Opinião

Tesouro Direto: Investir na B ou F em 2017?

19 dez 2016, 18:54 - atualizado em 11 set 2019, 16:32

Marcelo Petersen Cypriano é sócio-estrategista da Mont Capital Gestāo de Recursos.

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Os tempos atuais estão cheios de ruídos econômicos, políticos e jurídicos que dificultam decisões como a escolha de títulos para investimento. Há muitas mudanças complexas em curso (e vários riscos) que desafiam o ordenamento de seus impactos no retorno dos vários investimentos disponíveis hoje, tais como as NTN-F e NTN-B de prazo mais longo.

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Uma breve introdução ajuda a organizar uma estratégia. O retorno destes títulos no próximo ano depende da sua taxa atual e da mudança nestas taxas até o final de 2017. O motivo é valorização necessária para refletir a provável queda do juro de longo prazo no Brasil, o que antecipa uma parte do retorno até o vencimento para deixa-los arbitrados ao ambiente de juros e retornos mais baixos vigente em 2018.

A decisão precisa, portanto, de duas informações, uma difícil e uma mais fácil. A difícil é estimar qual pode ser a taxa de juros de prazo mais longo no Brasil na virada de 2017 para 2018. Isto inclui a taxa pré-fixada e também o cupom real dos títulos indexados a inflação, o que envolve estimar a inflação implícita esperada pelo mercado ao final do ano que vem. A informação mais fácil é a reação do preço de cada título a variações na taxa de juros.

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A parte difícil

A taxa de juros de longo prazo, representada inicialmente aqui pelo swap pré-DI de 5 anos, pode ser decomposta por um componente do juro de curto prazo (que por sua vez vai refletir a expectativa de política monetária nos 12 meses seguintes, mais um certo prêmio), um componente macroeconômico relativo a expectativa para a inflação e crescimento futuros, além de outro componente relevante relativo ao juro no exterior e ao prêmio de risco-Brasil.

É sabido que há movimentos esperados para todos esses componentes, muitos em direção oposta, o que exige então a elaboração de cenários (ou premissas) para cada um e o uso de combinações alternativas para testar a consistência (e os riscos) da escolha de mais títulos NTN da série F ou B na carteira.

Devemos começar pelo mais polêmico, pois todos possuem opinião a respeito: a política monetária em 2017, ou melhor, o ritmo e o tamanho possível do corte da taxa Selic no próximo ano.

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Podemos começar pelo consenso disponível no sistema de coleta de expectativas do Banco Central. São seis cortes de 0,50 ponto e um derradeiro corte de 0,25 ponto, o que encerraria o próximo ano com a Selic a 10,50%. Porém, o que importa aqui é a expectativa para a Selic média em 2018 e o sistema de coleta aponta para uma taxa média de exatos 10,0%.

Um cenário alternativo pode considerar maior cautela dos membros do Comitê de Política Monetária e uma distribuição diferente para dos cortes. Uma possibilidade seria que, após dois cortes de 0,50 ponto nas duas primeiras reuniões do ano, o Comitê decidisse retornar ao ritmo de 0,25 ponto de corte por reunião. O benefício seria reduzir o risco da inflação superar a meta em 2017 e estender o corte gradual ao longo de 2018 de forma atingir uma taxa final mais próxima de 9,0% ao final de 2018.

A diferença é pequena para nossos propósitos, pois a Selic média esperada em 2018 seria em torno de 10,1%.

A estimativa da taxa de 5 anos ao final de 2017 precisa de outros componentes. Um deles é a expectativa de inflação para 2018 (e anos seguintes em menor medida), pois o corte rápido cria um risco maior da inflação voltar a subir. Um eventual aumento da expectativa de inflação na direção de 5% teria sozinho um impacto moderado na taxa de 5 anos (algo como 0,1 ponto), mas a possibilidade do Banco Central ter de reagir em algum momento e voltar a elevar a Selic em 2018 seria significativa para a estimativa. Vamos nos ater ao cenário de inflação na meta de 4,5% em 2018.

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O cenário para a política monetária e inflação explica cerca de ¾ da estimativa da taxa de juros de longo prazo ao final de 2017, enquanto o ¼ remanescente vem do ambiente internacional.

O componente mais relevante é o juro de 10 anos nos Estados Unidos. Como se viu, a eleição de Donald Trump e as suas promessas de estímulo fiscal para o investimento em infraestrutura fez esta taxa subir de 1,75% para 2,60% em poucas semanas. Vamos ser mais modestos e esperar uma alta adicional de 0,50 ponto para a vizinhança de 3,1% ao final do próximo ano, o que pressiona as taxas de juros longas no Brasil em algo como 0,3 ponto percentual.

