribuir para a desaceleração nas contratações”, afirma.

Quanto à inteligência artificial, as expectativas de ganho de produtividade relacionadas às novas tecnologias podem desestimular a abertura de novas vagas. Ao mesmo tempo, as companhias evitam demitir, especialmente após o movimento conhecido como “great resignation” no pós-pandemia, que gerou escassez de talento.

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Yamashita lembra que a IA afeta principalmente recém-graduados que buscam os primeiros empregos. Com isso, é natural que vagas de nível inicial sejam mais impactadas do que posições já existentes na força de trabalho.

Segundo ele, ainda é cedo para determinar se essa é uma mudança estrutural, mas, nos próximos anos, com as atuais políticas migratórias, o crescimento do emprego deve ser menor que nos últimos anos — o que não significa necessariamente um desempenho ruim.

“É uma questão de normalização e ajuste. Um dado do Fed de Dallas, por exemplo, sugere que uma média de 30 mil novos postos de trabalho por mês poderia manter o mercado estável, mesmo com menor criação de vagas”, completa.

Dilema do Fed

Este cenário — forte investimento em tecnologia e fraca geração de empregos — tem influenciado a política do Fed. Taxas de juros mais altas ajudam a conter a inflação, mas podem reduzir contratações, enquanto cortes estimulam o emprego, mas pressionam os preços.

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Além disso, a baixa mobilidade do mercado de trabalho não é saudável para a economia. A troca de empregos é um dos principais fatores por trás dos aumentos salariais — e a estagnação dos salários pode reduzir o consumo e afetar o crescimento econômico.

O dilema do Fed, segundo Powell, está na tensão entre inflação e emprego: enquanto a automação e a IA aumentam a produção, também reduzem a necessidade de mão de obra, deixando o mercado de trabalho mais vulnerável mesmo com crescimento do PIB. “Temos riscos de alta para a inflação e riscos de baixa para o emprego. Isso é desafiador, pois um exige corte de juros e o outro, aumento”, afirmou o diretor da autoridade monetária.

Zogbi destaca que os impactos potenciais da IA dificultam a análise do cenário, porque podem ser desinflacionários — reduzindo o custo de produção e os salários — e prejudiciais ao mercado de trabalho ao mesmo tempo.

“Quedas na inflação são o que o Fed busca, desde que elas não estejam relacionadas a uma desaceleração ou um potencial de demissão em massa — neste caso, manter os juros altos para combate à inflação poderia acelerar as demissões, aumentando o desemprego”, afirma.

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Próximos passos de Powell

O analista da Avenue aponta que o Fed enfrenta um desafio complexo, já que, apesar dos cortes recentes nas taxas de juros, a política monetária permanece em patamar restritivo — ainda acima do crescimento da atividade econômica americana.

“Considerando uma economia que cresce sem gerar tantos empregos, a taxa de juros ideal seria aquela que mantém a inflação próxima da meta e em linha com o crescimento de longo prazo”, afirma.

Já a estrategista-chefe da Nomad destaca que, tradicionalmente, o crescimento do PIB exigiria juros mais altos para evitar superaquecimento. Mas, se a estagnação do mercado de trabalho começar a se traduzir em aumento do desemprego, o ideal é que o Fed se antecipe a esse movimento — daí a expectativa de cortes de juros, com um ciclo já iniciado e que tende a continuar, ainda que a passos lentos.

Por enquanto, o mais provável é que o Fed mantenha a postura de cautela, traduzida em pausas prolongadas, mantendo os juros em patamares restritivos, ainda que aplique cortes quando os dados fornecerem conforto para tal.

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Coordenadora de redação
Formada em Jornalismo pela PUC-SP, tem especialização em Jornalismo Internacional. Atua como coordenadora de redação no Money Times e já trabalhou nas redações do InfoMoney, Você S/A, Você RH, Olhar Digital e Editora Trip.
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