Coluna do Cleber Benvegnú

Lula vs. Bolsonaro: As armas de cada um na guerra de narrativas da eleição presidencial

15 jun 2022, 10:26 - atualizado em 15 jun 2022, 10:28
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Lula e Bolsonaro: “Estamos diante dos dois maiores líderes de massa das últimas décadas no país, cada um ao seu estilo”, diz Benvegnú (Montagem com Reuters/Carla Carniel e Reuters/Adriano Machado)

Narrativas podem servir à verdade ou à mentira. Então, sem preconceito contra o termo. Trata-se, na comunicação política, de um adequado encadeamento de fatos e ideias de modo a gerar determinada compreensão. Numa campanha eleitoral, cada candidatura procura arquitetar do melhor modo esse jeito de contar a sua história.

Lula e Bolsonaro, obviamente, cada um contará ao seu modo. E ambos, que têm fortalezas e vulnerabilidades, tentarão posicionar o debate da eleição no terreno das suas forças e deslocá-lo das fraquezas. É assim que funciona na política, bem como num negócio, num relacionamento ou mesmo num jogo de futebol.

Pois bem. Com a constituição das equipes de comunicação das campanhas tomando forma, começam a aparecer os primeiros materiais dos dois players do processo eleitoral. Nenhuma surpresa para quem acompanha medianamente o movimento da opinião pública. A campanha de Lula tentará falar mais da economia, enquanto a de Bolsonaro pesará a mão sobre a pauta dos valores.

Há uma sensação de que a economia real ainda não está bem: preço da carne, da gasolina, inflação em alta. É isso que o povo sente, na última linha. E o revés político dessa circunstância, como regra, é debitado ao governo de ocasião. E o governo de ocasião é de Bolsonaro – e Lula sabe disso.

O PT fará novamente, e já está fazendo, a saga do “pai dos pobres”: no tempo de Lula, tinha carne barata; agora a carne está cara; e se ele voltar, logo tudo será como antes. Estou simplificando com uma caricatura, claro, mas não é muito diferente disso que funciona.

Esse tipo de silogismo primário, despertado especialmente pelo simbólico emocional, é que comanda a maior parte das decisões – da política e toda e qualquer área, inclusive do mundo dos negócios. A racionalização vem sempre depois, normalmente para justificar uma alavanca emocional decisória. Porque é assim o ser humano, gostem ou não os homens das planilhas de Excel.

Claro que Bolsonaro tem defesas para isso, e vai usá-las. Já há números melhores da situação do Brasil, em especial na comparação com outros países. Ele também poderá mostrar o exemplo do populismo econômico na Argentina e no Chile, o mesmo que destruiu as contas públicas do país na era petista. Também falará do “fecha tudo”, da guerra da Ucrânia e do ambiente internacional negativo. Mas percebam que é um território em que, pelo menos até aqui, Lula ataca e Bolsonaro defende.

A equipe do atual presidente também entende muito bem dessa dinâmica simbólica da política. Tanto entende que seu apoio popular resiste bravamente ao maior processo histórico de forças poderosas agindo contra um ente todos os dias, formal e informalmente, frontal e lateralmente, disfarçada e explicitamente. Lula teve esse momento, mas a elite cultural e acadêmica, para dar um exemplo, jamais o abandonou.

Onde Bolsonaro ataca e Lula defende

Retomo. A campanha do atual presidente detectou, ainda em 2018, e muito antes do que qualquer outro partido ou agremiação, os valores de base da maior parte do povo brasileiro. O “Deus, pátria e família” — insígnia para a qual parte dos formadores de opinião ainda torce o nariz — é um exemplo de alavanca que desperta o legado da tradição judaico-cristã, fortemente marcada na constituição cultural do Brasil.

Nesse ponto, um adendo. Noto que muitos empresários e investidores gostariam que a política tratasse apenas do que supostamente mais importa: desenvolvimento, emprego, saúde, educação. Todavia, não é assim que a banda toca.

Em primeiro lugar, porque as decisões políticas realmente vão muito além da economia. E, em segundo lugar, não se pode subestimar temas como liberação ou não do aborto, leis mais duras ou mais brandas contra o crime, armamento ou desarmamento da população, maior ou menor liberdade de expressão, financiamento ou não dos tubarões do mundo artístico, combate ou relativização da corrupção, dentre outros. Tudo isso importa, e muito.

Esse debate – que muitos chamam de “costumes”, mas prefiro chamar de “valores” – conecta com algumas das principais fortalezas de Bolsonaro. Nos primeiros comerciais políticos do PL, a propósito, em que o presidente conversa com jovens sobre o respeito entre pais e filhos, o uso de todo esse referencial simbólico fica bem claro.

O petista tentará mostrar suas ligações com movimentos da Teologia da Libertação, influência esquerdista na Igreja Católica. Também buscará mostrar um contorno de solidariedade e amor aos pobres como conexão com esse espírito familiar. Mas aqui, diferente da outra pauta, Bolsonaro ataca e Lula defende.

Eis algumas das armas, eis os guerreiros. Estamos diante dos dois maiores líderes de massa das últimas décadas no país, cada um ao seu estilo. E ambos sabem bem, inclusive em suas manifestações pessoais orgânicas, despertar o diálogo com esses simbólicos emocionais aqui retratados. Nenhum pode ser desprezado como líder político e como produto de comunicação, independente do juízo de mérito que possamos ter sobre eles.

O importante é que a sociedade possa fazer um debate livre e amplo, sem excesso de ativismo judicial sobre a política – patologia institucional que tem se agravado enormemente nos últimos meses no Brasil. Mas isso é assunto para outra conversa. Por ora, saudemos o ano de eleição. É para ser, de fato, como alguém já disse noutra vez, uma festa da democracia.

Cleber Benvegnú é sócio-fundador da agência Critério – Resultado em Opinião Pública (www.criterio.com.br). Jornalista e advogado, é especialista em gestão de imagem e reputação para empresas, marcas, instituições, governos e líderes de expressão. Foi secretário de Estado da Comunicação e Chefe da Casa Civil do Rio Grande do Sul. Consultor político, é membro do CAMP (Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político). Publica conteúdos diariamente em suas redes sociais.

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Sócio-fundador da Agência Critério
Cleber Benvegnú é sócio-fundador da agência Critério - Resultado em Opinião Pública. Jornalista e advogado, é especialista em gestão de imagem e reputação para empresas, marcas, instituições, governos e líderes de expressão. Foi secretário de Estado da Comunicação e Chefe da Casa Civil do Rio Grande do Sul. Consultor político, é membro do CAMP (Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político).
Cleber Benvegnú é sócio-fundador da agência Critério - Resultado em Opinião Pública. Jornalista e advogado, é especialista em gestão de imagem e reputação para empresas, marcas, instituições, governos e líderes de expressão. Foi secretário de Estado da Comunicação e Chefe da Casa Civil do Rio Grande do Sul. Consultor político, é membro do CAMP (Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político).
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