O último componente é o prêmio de risco-Brasil, representado aqui pelo Credit Default Swap (CDS) de 5 anos. É difícil ter um cenário para este componente, pois sua evolução combina tanto as condições financeiras internacionais, como o ritmo de reformas e o ajuste macroeconômico brasileiro. Vamos tomar como premissa inicial a sua queda em 1 ponto percentual (de 285 pontos-base atuais para 185) e depois propomos variações nesta hipótese.

O resultado é uma queda estimada de quase 1,4 pontos na taxa do swap pré-DI de 5 anos, atualmente em torno de 12,1% e estimada em 10,7% na virada de 2017 para 2018.

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Nem tão fácil assim

A expectativa para o retorno de cada título do Tesouro Direto começa a se mostrar. Não há um título com vencimento exatamente em janeiro de 2022 (5 anos), mas podemos ilustrar com a NTN-F e a LTN que vencem em janeiro de 2023 (6 anos).

A NTN-F 2023 se valoriza 4,2% para cada ponto percentual de queda em sua taxa de retorno. A LTN 2023, por capitalizar o juro e por isso ter uma duração maior, valoriza 5,8%. A LTN, portanto, além de pagar 12,28% no dia 15 de dezembro, responde mais a queda do juro longo e deve render cerca de 21,1% em 2017 no cenário em que sua taxa recue para 10,7% ao final do próximo ano.

A NTN-F 2023 renderia 18,3% em 2017 por ter um fluxo semestral de pagamento de juros que diminui a sua resposta a queda do juro longo e registrar uma taxa de 12,11% no dia 15. Um retorno ao redor de 21% exige o investimento na NTN-F 2025, mas este retorno depende também da hipótese que sua taxa recue de 12,12% para 10,45% (-1,65 ponto percentual por razões explicadas mais adiante).

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A pergunta inicial é mais complexa: investir nas NTNs série F ou B?

A comparação exige uma estimativa da queda do cupom real das NTN-Bs como reação a queda de 1,4 pontos na taxa do swap pré-DI de 5 anos. Porém, o poder de explicação da taxa de 5 anos para esta reação cai da vizinhança de 90% no caso da taxa das NTN-Fs de diferentes prazos para cerca de 65% no caso das NTN-Bs.

A melhor estimativa aponta para uma queda de 0,70 pontos no Cupom da NTN-B ago./2024. Este título se valoriza 6,1% para cada 1 ponto percentual de variação em seu cupom, mas a estimativa de seu retorno também precisa de uma expectativa para a inflação em 2017 (usamos 4,7% registrados no cenário de mercado do Banco Central). O resultado seria um retorno de 16% em 2017.

Algumas premissas adicionais ajudam a compreender como funciona o cenário e a estratégia para a decisão.

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Um ponto importante é o desempenho do prêmio de risco-Brasil, o CDS 5 anos. O impacto da queda do prêmio de risco é maior nos prazos mais longos. Um cenário benigno em que as reformas no Brasil avancem diminui o prêmio de risco e reduz mais as taxas mais longas, o que possui impacto adicional no retorno da NTN-F 2027 (queda de taxa de 12,06% para possivelmente 10,1%), cujo retorno pode atingir 24%.

O impacto na queda do cupom da NTN-B é distinto, pois a aprovação de reformas fiscais diminui também a expectativa de inflação a longo prazo. Como exemplo, a inflação implícita entre o retorno da NTN-B maio/2026 e a NTN-F jan./2027 é atualmente de 5,5% ao ano. Porém, nas premissas e estimativas para o final de 2017, esta inflação implícita recua para 4,4% (adoção de meta de 4,0% em 2019 e decrescente nos anos seguintes, melhor operação do regime de metas, etc.). O retorno da NTN-B maio/2026 fica assim na vizinhança de 17%, bem abaixo do retorno da NTN-F 2027.

O cupom das NTN-Bs de prazos mais longos registram assim respostas menores a queda de 1,4 pontos na taxa do swap pré-DI de 5 anos. O cupom da NTN-B Principal 2035 possui uma queda estimada em 0,65 ponto e o cupom das NTN-Bs 2045 e 2050 de 0,60 ponto. Como são títulos longos, a resposta do preço a esta queda do cupom é grande, mesmo sendo uma variação menor face a queda do swap pré-DI. A NTN-B 2050 possui retorno para 2017 estimado em 20,3% e a Principal 2035 em 23,8%.

É importante reter que a confiança na estimativa dos retornos das NTN-Bs é menor, pois a capacidade explicativa do cupom pelos componentes que explicam o juro longo é mais baixa, ao mesmo tempo em que a forma que o mercado distribui a queda do juro longo entre cupom e inflação implícita pode mudar. O cupom longo pode simplesmente recuar mais fortemente pela arbitragem de outros retornos reais e resultar numa inflação implícita mais elevada, o que seria apenas mais uma entre inúmeras distorções existentes no mercado. O retorno das NTN-Bs pode assim estar subestimado, embora de forma moderada apenas.

