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Tributação dos Fiagros: Tiro do governo pode sair pela culatra

04 dez 2023, 17:12 - atualizado em 04 dez 2023, 20:31
Fiagros
O PL vai dificultar a vida das gestoras independentes e, por consequência, o acesso dos produtores rurais ao crédito (Imagem: Divulgação)

O Projeto de Lei (PL) 4.173/23, recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados e que agora segue ao Senado, é uma arma importante, na visão do governo, para conter o déficit fiscal. Sua repercussão, entretanto, não é bem assim. O PL deve penalizar um setor carente de recursos e que tem se mostrado a alavanca do crescimento econômico brasileiro: o agronegócio.

Estamos nos referindo aqui às mudanças na taxação dos Fiagros, fundos de investimentos que servem como forma de financiar os produtores rurais e que estão se consolidando cada vez mais como alternativa de obtenção de recursos. É consenso que os valores disponibilizados pelo governo para o financiamento das safras, por exemplo, são insuficientes.

O mesmo pode-se dizer do sistema financeiro tradicional.

O PL prevê que para ter a isenção nos rendimentos, as cotas dos Fiagros devem ser admitidas à negociação exclusivamente em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado.

Além disso, a medida altera o número mínimo de 50 para 100 cotistas que um Fiagro deve ter para que seus proventos sejam isentos de imposto de renda. A proposta anterior era ainda pior, pois previa número mínimo para isenção deveria ser de 500 cotistas.

Na visão do ministério da Fazenda, um número baixo de cotistas permite que famílias ultra ricas formem um fundo apenas para escapar do pagamento de impostos sobre os rendimentos de investimentos.

Para evitar essa brecha, foi incluso no texto uma trava para que pessoas da mesma família, com parentesco de até segundo grau, não detenham juntos mais de 30% das cotas do fundo.

A mudança nos requisitos para isenção tributária deve surtir efeitos a partir de 1º de janeiro de 2024.

O remédio para evitar que as famílias ultra ricas passem a pagar impostos é vão. Além de não resolver a questão tributária do governo, tende a levar à concentração do mercado.

Hoje, o maior volume financeiro investido se encontra nos grandes fundos que contam com um número elevado de cotistas e, portanto, não serão taxados.

Este fato demonstra que, na conjuntura atual, a mudança não vai resultar em um aumento significativo da arrecadação do governo.

Por outro lado, a mudança deve provocar uma consolidação de fundos menores em fundos maiores que já são negociados em bolsa, e criar uma pressão para que Fiagros formados por pequenos grupos de investidores sejam também incorporados ou adotem uma estratégia de obter investidores no mercado.

Além disso, o ingresso de novos players no mercado é desestimulado, aumentando ainda mais a concentração.

Os fundos que serão abertos e ofertados aos cotistas já precisarão surgir grandes e, desta forma, as gestoras pensarão duas vezes, antes de ingressarem neste mercado.

O lançamento de novos fundos vai exigir captações mais efetivas, com taxas de distribuição mais atrativas e os produtos precisarão ser plugados em estruturas de captação grande para conseguir o número mínimo de cotistas. É preciso lembrar que, para obter a pulverização necessária o fundo precisa estar nestas plataformas e o mercado conta com poucas.

Ao taxar os Fiagros, o PL também vai dificultar a pulverização do crédito para o agronegócio, inibindo o crescimento do mercado e complicando a vida das gestoras independentes. Para um produtor rural, por exemplo, que não conseguiu acessar fundos grandes, suas chances de captação via Fiagro se tornam mais escassas.

Isto em um momento em que muitos produtores sofrem com a queda dos preços das commodities agrícolas, depois de baterem recordes ao longo da pandemia e da guerra na Ucrânia.

Lembro que as margens das empresas do setor não se encontram no mesmo patamar.

É preciso ponderar que a indústria de Fiagros ainda está se consolidando, pois a modalidade de investimento ainda é jovem. Para completar, somente agora o mercado obterá uma legislação definitiva, que se encontra em audiência pública na CVM.

Enfim, o governo dá um tiro no pé ao taxar os rendimentos dos Fiagros e prejudicar o acesso dos produtores rurais aos recursos via mercado de capitais.

O PL vai dificultar a vida das gestoras independentes e, por consequência, o acesso dos produtores rurais ao crédito. Tudo isso num momento em que o crédito privado corporativo passa por uma prova de fogo diante da crise registrada em diversas empresas e o agro está mais carente de capital.

Sócio e gestor da MAV Capital
Formado em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo, André Ito tem mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro. Além de sócio responsável pelo time de Structured Finance e DCM na XP Investimentos ele também atuou em Investment Banking no BTG Pactual e como superintendente comercial dos bancos Pine e Pan. Além disso foi sócio responsável pelo Corporate Desk do Banco BBM.
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Formado em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo, André Ito tem mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro. Além de sócio responsável pelo time de Structured Finance e DCM na XP Investimentos ele também atuou em Investment Banking no BTG Pactual e como superintendente comercial dos bancos Pine e Pan. Além disso foi sócio responsável pelo Corporate Desk do Banco BBM.
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