Entrevista

Cesar Paiva: O ‘Warren Buffett de Londrina’ já ganhou 400% com small caps

17 ago 2023, 15:18 - atualizado em 17 ago 2023, 15:18
César Paiva, da Real Investor
Em conversa realizada com o Market Makers, Paiva conta mais sobre sua trajetória, as três empresas que deram grandes resultados para o fundo

Cesar Paiva é um gestor que não fica na Faria Lima nem no Leblon, mas isso não o impediu de se tornar um dos principais nomes entre os profissionais do mercado de ações nacional. Pela rentabilidade, a técnica de investimentos e por estar no interior, o fundador da Real Investor, ganhou o reconhecimento do mercado como “Warren Buffett brasileiro”.

Hoje, seu principal fundo acumula valorização de mais de 400%, contra 80% do Ibovespa nos seus 11 anos de existência.

E mesmo que seu fundo não seja apenas de small caps, essas empresas menores têm grande importância nos seus resultados. “São vários pequenos fatos que nos deixam empolgados com small caps, muitas vezes as maiores altas da Bolsa costumam vir delas. O próprio Peter Lynch, o Warren Buffett, ao longo da história, compraram controles investindo em várias empresas menores, o que os ajudou a fazer boa parte de suas fortunas”, afirma.

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Em conversa realizada com o Market Makers, Paiva conta mais sobre sua trajetória, as três empresas que deram grandes resultados para o fundo e também o case que trouxe o pior prejuízo. Confira os principais pontos abaixo:

Cesar Paiva – Eu sou de Londrina, Paraná, então sou um pouco diferente da maioria, que fica no eixo Rio-São Paulo. Comecei a investir logo cedo, ainda criança, com aquela ideia de juntar dinheiro, de pedir para os pais, para os avós. Isso me levou muito cedo para o mundo dos investimentos. Comecei a investir em ações com 17 anos, e tive a felicidade de começar a investir da maneira que eu julgo ser a correta, que é seguindo a linha da análise fundamentalista, a filosofia do Warren Buffett.

Na época, o mais perto que eu cheguei do mercado financeiro foi trabalhar como bancário, e eu brinco que ali eu aprendi o que não fazer. Depois eu atuei como agente autônomo. Mas eu era um dos piores assessores do mercado, no que tange a geração de receita, já que naquela época tudo era muito focado em comprar e vender ações. Só que eu pensava muito em ser sócio de boas empresas no longo prazo, acabava não girando muito a carteira e acabava não ganhando muito com corretagem. Por outro lado, o cliente ficava feliz, eu ajudava eles a montarem essa carteira e voltá-la mais para o longo prazo. Isso me levou a dar o passo em direção à gestão.

No final de 2008, motivado até pela crise, eu abri o clube de investimento em ações Real Investor. E clube tem que obrigatoriamente ter no mínimo três cotistas, então eu comecei com dinheiro meu, do meu pai e da minha mãe, para depois expandir. Dentro da filosofia do value investing, procurava sempre investir numa carteira adequadamente diversificada, de empresas que eu entendia que tinham boas perspectivas, boa gestão, baixo endividamento e preços atrativos.

E esse clube deu muito certo. Teve um resultado muito bom já no primeiro ano, em 2009, o que aumentou o PL (Patrimônio Líquido) do clube e me levou no ano seguinte a abrir formalmente a Real Investor Gestão de Recursos. A nossa cota, que começou em 1, hoje está em torno de 19, então multiplicamos o capital por 19 vezes nesse período, o que equivale a um ganho de 1.800%. Nesse mesmo período, o Ibovespa conseguiu 250%. Hoje estamos gerindo aproximadamente R$ 4 bilhões, e também abrimos outros fundos.

MM – E como é a sua filosofia de investimento?

CP – É simples, para você ganhar dinheiro com ações basta você fazer duas coisas: comprar uma boa empresa e pagar barato por ela. A essência do que a gente faz é resumida nisso, mas eu sei que é difícil encontrar essas duas coisas ao mesmo tempo. Geralmente, as empresas boas são reconhecidas, e muitas vezes os preços estão caros, o que não se traduz em uma oportunidade. Do outro lado, as empresas que muitas vezes estão baratas têm alguns problemas, perspectivas ruins de governança, de endividamento, então estão baratas por um motivo que não necessariamente são oportunidades.

Quando falamos de qualidade, é muito importante uma empresa que já provou que é boa, que tenha um bom histórico de resultados, boas perspectivas, uma empresa que tem lucros crescentes, boa gestão, etc.. Do outro lado, queremos tentar comprar essa empresa por um bom preço, então fazemos uma série de análises, costumamos fazer algumas contas, tentar projetar o futuro da empresa e trazer a valor presente, o chamado fluxo de caixa descontado.

