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Ivan Sant’Anna: um filme de terror sobre a inflação no Brasil

08 jun 2020, 16:56 - atualizado em 08 jun 2020, 16:56
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Segundo o boletim Focus de segunda-feira passada, 1º de junho, a inflação brasileira de 2020 será de 1,55% (Tony Winston/Agência Brasília)

Caro leitor,

Até poucos dias atrás, os analistas de mercado previam dois cenários para o novo nível de taxa Selic, a ser definido na próxima reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), agendada para os dias 16 e 17 deste mês:

− Corte de 50 pontos, de 3% ao ano para 2,50%.

− Corte de 75 pontos, para 2,25%.

Havia um consenso: esta seria a última redução de 2020.

Anteontem, quinta-feira, o JPMorgan surgiu com uma novidade. Segundo a instituição, o Banco Central fará um corte adicional de meio por cento na reunião de agosto, com a taxa Selic terminando o ano em 1,75%.

Segundo o boletim Focus de segunda-feira passada, 1º de junho, a inflação brasileira de 2020 será de 1,55%. Ao ano, é bom que se repita, tal o ineditismo do número.

Caso se materializem essas previsões (1,75% para os juros e 1,55% para a inflação), teremos uma taxa real de 0,20%. Ao ano, é bom que ressalte novamente, para que estes números não sejam confundidos com erros de digitação.

O mais surpreendente é que os dados inflacionários finais deste ano poderão ser ainda menores. Segundo a Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), só para citar um exemplo, a cidade de São Paulo registrou deflação de 0,24% no mês de maio.

No primeiro boletim Focus de 2020, divulgado em 6 de janeiro, quando a Covid-19 ainda era um segredo guardado a sete chaves na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China, os agentes econômicos brasileiros previam, no final do ano, uma taxa Selic de 4,50%, num quadro inflacionário de 3,60%.

Para pessoas jurássicas como eu, esses números são quase utópicos.

Pudera!

Este livro irá mudar completamente sua forma de pensar sobre como agir no mercado financeiro. Tenha sua cópia gratuita “1929: A quebra da bolsa de Nova York” de Ivan Sant’Anna.

Durante anos, nós, profissionais de mercado, tínhamos como objetivo principal bater a inflação. Em março de 1990, por exemplo, ela chegou a 82,39%. Ao mês, bem entendido.

Naqueles tempos, eu publicava uma newsletter intitulada Relatório FNJ.

Só a título de exemplo, vejam dois parágrafos em sequência que escrevi no relatório de agosto de 1989 – note-se que, naquela época, a gente raciocinava em termos mensais ao falar sobre inflação.

Os números anualizados fundiam a cuca dos operadores. Além disso, tudo que o Banco Central e o Ministério da Fazenda publicavam era com a intenção de mascarar os dados.

Eis o texto:

“PERSPECTIVAS PARA O MÊS DE SETEMBRO (de 1989) – A inflação (mensal) de agosto, de 29,34% (ao mês), se anualizada significa 2.091,77%. Foi a segunda maior da história do Brasil e só perde para a de janeiro (70,28%) deste ano, sendo que esta foi medida em 51 dias, sofrendo ainda a aplicação de um vetor que ninguém entendeu direito.
Para setembro, o mercado está estimando uma inflação de 33%. Para que o governo mantenha uma rentabilidade no over igual a de agosto, 43,60% reais (o grifo não consta do original) anualizados, e considerando-se os 20 dias úteis do mês, é preciso que a taxa do over fique em média em 47,67%.”

Pois bem, eu achava que qualquer trader que conseguia operar, e lucrar, em ambiente tão confuso, não teria prejuízo em lugar ou época nenhuma. Fosse onde fosse.

Agora, vendo os extremos opostos de juros e inflação, percebo que ganhar dinheiro no momento atual é tão difícil como naquela época.

Mercados Ibovespa
“Que a Bolsa de Valores está subindo, isso é um fato. Não um juízo. Mas, de um momento para o outro, pode se transformar em uma bull trap”, escreve o colunista (Imagem: REUTERS/Paulo Whitaker)

Quem, em pleno juízo, poderia imaginar que, durante uma pandemia mundial, com sua consequente diminuição drástica da atividade econômica, a Bolsa de Valores poderia subir 50% em dois meses e meio.

Note-se que as perspectivas para o restante do ano não são nada boas. Exemplo disso são as declarações feitas anteontem pelo economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita.

Segundo ele, teremos uma recessão de 4,5% em 2020, podendo esse número se elevar a 6 ou 8%, caso a Covid-19 não dê tréguas e estique os prazos de isolamento social.

Que a Bolsa de Valores está subindo, isso é um fato. Não um juízo. Mas, de um momento para o outro, pode se transformar em uma bull trap, fenômeno que acontece quando tudo indica que o mercado vai continuar subindo feito um foguete (skyrocketing) e as cotações, sem nenhuma palinha prévia, desabam na tela à nossa frente.

Isso pode ocorrer quando alguns investidores parrudos se dão conta de que ganhar 20 ou 30%, num cenário de inflação próxima de zero, é bom demais da conta.

Nesses momentos se dá o estouro da boiada (com minhas desculpas por mais este trocadilho), cada qual querendo realizar seus lucros antes dos outros.

Já vi esse filme de terror quando a inflação era de 1,5% ao dia (primeira quinzena de março de 1990) e tenho medo de vê-lo de novo com 1,5% ao ano, exatamente três décadas depois.

Um grande abraço.

Trader e Escritor
Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Nas newsletters “Os Mercadores da Noite” e “Warm Up Inversa”, Ivan dá sugestões investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.
Uma das maiores referências do mercado financeiro brasileiro, tendo participado de seu desenvolvimento desde 1958. Atuou como trader no mercado financeiro por 37 anos antes de se tornar autor de livros best-sellers como “Os Mercadores da Noite” e “1929 - Quebra da Bolsa de Nova York”. Nas newsletters “Os Mercadores da Noite” e “Warm Up Inversa”, Ivan dá sugestões investimentos, conta histórias fascinantes e segredos de como realmente funciona o mercado.
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