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Tributação de criptoativos: Por que a alta do IOF é ruim a inovação financeira

14 jul 2025, 12:02 - atualizado em 14 jul 2025, 12:03
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Medida Provisória que acaba com isenção para vendas de até R$ 35 mil impõe nova carga tributária e ameaça inclusão digital e segurança regulatória no setor de criptoativos. (Imagem: nana/Canva Pro)

O Brasil vem se destacando como uma das economias digitais mais dinâmicas do mundo, e o setor de criptoativos é parte essencial dessa evolução. Esse avanço não aconteceu por acaso: é fruto de um esforço conjunto entre governo, empresas e reguladores, que vêm construindo, passo a passo, um ambiente mais seguro e moderno para a inovação financeira. Nesse contexto, a Medida Provisória 1303/2025 — do aumento do IOF — representa um grande retrocesso.

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Inicialmente, é importante reforçar que o mercado de criptoativos no Brasil já é tributado em diversos pontos, da operação ao lucro, passando pela empresa e pelos usuários. Os ganhos com a venda de ativos digitais seguem as regras do Imposto de Renda, com apuração mensal feita pelo próprio investidor. Desde 2019, exchanges e usuários também são obrigados a reportar suas operações à Receita Federal, conforme previsto na Instrução Normativa 1.888. Ou seja: o setor já contribui com o Fisco e atua dentro das normas estabelecidas.

O que a MP propõe agora é acabar com a isenção para vendas de até R$ 35 mil por mês — regra que hoje também vale para ativos como ações e imóveis. Em seu lugar, institui uma alíquota fixa de 17,5% sobre os lucros, sem qualquer gradação. Isso atinge em cheio o pequeno investidor, que representa a maioria dos usuários de criptoativos no país.

Na prática, se uma pessoa tiver um lucro de R$ 100 em uma operação, terá de pagar R$ 17,50 em impostos. Essa mudança reduz drasticamente o estímulo à entrada de novos investidores, especialmente os que movimentam valores menores e estão dando os primeiros passos no mundo dos ativos digitais. Em vez de promover inclusão financeira, a medida dificulta o acesso justamente para quem mais precisa de alternativas simples, digitais e acessíveis.

Outro ponto que preocupa é a obrigação das plataformas brasileiras de reterem o imposto na fonte nas operações. O problema é que não há como implantar um controle eficaz para auferir esse imposto. Isso cria insegurança para empresas e usuários, além de abrir espaço para erros e injustiças. Veja que o mesmo ocorre em diversos outros tipos de empresas de natureza similar, que nesta MP foram excluídas dessa obrigação justamente por essa dificuldade.

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A MP também cria uma distorção entre quem investe diretamente em cripto e quem o faz por meio de valores mobiliários (fundos, ETFs, etc.). Esses produtos, por enquanto, não estão sujeitos à mesma cobrança nem às exigências de retenção. O resultado é um desequilíbrio entre diferentes produtos cripto oferecidos no mercado, que pode influenciar o comportamento dos investidores, favorecendo mais produtos do que outros.

E tem mais: quando operar dentro das regras se torna mais difícil, mais caro ou mais burocrático, muita gente acaba migrando para plataformas que não são alcançáveis pela jurisdição brasileira. Com isso, o país perde arrecadação, perde controle sobre o setor e enfraquece a proteção ao investidor. É o efeito contrário do que se espera de uma boa política fiscal.

O timing da medida também não é adequado. O setor está no meio do processo de regulamentação conduzido pelo Banco Central. A MP cria a possibilidade de mudar a regra de tributação antes do processo de regulamentação, o que gera confusão, incerteza e insegurança jurídica e econômica.

Dentro do processo de evolução, é natural discutirmos modelos tributários próprios. Mas isso tem que acontecer no momento adequado, com diálogo, alinhado com a regulação e o mercado. Com previsibilidade e equilíbrio.

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A boa notícia é que ainda há tempo para corrigir esse rumo. A MP está em tramitação no Congresso e já foram apresentadas emendas que propõem restaurar a isenção de R$ 35 mil e adiar a entrada em vigor das novas regras até que o ambiente regulatório esteja mais claro. O Brasil precisa de uma política fiscal inteligente, justa e compatível com a realidade do setor.

Não se trata de fugir da tributação — ela é necessária. Mas precisa ser construída com base em diálogo, bom senso e técnica. O país tem todas as condições de ser uma referência global em criptoeconomia. Mas isso só será possível se houver previsibilidade, equilíbrio e, principalmente, coerência entre regular e tributar.

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Bernardo Srur, diretor-presidente da ABcripto, é executivo com mais de 15 anos de experiência em governança, mercado financeiro, criptomoedas e economia digital. Apaixonado por tecnologia, envolvido ativamente em temas ligados à regulação, inovação e evolução digital. Nessa jornada, foi Conselheiro da ABCripto responsável pelo desenvolvimento da autorregulação para o setor de criptomoedas brasileiro, foi Diretor de Risco e Compliance na 2TM/Mercado Bitcoin responsável pela implantação das práticas de integridade e PLD na maior exchange do Brasil, gestor na B3, Cetip, Hospital Albert Einstein e KPMG.
bernardo.srur@autor.moneytimes.com.br
Bernardo Srur, diretor-presidente da ABcripto, é executivo com mais de 15 anos de experiência em governança, mercado financeiro, criptomoedas e economia digital. Apaixonado por tecnologia, envolvido ativamente em temas ligados à regulação, inovação e evolução digital. Nessa jornada, foi Conselheiro da ABCripto responsável pelo desenvolvimento da autorregulação para o setor de criptomoedas brasileiro, foi Diretor de Risco e Compliance na 2TM/Mercado Bitcoin responsável pela implantação das práticas de integridade e PLD na maior exchange do Brasil, gestor na B3, Cetip, Hospital Albert Einstein e KPMG.