Uma coisa super importante dentro da nossa filosofia também é que muitas vezes somos seletivamente contrários ao senso comum. O que eu quero dizer com isso? Às vezes, aquelas empresas que são as queridinhas, que estão na moda, que todo mundo recomenda, não são grandes oportunidades. Então, a gente vai tentar olhar quais empresas, ou quais setores, em determinados momentos, estão muito baratos, o que pode ser por um motivo que não concordamos.

A gente também foca muito no médio e longo prazo, então, a Real Investor não é uma gestora que está mudando de posições todo dia ou toda semana. Temos um prazo médio que ficamos com uma empresa em torno de dois a três anos, não giramos tanto o portfólio. Gostamos de comprar uma empresa que já seja boa, já seja lucrativa, que esteja sendo negociada a um bom preço.  Talvez não tenhamos alguns ganhos extraordinários em uma ou outra empresa, mas evitamos também muitas perdas.

MM – Apesar do fundo de vocês não ser só de small caps, vocês investem bastante nessas empresas. Por quê? Qual a atratividade dessas empresas menores para você?

CP – Primeiro, a gente gosta de ser um fundo livre, não ser categorizado. Investimos em empresas. A favor das small caps, o que a gente encontra é que todo mundo quer investir numa empresa que esteja no começo, quando ela ainda é pequena e tem muito para crescer e se desenvolver. É muito mais fácil uma empresa menor crescer a taxas mais altas ao longo do tempo.

Outro ponto é o número de oportunidades. Se você é um investidor que olha para a bolsa brasileira como um todo, você tem mais de 400 empresas de capital aberto.  As que fazem parte do Ibovespa, que são mais líquidas, são mais ou menos 80 empresas. Por que focar só nessas 80 e não olhar para as outras 300 e poucas? É uma questão de ter muito mais alternativas de empresas e setores

Um outro lado também diz respeito à precificação dessas empresas. Uma empresa como o Itaú, todo mundo acompanha, é muito difícil ter uma informação diferente do resto do mercado. Só que quando olhamos para empresas menores, muitos fundos nem olham para elas porque colocam um target muito alto em relação ao valor negociado por dia.

São vários pequenos fatos que nos deixam bastante empolgados com small caps.  Muitas vezes as maiores altas da Bolsa ao longo do tempo costumam vir de empresas menores. O próprio Peter Lynch, o Warren Buffett, ao longo da história deles, compraram controle investindo em várias empresas menores, o que ajudou eles a fazerem boa parte da fortuna.

MM – E quais foram os melhores investimentos que você já fez, com os melhores resultados?

CP – Uma que eu destacaria é a construtora EzTec. Logo que nós abrimos o clube,  em dezembro de 2008, compramos no primeiro dia e na época ela tinha uma queda de mais de 80% em relação ao preço do IPO. Fazendo uma série de contas simples, a gente via que o preço não fazia sentido nenhum. Nós fomos nos aprofundando na tese e ficou a dúvida se era uma empresa boa ou não, porque estava muito barata. Mas descobrimos que não só era uma empresa muito barata, mas também era uma das melhores construtoras de São Paulo na questão da gestão, margens, retorno sobre o patrimônio. E a gente conseguiu comprar com 50%, 40% do valor patrimonial, ela negociava com uma relação P/L em torno de 3 a 4 vezes.

Naquele momento ninguém queria investir em construção, em bancos médios, era o momento da crise do subprime. Desde então, a EzTec surpreendeu positivamente em termos de crescimento, resultado e lucro. Ficamos de 2008 até 2014 investindo nela, a empresa deve ter multiplicado por 15 nesse período. O Peter Lynch tem um termo que ele usa que é “tenbagger”, aquela empresa que se multiplicou por mais que 10 na mão do investidor, e a EzTec foi uma dessas.

Outra foi a Unipar Carbocloro (UNIP6), que acompanhamos há bastante tempo, e era um negócio bem difícil, ela era endividada, complexa. Até que chegou o momento que eles decidiram vender uma série de ativos que tinham e se concentrar no melhor deles, que era a Carbocloro. Conseguimos identificar que o negócio era muito bom, muito rentável. O mercado tinha um certo preconceito, ainda não estava reconhecendo essa nova empresa, então a gente investiu a preços da época abaixo de R$ 4. Depois essa ação acabou subindo e fomos vender na casa dos R$ 40, sendo que em 3 anos ela pagou dividendos maiores que o valor inicial pelo qual adquirimos a empresa. Essa foi outra que multiplicou por 10, e acabamos até vendendo um pouco cedo, porque ela se valorizou mais depois.

Teve ainda a Direcional Engenharia, que compramos no final de 2016, quando o mercado imobiliário estava horrível e a própria empresa teve alguns prejuízos, mas identificamos muito bem de onde estava vindo o prejuízo. Na época, pagamos em torno de 50% do valor patrimonial, e nos três anos seguintes ela pagou quase o valor de mercado em dividendos.

Ela tinha bastante excesso de capital, e depois fomos vender quando ela estava valendo em torno de uma vez e meia o valor patrimonial. Entre dividendos e apreciação, deu uns 400%,  500%, no período.