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Retorno e volatilidade

Estes retornos estimados precisam também ser comparados a volatilidade (risco) de cada título. Um ponto de partida óbvio é que respostas maiores do preço do título a variações na taxa de juros está ligada diretamente a maior volatilidade do preço (e do retorno). A LTN 2023 possui uma volatilidade quase 40% maior que a NTN-F 2023, enquanto a volatilidade da NTN-F 2025 (que possui o mesmo retorno estimado) é menor que a LTN 2023. A NTN-F 2027 com seu retorno elevado, também possui volatilidade mais baixa que a LTN 2023.

A volatilidade cresce com o aumento do prazo e da duração dos títulos. Portanto, as NTN-Bs mais longas, com vencimentos distantes para os quais não existem NTN-F de prazos equivalentes, são naturalmente mais voláteis para retornos semelhantes aos títulos pré-fixados. A NTN-B maio/2035 possui volatilidade equivalente a NTN-F 2027, mas possui um rendimento estimado de somente 18,5%. A busca de retornos próximos a 24% exige o investimento na NTN-B Principal 2035, a qual possui uma volatilidade 1,7 vezes maior que a NTN-F 2027 e superior a volatilidade da Bovespa.

Estes retornos no intervalo 18-24% precisam ser comparados também  com a perspectiva de valorização da Bovespa nesta saída de recessão. O histórico da saída de nove recessões anteriores e características da saída atual (câmbio desvalorizado, queda real anterior do índice Ibovespa por seis anos consecutivos, lucros deprimidos e elásticos a pequenas variações no PIB) permitem mencionar a perspectiva de valorização da bolsa de valores entre 25-30% em 2017, ao passo que o Ibovespa possui volatilidade entre a NTN-B 2050 e a Principal 2035.

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Cenários alternativos

Precisamos entender agora as variações possíveis de cenário. Podemos reduzir as variações a duas categorias, externa e interna.

A primeira é uma alta mais forte de juros nos Estados Unidos que aumente o prêmio de risco brasileiro. O efeito sobre as taxas de juros da NTN-F seria direto, derrubaria seu preço e reduziria o retorno esperado para o ano. Porém, um movimento deste provavelmente seria acompanhado da desvalorização do real diante do dólar. Como resultado, o efeito em uma NTN-B de mesmo prazo que naturalmente seria mais contido, ao oferecer o seguro contra o aumento na expectativa de inflação, poderia proporcionar a diminuição na diferença dos retornos em 2017 por uma alta do cupom menos intensa relativamente a alta do juro longo.

A segunda e mais perene seria um desarranjo político no Brasil que tornasse insustentável o ajuste fiscal por meio da limitação constitucional ao crescimento do gasto público. O prêmio de risco subiria sem o aumento do juro no exterior, mas a reversão das expectativas para uma alta contínua e forte da inflação, a provável interrupção do ciclo de corte da Selic, a possibilidade de nova recessão e a insegurança sobre o valor real de contratos nominais alguns anos a frente tenderia a tornar o retorno da NTN-B mais atraente.

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Existe também a citada possibilidade de erro na estimativa, especialmente no caso do retorno das NTN-Bs, e mais ainda nos cenários extremos para a alta da expectativa de inflação. O mundo (e o futuro) é muito complexo e os valores descritos acima não são exatos e dependem de hipóteses e cenários que precisam se concretizar, mas servem como referências para organizar a estratégia de uma decisão.

Afinal, o que fazer

Como vimos, ao ordenar o impacto dos movimentos, diferenças no ritmo de corte da taxa Selic interferem pouco, uma vez que sejam consistentes com a queda da inflação rumo a meta de 4,5% em 2017, ou signifiquem a extensão do ciclo em 2018. O jogo depende mais da perspectiva da inflação (em 2017 e 2018), do prêmio de risco brasileiro e do juro no exterior, mas é preciso uma combinação de choques fortes o suficiente para alterar a conclusão das referências acima.

Em suma, a decisão do investidor e a confiança nas referências acima dependem do julgamento do investidor sobre a capacidade do Brasil se ajustar e do crescimento nos Estados Unidos acelerar ao ponto de alterar a perspectiva de elevação dos juros.

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A NTN-B foi a estrela do mercado no longo período em que as políticas monetária e fiscal foram de péssima qualidade. Agora que há um ajuste e uma estabilização em curso, os retornos vão retornar a normalidade na qual os títulos indexados a inflação, por serem mais seguros, rendem menos que os títulos pré-fixados.

Em 2017 deve chegar a hora de deixar a Bola de lado e andar com a Faca nos dentes.

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