Colunistas

GameStop: o jogo especulativo que precisa parar

29 jan 2021, 10:29 - atualizado em 29 jan 2021, 10:53
Fachada de loja da GameStop em Nova York
Ocorre que um grupo de investidores resolveu começar uma “brincadeira” em uma rede social, incentivando publicamente a compra de ações da GameStop (Imagem: Reuters/ Nick Zieminski)

Por Daniel Kalansky, professor do Insper, Mestre e Doutor pela USP, e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial – IBRADEMP

E por Isac Costa, ex-analista da CVM, especialista em Regulação Financeira, professor de Direito Empresarial. Doutorando (USP) e mestre em Direito (FGV), Engenheiro de Computação (ITA).

Um bom mercado é igual à água em temperatura ambiente: líquido, transparente e pouco volátil.

Nos últimos dias, contudo, o mercado comportou-se de forma oposta, especialmente no que toca à volatilidade, com um ativo tradicional roubando o protagonismo que tem sido dado à alta dos criptoativos: a companhia norte-americana GameStop (GME) viu suas ações se valorizarem vertiginosamente em um curtíssimo intervalo de tempo — mais de 20 vezes ao longo do último mês.

A GameStop é uma rede de lojas de consoles e jogos de videogame que vem sofrendo prejuízos em razão da migração do movimento de consumo para as lojas virtuais e plataformas de streaming. Nesse cenário, alguns fundos de investimento realizaram uma estratégia conhecida como “short selling”, por meio da qual realizaram vendas a descoberto de ações de emissão da GameStop, apostando na desvalorização do ativo.

Ocorre que um grupo de investidores resolveu começar uma “brincadeira” em uma rede social, incentivando publicamente a compra de ações da GameStop. Sem qualquer fundamento econômico para a valorização do ativo, o movimento foi motivado pela vontade de inverter a lógica do mercado e atacar a estratégia utilizada pelos fundos de investimento.

A “brincadeira” ganhou força, provocando a valorização abrupta do ativo. Um efeito manada provocou enormes prejuízos sofridos pelos fundos de investimento e um elevado número de negócios, e, em meio à euforia, um dos maiores acionistas da GameStop se desfez integralmente de sua posição após o preço do ativo explodir.

A ideia parece ter chegado ao Brasil, tendo em vista a notícia de canais reservados, nos quais pessoas estariam combinando uma compra maciça de ações do IRB (IRBR3), que perderam bastante valor no passado recente.

A ideia parece ter chegado ao Brasil, considerando a compra maciça de ações do IRB, que perderam bastante valor no passado recente (Imagem: Reprodução/LinkedIn/IRB Brasil RE)

Qual é o limite entre a atuação legítima de um grupo de investidores e a prática de um ilícito no mercado de capitais?

As pessoas adoram boas histórias e têm medo de ficar de fora de uma festa. A sensação é antiga, mas a recente expressão “fear of missing out” tornou-se popular em virtude das frustrações decorrentes do voyeurismo da felicidade alheia nas redes sociais.

Esse é um campo fértil para as mais diversas irregularidades, dentre as quais a manipulação de mercado, quando há “utilização de qualquer processo ou artifício destinado, direta ou indiretamente, a elevar, manter ou baixar a cotação de um valor mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e venda”.

O caso GameStop — assim como inúmeros outros no passado, desde a lendária bolha das Tulipas, há alguns séculos, até escândalos brasileiros como Boi Gordo, Avestruz Master ou a “Bolha do Alicate” — desafia o pressuposto da racionalidade dos investidores.

O movimento dos preços da GameStop é indiscutivelmente atípico, inexistindo fundamentos econômicos que justifiquem a sua valorização.

Mas estariam presentes os elementos caracterizadores de manipulação de mercado? Poder-se-ia perguntar, não é apenas um grupo de investidores em um site de mídia social?

As mensagens trocadas na página “wallstreetbets” da rede social Reddit podem ser interpretadas como um processo ou artifício destinado a elevar o preço das ações de emissão da GameStop. Ademais, tais mensagens justamente incentivavam terceiros a adquirir e manter esses ativos, atraindo cada vez mais investidores e alimentando a alta.

A partir daí, verificou-se o comportamento de enxame dos investidores e o efeito manada subsequente. Era e permanece evidente que o propósito dos investidores é puxar o papel usando a rede social para inflar artificialmente uma cotação, incitando sua compra.

Em suma, o caso GameStop não é uma simples “brincadeira”. E, se o caso IRB seguir os mesmos passos, também não será. Vale lembrar que, além de ilícito no mercado de capitais, manipulação de mercado também configura crime.

Deve-se, portanto, olhar sempre se há um comportamento real orquestrado com o propósito de aumentar ou diminuir o preço de uma ação com o objetivo de induzir outros a comprar ou vender aquele título.

No mercado há mais de 5 anos, o Money Times é referência em investimentos pessoais, educação financeira, gestão de carreiras e consumo no mercado brasileiro. No Money Times, investidores, analistas, gestores e entusiastas do ambiente econômico brasileiro usufruem de textos objetivos e de qualidade que vão ao centro da informação, análise e debate. Buscamos levantar e antecipar discussões importantes para o investidor e dar respostas às questões do momento. Isso faz toda a diferença.
Twitter Facebook Linkedin Instagram YouTube Site
No mercado há mais de 5 anos, o Money Times é referência em investimentos pessoais, educação financeira, gestão de carreiras e consumo no mercado brasileiro. No Money Times, investidores, analistas, gestores e entusiastas do ambiente econômico brasileiro usufruem de textos objetivos e de qualidade que vão ao centro da informação, análise e debate. Buscamos levantar e antecipar discussões importantes para o investidor e dar respostas às questões do momento. Isso faz toda a diferença.
Twitter Facebook Linkedin Instagram YouTube Site
Giro da Semana

Receba as principais notícias e recomendações de investimento diretamente no seu e-mail. Tudo 100% gratuito. Inscreva-se no botão abaixo:

*Ao clicar no botão você autoriza o Money Times a utilizar os dados fornecidos para encaminhar conteúdos informativos e publicitários.