MM – E do outro lado, qual foi o pior investimento?

CP – Daria para destacar dois erros relevantes na Real Investor. Um foi mais macro, em 2014, na época éramos muito mais uma gestora bottom up, que olhava os fundamentos das empresas e não ficava tentando olhar o cenário. Mas estamos no Brasil, e a parte macro interessa, a política interessa, e o Brasil era um país tomando decisões muito erradas naquela época. Foi uma tempestade perfeita no nosso portfólio, mas aprendemos a ter uma carteira mais equilibrada.

Foi nas ações da Saraiva. Em 2012 a Saraiva parecia uma empresa fenomenal, tinha um histórico de lucros crescentes, patrimônios crescentes, uma boa rentabilidade, múltiplos baixos e estava bem posicionada em alguns mercados que estavam crescendo muito. Gostávamos muito do negócio de editora, que era o principal dela. A gente acreditava que só a editora deveria valer mais do que o valor de mercado da empresa.

Mas desde que compramos, as decisões de alocação de capital foram horríveis. Eles perderam muito dinheiro, tiveram várias  trocas de CEOs, a empresa  parece que se perdeu. Então saímos com uma queda de 50% do nosso preço médio de aquisição, o que acabou significando 2% de perda de Patrimônio Líquido. Foi um erro grosseiro. A parte boa é que a gente reconheceu, saiu, e, desde então, a empresa só piorou, só se endividou, acabou depois indo para a recuperação judicial.

MM – E como você lida com esses cenários de alta e baixa? E saber a hora certa de vender um ativo, seja com ganhos ou perdas?

CP – Não tem uma fórmula mágica, estamos sempre refletindo sobre o nosso  portfólio. Estamos sempre olhando de forma relativa as  oportunidades, às vezes a empresa tem um bom potencial de retorno, mas apareceu outra que faz mais sentido.

Estamos sempre calibrando, olhando muito no relativo. Não adianta eu ver um monte de empresa barata dentro do setor imobiliário e comprar 20%, 30%, 40% do fundo em um setor. Se eu estiver errado, vai me machucar muito. Então a gente também quer ter uma carteira equilibrada. Às vezes já tem muitas empresas dentro do setor de construção, mesmo que tiver alternativas, eu não quero aumentar mais o meu risco, eu quero investir em algumas empresas exportadoras, eu quero ter uma seguradora, um banco, quero ter outros fatores, então vamos tentando equilibrar tudo isso, esse é o nosso trabalho.

MM – E para finalizar, como você está vendo o cenário atual para os investimentos e o que você diria para quem ainda tem medo de ir para a renda variável?

CP – Do nosso lado, procuramos ser menos esse especulador e pensar que eu vou investir na bolsa olhando o longo prazo. Eu acredito que, no longo prazo, acompanhar de maneira diligente as empresas, de modo a poder aumentar, diminuir ou mesmo mudar de empresa ao longo do tempo, é um dos melhores meios para conseguir um retorno diferenciado.

É muito importante para o investidor também ter uma carteira equilibrada, principalmente no Brasil, onde as coisas são muito cíclicas. Não é prudente comprar uma ou duas ou três empresas só. Talvez estar investido em 10 ou 15 empresas, e acompanhando muito bem. O investidor que vai fazer isso direito, ele tem que se dar o trabalho de estudar. Se ele não fizer isso, está fazendo algumas apostas, que eu acho que não é muito prudente.

Mas quando a gente olha no mercado, nem sempre encontramos boas oportunidades, e é preciso ter disciplina. Se eu não estou encontrando nada inteligente para fazer, as coisas estão caras, ou eu estou receoso, não tem problema, fica um pouco mais na renda fixa. Agora, viu que teve uma crise, tudo caiu bastante, estou encontrando várias empresas muito boas a bons preços, vamos aproveitar para investir um pouco mais. E quando olhamos o momento atual, a bolsa brasileira ainda está barata.

No geral, o investidor tem que ter um  pouco mais essa cabeça de longo prazo, de ser sócio das empresas, e tomar cuidado porque o nosso cérebro é feito para nos atrapalhar nos investimentos. Quando as coisas estão indo mal, o investidor acaba com o estômago revirado, não aguenta a volatilidade, fica olhando o portfólio todo dia caindo e acaba vendendo. Depois, quando está no oba-oba, o vizinho ganhando  dinheiro, todo mundo falando de ações, ele tem aquele medo de ficar fora e compra, mas o investidor tem que ser mais racional. Precisa controlar as suas atitudes.

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Jornalista, co-fundador do canal Market Makers e do Stock Pickers, duas vezes eleito o podcast mais admirado do Brasil. Passou por grandes redações do país, como o jornal Folha de S. Paulo e revista Exame, e atuou na cobertura de diferentes temas, de cotidiano até economia e negócios. Sua missão, hoje, é a de usar sua expertise editorial e habilidades de reportagem para traduzir o mundo das finanças e mercado financeiro ao grande público.
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