Brasil

Contas públicas: As promessas de 2018 não cumpridas pelo governo Bolsonaro

15 maio 2022, 17:00 - atualizado em 13 maio 2022, 18:12
Congresso, reforma administrativa
Bolsonaro se elegeu prometendo uma “agenda liberal”, mas encontrou dificuldades na tramitação de propostas  (Imagem: Reuters/Adriano Machado)

Durante a corrida presidencial de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro (PL) defendeu a realização uma série de mudanças administrativas e econômicas, centralizadas na figura do futuro ministro da Economia e “posto Ipiranga” Paulo Guedes, que visavam trazer saúde às contas públicas.

Algumas das principais promessas seriam grandes reformas do Estado que, principalmente, viriam para acabar com privilégios de classes e torná-lo mais enxuto — uma “agenda liberal”.

Entretanto, as reformas da Previdência e a tributária, prometidas ainda em campanha, e a administrativa, encabeçada por Guedes já como ministro, enfrentaram duras dificuldades de implementação.

Uma vez empossado, Bolsonaro só conseguiu a aprovação de uma delas: a reforma previdenciária, no primeiro ano de seu mandato. As outras duas ficaram pelo caminho, travadas em tramitações entre Câmara e Senado, com o próprio governo deixando de dar prioridade às propostas na medida em que as novas eleições se aproximam.

Reforma da Previdência

A Reforma da Previdência (EC 103/2019) foi a única das três grandes reformas de estado prometidas que conseguiu aprovação, ainda no primeiro ano de governo.

O mérito da tramitação, entretanto, foi em grande parte atribuído ao então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (PSDB), que inclusive sempre se mostrou abertamente crítico à capacidade de articulação da pauta por parte do Executivo, dizendo que a PEC havia sido aprovada “apesar do governo”.

A reforma, que estabeleceu idade mínima para aposentadoria independente do tempo de contribuição — 65 para homens e 62 para mulheres — teve seu texto consideravelmente alterado durante a tramitação, sendo aprovada em versão “desidratada”.

De fora, ficaram propostas caras ao governo, como mudanças no abono salarial do PIS/Pasep e a inclusão de servidores públicos estaduais e municipais. Desde o início da tramitação, a economia prevista aos cofres públicos em dez anos recuou R$ 400 bilhões, indo de R$ 1,2 trilhão para R$ 800 bilhões.

Marcos Lisboa, economista e diretor-presidente do Insper, vê a a aprovação da reforma como importante, mas de potencial limitado para contribuir com a saúde das contas públicas.

“A reforma da Previdência talvez tenha sido a mais importante medida. Mas ela não necessariamente melhora as contas públicas, ela reduz o grau de piora. Nesse sentido, Estados e municípios têm feito reformas bastante tímidas”, diz.

Reforma administrativa

Sempre muito bem defendida por Guedes, a reforma administrativa (PEC 32/2020) foi alvo de fortes críticas por parte da oposição e enfrentou resistências diversas em setores do funcionalismo público brasileiro — os principais afetados.

A proposta, que visa desonerar gradualmente o tamanho da folha de pagamento estado, traz possibilidades como a redução de jornadas e salários em caso de crise econômica, parcerias com o setor privado e mudanças de regras na acumulação de cargos.

Mas, após a sua proposição, o trâmite legislativo fez com que a PEC fosse cada vez mais esvaziada, resultando em um texto com menos novidades e ataques mais brandos a privilégios, como a não-inclusão de juízes e promotores nas mudanças.

“A reforma administrativa é mais um anúncio do que efetiva. É incrivelmente tímida para a necessidade que tem o país e na pouca eficácia que temos na qualidade de execução das políticas públicas”, diz Lisboa.

Segundo Regina Pacheco, professora da FGV e especialista em gestão de pessoas no setor público, muito do material da PEC já existia na lei, e deveria só ser regulamentado a partir de outras ferramentas.

Um exemplo é a própria avaliação de servidores por seu desempenho, o que já havia sido proposto no contexto de reformas administrativas promulgadas nos anos 90 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.

“Não adianta nada criar novas leis, se não há primeiramente a cultura de foco em resultado”, diz Pacheco.

O texto se encontra atualmente parado na Câmara. O presidente da casa Arthur Lira (Progressistas) defendeu na terça-feira que o projeto avançasse ainda em 2022, ano eleitoral, mas se queixou de falta de apoio do poder executivo.

Reforma tributária

No Senado, a PEC que visava alterar a cobrança de impostos no Brasil (PEC 110/2019) entrou em pauta no início de abril, mas, por falta de quórum, foi adiada pela terceira vez, sem previsão de retorno de discussões.

O texto simplifica os tributos que incidem sobre consumo e produção, ao criar o modelo dual do Imposto de Valor Agregado (IVA): o IVA Federal (reuniria impostos arrecadados pela União, como IPI, PIS e Cofins) e o IVA Subnacional (que juntaria impostos arrecadados por estados e municípios, como ICMS e ISS).

Na ocasião, o esvaziamento da casa legislativa, que só contou com a presença de 6 senadores, foi encarado como proposital, de maneira a impedir a votação. Entre os principais pontos de resistência por parte dos legisladores estava a inclusão de um “jabuti” – proposta paralela, que nada têm a ver com o tema principal, colocada no meio do texto para uma aprovação conjunta – sobre a flexibilização do uso de armas de fogo.

“Se colocou a pauta de armas junto com a reforma tributária, e isso aí acabou com a sessão. São dois assuntos polêmicos e dividiram os senadores”, criticou o senador Eduardo Girão (Podemos).

A mais recente iniciativa de Paulo Guedes é tentar passar uma “versão mais simples” do texto. O ministro deu declaração na segunda-feira (9) favorável ao Projeto de Lei N. 2337, proposto pelo executivo e também parado no Senado.

A medida propõe redução do Imposto de Renda para pessoas jurídicas de 15% para 8% e, ao mesmo tempo, cria uma taxa de 15% cobrada de grandes empresas, na distribuição de lucros e dividendos.

“Podemos fazer uma versão mais enxuta, tributando os mais ricos e reduzindo os impostos de empresas. É isso que falta para o Brasil receber investimentos de fora. A nossa reforma é reduzir os impostos de 34% para 26%. No primeiro movimento, se a receita continuar subindo, nós vamos continuar reduzindo os impostos”, afirmou.

“Mais retrocessos do que avanços”

Para Lisboa, do Insper, o saldo final do governo no que se diz respeito à saúde das contas públicas é negativo. Isso porque os poucos avanços que podem ser observados se diluem em uma situação econômica desfavorável.

“Na questão fiscal, a notícia boa é que a dívida pública caiu, mas por uma razão ruim: a inflação. É um problema de todo o mundo, mas que desponta no Brasil como mais grave. No final, a dívida caiu de uma maneira ruim para a sociedade”, afirmou o economista do Insper.

Em março, a dívida pública federal recuou 2,89%, atingindo R$ 5,65 trilhões de reais. A inflação, que em abriu atingiu 1,06%, maior taxa para o mês desde 1996, ajuda nesta redução pois eleva a arrecadação do governo, que cresce com o preço dos produtos tributados.

Impacto nas eleições

A última pesquisa eleitoral Ipespe, divulgada na sexta-feira (13) mostra que 49% dos brasileiros mencionam temas relacionados à agenda econômica, como inflação, desemprego, fome e salários, dentre os mais importantes para serem tratados pelo próximo presidente do Brasil. Somente o tema “Inflação e custo de vida” ganhou 8 pontos percentuais nas citações desde outubro de 2021.

A mesma pesquisa mostra que 62% dos brasileiros acreditam que a economia está no caminho errado e um percentual de 51% de “ruim/péssimo” na avaliação do governo.

Para Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Ipespe, mesmo que Bolsonaro tenha tido implementação frustrada de uma agenda liberal, seus eleitores — dos quais 66% se classificam como de direita — ainda votam no ex-capitão devido à profunda rejeição ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

“O eleitor, mesmo com economia complicada, não vê outra alternativa, se não o Bolsonaro para rejeitar o Lula”, disse. A mesma pesquisa mostra Lula com 44% das intenções de voto, enquanto Bolsonaro tem 32%.

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*Com informações da Agência Senado

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